UOL


São Paulo, domingo, 29 de junho de 2003

Próximo Texto | Índice

SEGURANÇA

Estatísticas de 1995 a 2003 apontam aumento dos casos de latrocínio, homicídio doloso e roubo fora da capital

Crime "migra" para o interior de São Paulo

Lalo de Almeida/Folha Imagem
O assistente administrativo Mário Barroso dos Santos, 46, que teve o filho assassinado em Cubatão


GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Despreocupado, Péricles dos Anjos Barroso dos Santos foi, à noite e a pé, levar a namorada à casa dela. Sem desconfiar, Adriano Bastos dos Santos saiu ao portão de sua casa quando ouviu alguém chamar seu nome. Comportamentos comuns em cidades do interior, mas que terminaram em uma violência corriqueira em grandes centros urbanos.
Péricles dos Santos levou três tiros de espingarda calibre 12. Morreu na hora, em agosto de 2002. Um amigo, que testemunhou o crime e que reconheceu na polícia o autor dos disparos, também foi assassinado meses depois.
Adriano dos Santos levou três tiros de revólver no último dia 14 e permanecia até anteontem internado na UTI. Também nesse caso um amigo testemunhou o crime, delatou o autor e foi atacado por ele, dois dias depois, mas levou apenas um tiro de raspão.
Ambos com 19 anos, sem antecedentes, Péricles e Adriano nasceram e cresceram em uma cidade do interior: Cubatão (58 km de SP). Foram atacados por causa de rixas. Os autores eram envolvidos com drogas e roubos.
Saudosos da Cubatão pacata onde cresceram, o assistente administrativo Mário Barroso dos Santos, 46, e o mecânico Pedro Vieira dos Santos, 38, pais das duas vítimas, acham que a violência aumentou nos últimos anos.
A suspeita é confirmada pelas estatísticas criminais da Secretaria Estadual da Segurança Pública de São Paulo. Em 2002, Cubatão liderou o ranking de homicídios no interior do Estado, com 70,47 por 100 mil habitantes, 37,83% a mais do que em 1999.
Não se trata de um caso isolado. Estatísticas de 1995 a 2003 desmitificam a visão do interior como refúgio a salvo da violência. A região enfrenta crescimento de latrocínios (matar para roubar), homicídios dolosos (intencionais) e roubos, contrariando a tendência de queda na capital paulista e na Grande SP.
"Tem muita gente que pensa em mudar para o interior para fugir da violência. Mas, dependendo da cidade e do crime, você tem índices maiores do que na capital", afirmou Túlio Kahn, 38, doutor em ciência política e pesquisador da Coordenadoria de Análise e Planejamento da secretaria.
Em um artigo publicado no site Conjuntura Criminal, Kahn fala em "interiorização da criminalidade" e "migração da criminalidade da capital para as cidades do interior".
O aumento de crimes contra a vida no interior é verificado nos dados do primeiro trimestre de 2003, nas estatísticas anuais e na comparação entre 1995 e 2003, feita por Kahn. Os dados são separados entre capital, Grande SP e interior -litoral incluído.
No primeiro trimestre de 2003, foram 63 latrocínios no interior, 8,62% a mais do que no mesmo período de 2002. É um recorde na comparação dos trimestres de todos os anos desde 1995.
Entre as vítimas está o procurador de Justiça Luís Felippe França Ramos, 48. Ele foi assaltado e morto em janeiro após ter um pneu furado por pedras colocadas na rodovia Padre Manoel da Nóbrega, em Cubatão.
O interior paulista teve aumento de 6,22% no primeiro trimestre de 2003 em relação ao período anterior. Nos dados somatórios de 2002, 2001 e 2000, registrou crescimento de um ano para o outro, enquanto capital e Grande SP tiveram queda.
Em 2002, foram 3.887 homicídios no interior. Entre eles, os de Péricles dos Santos e de seu amigo. "O amigo de meu filho viu o assassinato. Não queria depor, mas o convenci. Sem querer, fui também responsável pela sua morte", disse Pedro dos Santos, pai de Péricles, no fórum de Cubatão na quinta-feira, antes da primeira audiência do acusado de matar seu filho.
Segundo Túlio Kahn, a participação do interior no total de crimes no Estado cresceu em relação a 1995, quando concentrava 33% dos latrocínios e 23,5% dos homicídios. Os índices subiram em 2003 para 46,7% e 34%, respectivamente.
Em 99, no ranking das cidades com maior índice de homicídios por 100 mil habitantes, municípios do interior ocupavam a nona e a décima posições. Em 2002, cidades do interior ocuparam a terceira e a sexta posições.


Próximo Texto: "Cidades foram vítimas do próprio sucesso"
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.