São Paulo, sábado, 29 de abril de 2006

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LETRAS JURÍDICAS

No rumo da desburocratização judicial

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

Aproximando-se o Dia do Trabalho cabe lembrar que os juízes de primeiro grau, aqueles aos quais cabe o maior contato com a sociedade, estão cada vez mais ativos e preocupados com novas práticas para melhorar o Judiciário em seus vários ramos. Comentário de fevereiro a respeito, saído na coluna, foi republicado no "Informativo InterAção", da EPM - Escola Paulista da Magistratura, ilustrado por fac-símile de cuidadoso trabalho da juíza paulista Ana Paula Bandeira Lins. No mesmo veículo, uma frase do presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Celso Limongi, também se volta para as bases do Judiciário: "A sociedade precisa conhecer os juízes, até para neles confiar", pois, no dizer dele, "assim estaremos interagindo, o Judiciário e o nosso povo".
A interação, como estímulo da eficiência na atividade judiciária requer organização racional do trabalho, uniformização metodológica, uso adequado dos equipamentos modernos, aproveitamento integral da eletrônica para melhor atendimento da sociedade. São Paulo infelizmente está muito atrás de outros Estados e regiões dos ramos da magistratura. O número de processos em andamento é imenso, mas não desculpa a massa de feitos não julgados até porque as boas idéias não são novas nem têm sido aproveitadas. Em 1973, o juiz Ennio Bastos de Barros, quando atuava no 2º Tribunal de Alçada Civil do Estado, produziu diagnóstico e propostas para melhora funcional da Justiça, a contar da funcionalidade de seus serviços que, agora, voltam à baila.
Ennio partiu de premissa severa: são raríssimos os tribunais, com "sua secretaria perfeitamente estruturada". Punha dúvida em que fossem "racionais e eficientes seus métodos de trabalho". Passados 33 anos, Ennio se aposentou e voltou à advocacia -sua crítica ainda representa a pura verdade. Em princípio, se refere a ineficiência e aos vícios da administração pública como um todo, "do recrutamento de pessoal à sua classificação, com a imprópria distribuição de tarefas, critérios de remuneração, determinação de procedimentos, escolha de material etc". Vícios que transcendem do nível estadual. É certo que na atualidade: diminuíram muito os autos processuais costurados, à moda antiga, com uma sovela ou uma agulha grossa de aço capaz de formar volumes de mais ou menos 200 folhas cada um. Nessa situação, escrevia Bastos de Barros em 1973, mesmo na transformação desordenada de varas e tribunais, "atua decisivamente apenas a tradição", com modificações lançadas "sem maior rigor técnico nem sequer na formulação de suas estruturas".
Entre outras propostas está a de que os tribunais contem, entre seu pessoal, para o direcionamento dos serviços, com elementos técnicos em administração ("Anais do 3º Encontro dos Tribunais de Alçada do Brasil", Porto Alegre, 1973, página 140). Para ele, a frustração do jurisdicionado com a Justiça dá origem à própria denegação dela, impondo o emprego criterioso dos dinheiros públicos, na busca de melhor resultado ao menor custo. Critica as rotinas que seus praticantes criam para "uma convincente aparência de eficiência e insuperabilidade". Ennio mantém ainda hoje a velha preocupação com a melhora da Justiça, evidenciada no trabalho do século passado. Paradoxalmente, porém, ainda há falta de diálogo dos desembargadores mais antigos com as bases. No Judiciário o "baixo clero" tem dificuldade para influir, em outro fator prejudicial da qualidade.


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