São Paulo, domingo, 28 de setembro de 1997.



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CASO CARANDIRU
Cinco anos depois, ex-governador fala em ações de extermínio; comandante rebate: "Ele não estava lá"
Fleury admite massacre na Detenção em 92

ROGÉRIO SIMÕES
ANDRÉ LOZANO
da Reportagem Local

Cinco anos depois da invasão da Casa de Detenção de São Paulo pela Polícia Militar, que resultou na morte de 111 presos, o ex-governador Luiz Antonio Fleury Filho admite que houve um massacre no dia 2 de outubro de 1992.
Em entrevista à Folha, Fleury afirmou que o massacre ocorreu depois da "perda de comando" da operação causada pelo ferimento sofrido pelo coronel Ubiratan Guimarães, comandante da ação.
"Enquanto houve comando, a ação estava sendo correta", disse o então governador. "Quando, pelas circunstâncias fáticas, desapareceu o comando, surgiram as ações individuais sem controle. Aí sim, dessas ações individuais, você pode falar em massacre, em ações de extermínio."
Até então, o governador havia admitido apenas que "policiais se excederam" na invasão.
O hoje deputado estadual Ubiratan Guimarães (PSD), 54, nega ter havido falta de comando e diz que, quando foi ferido por uma explosão, a operação já estava praticamente concluída.
"Foi no final, eu já não ouvia mais tiros", diz. "Seria cômodo para mim agora pular fora." O coronel foi o responsável pela invasão e é o único policial acusado de todas as 111 mortes no processo que tramita na Justiça comum.
Guimarães rebate a acusação de que presos foram massacrados e diz que Fleury fala sem conhecimento sobre o que aconteceu.
"Ele não estava lá, ele nunca me ouviu, nunca me perguntou nada; o que falaram para ele eu não sei", afirma. "Nunca houve massacre."
Um dos participantes da operação, o hoje major Wanderley Mascarenhas, então comandante do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais), também apontou falhas na condução da operação.
Segundo Mascarenhas, os policiais não tinham clareza sobre os seus objetivos.
"Em uma operação dessa envergadura, a primeira coisa -o que não aconteceu na época, e quase ninguém assumiu- é realmente saber o que se tinha de fazer e quem estava mandando fazer. Não se sabia", disse.
"Tinha muita gente dando ordem, muita gente autorizando."
Guimarães nega que isso tenha ocorrido. "Ele (Mascarenhas) sabia a missão desde o começo, cada um sabia o que fazer. Cada um tinha uma ação definida."
O promotor da Justiça Militar Luiz Roque Lombardo Barbosa, autor da denúncia contra 120 PMs que atuaram durante a invasão, afirma que a ação foi "um caos".
"Aquela operação ficou a critério de quem estava lá. Instaurou-se uma balbúrdia", diz.
Apesar de criticar as "ações individuais absolutamente condenáveis" de alguns PMs, Fleury diz que a decisão de invadir o presídio foi correta.
"Eu teria dado a ordem para entrar", disse o ex-governador, que afirma só ter tomado conhecimento da invasão depois que ela já havia ocorrido.
Na próxima quinta-feira, a invasão da Casa de Detenção pela PM completa cinco anos sem que nenhum acusado tenha sido julgado.
Nenhuma família das vítimas recebeu ainda o dinheiro de indenizações conseguidas na Justiça.



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