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INCULTA & BELA
Os Tigres e os acentos
PASQUALE CIPRO NETO
Colunista da Folha
Na semana passada, denunciei nesta coluna uma
barbaridade contra a língua
portuguesa e contra as crianças brasileiras. Tratava-se do
caso de livros infantis, importados de Hong Kong, escritos
em uma língua parecida com
a nossa, mas repletos de absurdos gráficos e sintáticos.
Os Tigres Asiáticos resolveram pintar e bordar por aqui.
Desta vez, a interminável crise nas bolsas fez uma nova
vítima, a moeda da Indonésia, a gloriosa rupia.
Tenho ouvido, em vários telejornais e também em muitas
emissoras de rádio, que "a
'rúpia' desvalorizou x% em
relação ao dólar".
Além do problema de regência (uma moeda não desvaloriza, nem valoriza em relação
a outra; uma moeda se desvaloriza ou se valoriza), existe
um de prosódia ("pronúncia
regular das palavras, com a
devida acentuação", segundo
o dicionário Aurélio).
Na verdade, existe um problema maior: o desconhecimento das regras de acentuação da língua portuguesa.
Lembro-me de uma repórter
de televisão, de nome Tamara. Preocupada em não ser
confundida com uma fruta
natalina, a jornalista registrava seu nome na tela com
um acento agudo no segundo
"a" (Tamára).
Ora, não é preciso acento
para que se leia "Tamára"; é
preciso acento para que se leia
"Tâmara", proparoxítona.
O sistema de acentuação da
língua portuguesa é interessantíssimo. Pegue qualquer
texto deste jornal, mas qualquer um mesmo. Escolha um
parágrafo e conte as palavras
que há nele. Depois, procure
as proparoxítonas. Garanto
(aposto quanto você quiser)
que são minoria -algo entre
8% e 12%, em média.
Todas as proparoxítonas
são acentuadas, exatamente
porque são as palavras mais
raras da língua.
Sobram as oxítonas e as paroxítonas. Para as duas, aplica-se o mecanismo de exclusão -o que se acentua num
caso não se acentua no outro.
Pegue como exemplo as palavras terminadas em "r". A
supermaioria é de palavras
oxítonas. Basta lembrar que
os verbos todos terminam em
"r" e são oxítonos. As paroxítonas terminadas em "r" são
poucas, pouquíssimas. O que
se acentua? As paroxítonas, é
claro. Éter, mártir, açúcar, caráter são bons exemplos.
Voltando à moeda da Indonésia, basta saber que as oxítonas terminadas em "a" são
acentuadas, como Pará, Paraná, vatapá, oxalá etc. Consequentemente, as paroxítonas
terminadas em "a" não são
acentuadas. E é esse o caso de
Maria, dizia, fazia, dia. Essas
palavras são paroxítonas,
sim. A divisão silábica de Maria é "Ma-ri-a", e a sílaba tônica é "ri". Se as oxítonas terminadas em "a" têm acento,
as paroxítonas não têm.
Já as paroxítonas terminadas em ditongo (ia, ie, io, ua,
ue, uo, entre outros) recebem
acento (diária, cárie, sábio,
árdua, tênue, vácuo). É esse o
caso de rúpia, que não é o
nome da moeda. O dicionário
explica que "rúpia" é "gênero
de plantas monocotiledôneas,
aquáticas...".
O nome da moeda é mesmo
rupia, com força no "i", como
se faz em dia, Maria, vadia,
corria, dizia, nostalgia etc.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna
todas as quintas-feiras
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