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URBANIDADE
Laboratório Ibirapuera
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
A prefeita Marta Suplicy está encontrando
resistências por ter decidido valorizar uma área abandonada
do parque Ibirapuera, hoje frequentada apenas por gays, que,
à noite, transitam em suas margens, encarados por moradores
da vizinhança como uma ameaça à moral e aos bons costumes.
Silenciosamente, porém, a fonoaudióloga Selma Reyes atrai
para o parque habitantes da cidade que vivem na fronteira da
marginalidade, possivelmente
vistos naquelas redondezas (de
bairros de elite) como seres ainda mais "ameaçadores" do que
os gays.
Apesar das críticas por estar
supostamente estimulando a
"anomalia" sexual, a prefeita
pediu às associações de defesa
dos homossexuais que elaborassem um código de convivência
no parque. O objetivo dela é que
aquele trecho abandonado venha a ser iluminado e a ganhar
um jardim. "É um espaço a ser
utilizado por todos, sem distinção", defende Stela Goldenstein,
secretária municipal do Meio
Ambiente, também alvo dos ataques. Selma conseguiu evitar a
desconfiança dos vizinhos.
Com o apoio do poder público,
Selma Reyes começou a usar o
Ibirapuera para trabalhar com
portadores de doenças mentais.
Depois, transformou o parque
numa espécie de laboratório para experimentos de inclusão com
idosos e portadores de deficiência física. Nas oficinas ao ar livre, percebia crianças e adolescentes que pediam esmolas ou
tramavam furtos; muitos iam só
para dormir.
Entre os casos mais difíceis estavam os jovens entre 15 e 20
anos. "Eles não estudam nem
trabalham. A probabilidade de
consumirem e traficarem drogas, assim como de praticarem
assaltos, é muito grande", conta
a fonoaudióloga. Daí o projeto
Crer-Ser -ao mesmo tempo em
que, antes zanzando desocupados, cuidam dos jardins, os jovens ganham dinheiro e aprendem jardinagem. "Eles aprendem e, ao mesmo tempo, cuidam
da área verde."
Por meio de convênios, os jovens, depois de treinados em jardinagem, saem para outros empregos. Muitos deles não sabiam
nem sequer ler as instruções nos
sacos de terra e pediram que os
encaminhassem à escola. "Ninguém era obrigado a estar na escola para fazer nosso curso." E
assim escaparam da marginalidade -e da irritação dos vizinhos do Ibirapuera.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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