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CIRURGIA
Intervenção reduz chance de acúmulo de líquido no cérebro
Em cirurgia inédita, Unifesp opera coluna de feto no interior do útero
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
O Hospital São Paulo, ligado à
Unifesp (Universidade Federal de
São Paulo), realizou uma cirurgia
inédita na América Latina para
corrigir uma má-formação na coluna de um feto de 27 semanas de
gestação. Até hoje, foram feitas
180 cirurgias desse tipo no mundo, todas nos Estados Unidos.
Por meio de um corte de 17 cm
na barriga da gestante -um terço
maior que uma cesariana-, os
médicos deixaram o útero à mostra, fizeram um corte de 9 cm, retiraram todo o líquido amniótico,
operaram o bebê, devolveram o
líquido amniótico e fecharam o
útero. A cirurgia durou uma hora
e meia e foi realizada por uma
equipe de seis cirurgiões.
A técnica utilizada no procedimento, chamada de cirurgia fetal
"a céu aberto", é a única capaz de
corrigir a meningomielocele (defeito no fechamento da coluna
vertebral).
Em decorrência do problema, o
feto -uma menina que se chamará Raquel- tinha 90% de
chances de desenvolver hidroencefalia (acúmulo de água no cérebro), que leva a problemas motores, como a paralisia dos membros inferiores, e cognitivos -como o retardo mental e dificuldade
de aprendizado.
De acordo com o cirurgião Carlos Gilberto Almodin, pesquisador da Unifesp e que fez parte da
equipe que realizou o procedimento, com a cirurgia as chances
de o feto desenvolver a hidroencefalia caem para 10%.
A expectativa, segundo o cirurgião, é que a gravidez da dona-de-casa Edinei Jesus dos Santos, 26,
prossiga até a 37ª semana. A cirurgia foi feita no último domingo.
Risco
O médico afirma que o maior
risco pós-cirúrgico era que houvesse perda do líquido amniótico
e, consequentemente, o parto
prematuro. "Felizmente, mãe e
bebê estão ótimos", afirma.
Almodin diz que, até então, o
tratamento para esse problema só
era feito após o nascimento da
criança. Consistia na colocação de
uma válvula na cabeça do bebê
para atuar como um dreno.
Com a nova cirurgia, ainda experimental, torna-se possível evitar que o defeito na coluna comprometa o cérebro. Além desse
problema, Almodin afirma que a
cirurgia tem condições de corrigir
outros 25 tipos de anomalia.
Segundo o neurocirurgião Sérgio Cavalheiro, responsável pela
cirurgia no feto, o ideal é que a cirurgia "a céu aberto" seja feita entre a 20ª e a 26ª semana de gestação, para evitar os microtraumatismos provocados pela exposição da medula ao líquido amniótico. "Antes desse período, a cirurgia fica difícil porque a pele do
bebê é muito fina", afirma.
Para ele, o desafio da cirurgia é
operar o feto na posição em que
ele estiver no útero. "Só tinha 18
minutos para fazer o procedimento. É uma grande tensão."
Em vários países da Europa, segundo o médico Carlos Almodin,
fetos com meningomielocele são
abortados. No Brasil, não existe
autorização legal para abortos por
essa razão porque a Justiça entende que o problema não é incompatível com a vida.
Há quatro anos, a equipe da
Unifesp vem aprendendo com os
americanos a técnica da cirurgia
intra-uterina "a céu aberto". Ainda não há previsão de quando o
procedimento se tornará rotina
no Brasil. Segundo Almodin, por
se tratar de um procedimento arriscado, que coloca em risco a vida da mãe e do bebê, a técnica só é
indicada quando todos os prognósticos são favoráveis.
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