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São Paulo, quinta-feira, 27 de novembro de 2003

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SEGURANÇA

Grupo é acusado de desvio de cargas roubadas e de narcotráfico; drogas e cheques foram achados em delegacia de Guarulhos

Descoberta quadrilha de policiais em SP

Antônio Gaudério/Folha Imagem
O investigador da Polícia Civil Cláudio Vieira Machado (centro), que foi preso ontem em sua casa


RUBENS VALENTE
LILIAN CHRISTOFOLETTI

DA REPORTAGEM LOCAL

Com base em dois meses de interceptações telefônicas feitas pela Polícia Federal a pedido do Ministério Público Federal de Guarulhos (SP), três policiais civis da principal delegacia de repressão a entorpecentes da cidade, a Dise, foram presos ontem sob a acusação de formar uma quadrilha que teria praticado crimes diversos, como desvio de cargas roubadas, extorsão e narcotráfico.
Em poder de um dos investigadores, Cláudio Vieira Machado, foram apreendidas duas Mercedes, avaliadas em R$ 140 mil. Nas casas dos policiais foram achados alimentos enlatados e produtos de higiene que teriam sido desviados de cargas apreendidas.
"Era uma quadrilha incrustada na polícia", disse o procurador da República Matheus Baraldi Magnani, 27, um dos cinco autores da denúncia. O único preso que se manifestou sobre o caso negou as acusações.
O investigador que chefiava uma das seis equipes da Dise (Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes) e principal alvo da polícia ontem, Roberto Raymundo de Andrade, conseguiu escapar das buscas -deflagradas às 7h15 simultaneamente nas casas dos acusados- e ontem à tarde já era considerado foragido. Foram presos, além de Machado, os investigadores Mário Biágio Masullo e João Trindade de Mello.
A denúncia paralisou a Dise, onde os quatro policiais trabalhavam, e jogou-a no próprio centro da denúncia: numa blitz, pela manhã, enquanto os policiais eram presos, promotores do Gaeco (Grupo Especial de Repressão ao Crime Organizado), que também participaram da operação, encontraram trouxas de cocaína e maconha sem etiquetagem, documentos falsificados, 38 cheques pré-datados no valor aproximado de R$ 40 mil e uma metralhadora com numeração raspada embaixo do sofá da sala do plantão.
Às 8h30, quando a força-tarefa entrou na Dise, o delegado seccional de Guarulhos, João Roque, impediu a tomada de imagens no local e minimizou a importância da operação: "É uma inspeção de rotina do Ministério Público".
A "Operação Coruja", como foi batizada, abriu uma crise entre promotores de Justiça e delegados e agentes da Corregedoria que atuaram nas buscas. Os promotores reclamaram à imprensa, nos bastidores, que os policiais da Corregedoria teriam se negado a recolher certos documentos -o que acabaram fazendo, após insistência dos promotores.

Escutas
As gravações da Polícia Federal indicaram, segundo a Procuradoria da República, que os policiais se valiam de informantes e até de um suposto grampo telefônico em unidade da própria Polícia Civil para ter acesso a cargas apreendidas pela polícia e reparti-las entre eles e seus parentes.
Numa das conversas grampeadas, às quais a Folha teve acesso, o investigador Cláudio Machado discute com um informante a possibilidade de vender um caminhão "cabritado" (com a numeração do motor adulterada) e poder obter dinheiro de um homem investigado pela polícia.
Machado perguntou ao informante se o homem tinha muito dinheiro, se tinha "nota" para "cem, 200 paus". Com a resposta afirmativa, Machado contou que a estratégia seria prender a mulher do acusado e deixá-lo solto, para responder ao processo em liberdade. "Com a mulher dá pra fazer negócio também", concluiu.
Em outro trecho, o investigador Mário Masullo telefonou para sua mulher, Francine, para recomendar que ela não comprasse calcinhas, porque os policiais teriam apreendido uma grande carga de roupas íntimas. "Eu estava na abordagem aqui. Catamos um negócio. (...) Oitenta e duas mil peças. Setenta mil, sei lá, um negócio assim", conta Masullo, rindo.
O procurador, na denúncia, ironizou a quantidade de falas que tratavam de supostos crimes: "Em 95% do tempo em que passavam acordados, os integrantes da quadrilha estavam a engendrar empreitadas criminosas".


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