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São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 2003

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AMBIENTE

Possíveis causas do problema são urbanização desenfreada, construção de portos e "quebra-mares" em Fortaleza

Mar avança, destrói casas e ameaça praias no Ceará

KAMILA FERNANDES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM ICAPUÍ (CE)

Praias do litoral do Ceará estão ameaçadas de desaparecer por causa do avanço do mar, que destrói casas e afasta os turistas.
Os efeitos da força das marés são mais visíveis em três praias: Barreiras, no município de Icapuí (192 km de Fortaleza), Iparana e Icaraí, ambas em Caucaia, na região metropolitana da capital.
A chamada maré grande assusta até mesmo os moradores mais velhos, acostumados com as mudanças do mar. "Ninguém sabe se Deus é assim mesmo e deixa a natureza desfazer tudo o que Ele faz", disse Maria Vilani Barbosa, 70. Ela nasceu na praia de Barreiras e mora na mesma casa com a família há 50 anos.
Casas e coqueiros que ficavam em frente à casa de Barbosa já não existem mais. Até mesmo uma rua estreita, construída pelos moradores para a passagem de veículos à beira-mar, começou a desmoronar de três anos para cá.
Para impedir que o mar avance mais ainda, os moradores improvisam, em frente às casas, barreiras de madeira e pedra. Até um muro de tijolos chegou a ser construído na beira da praia, mas o mar já o destruiu parcialmente.
"A maré leva tudo embora, não espera por ninguém. Não adianta brigar com a natureza", disse o pescador Francisco de Assis Barbosa, 72, marido de Maria Vilani e patriarca de uma família formada por nove filhos, 36 netos e oito bisnetos, todos habitantes da praia de Barreiras.
"O mar não vai obedecer a uma cerquinha", disse a matriarca.
O volume da maré varia de mês a mês, de acordo com o vento, a lua e as correntes marítimas. Durante o dia, há momentos em que o mar aparece mais recuado e outros em que avança mais.
A saída, para os moradores, é mudar. "Se levassem a gente para uma casinha no alto da serra, já estava bom. Pelo menos a gente ia conseguir dormir à noite, sem medo de o mar invadir a nossa casa de repente", disse Zilda de Oliveira Barbosa, 33, outra moradora da localidade, onde vivem cerca de 250 famílias. A base da economia local é a pesca artesanal.
Existe um projeto da Prefeitura de Icapuí para a construção de contenções de pedra dentro do mar, mas ainda não há previsão de quando a obra será realizada.

Causas
Ainda não foi identificada uma causa específica para o avanço do mar na praia de Barreiras. Entre as hipóteses está o aquecimento do planeta, que provoca o derretimento de geleiras e o aumento do volume dos oceanos.
Já em Caucaia, estudos indicam que a urbanização contribuiu para acelerar o processo erosivo e a diminuição da faixa de areia. Na cidade, o mar destruiu casas de veraneio nas praias de Iparana e Icaraí, dois dos principais destinos turísticos do Estado.
De acordo com estudos coordenados pela UFC (Universidade Federal do Ceará), a construção de portos e dos chamados "quebra-mares" (espigões de pedra construídos dentro do mar, utilizados para conter o avanço das águas), em Fortaleza, é a causa da degradação ambiental existente em Iparana e Icaraí.
Em seu curso normal, sem barreiras, as marés transportam sedimentos do próprio oceano de um lado para o outro, mantendo o equilíbrio ambiental. A partir do momento em que a maré encontra obstáculos, os sedimentos retirados de uma praia não podem ser levados para o seu destino natural, o que gera o avanço das águas em determinados pontos.
No caso de Iparana, o processo de degradação começou na década de 70, como indicam pesquisas da UFC. Segundo um trabalho de 1989, intitulado "Dinâmica Sedimentar entre as Praias do Futuro e Iparana", o mar já havia avançado 300 metros na praia. Hoje, a faixa de areia no local praticamente não existe mais.



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