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São Paulo, domingo, 29 de junho de 2003

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DANUZA LEÃO

Sem respostas

Depois do sucesso da parada do domingo passado, é o caso de pensar: estará o universo se tornando gay?
Um jovem pergunta se na minha juventude havia tantos gays como agora. Não, respondo. Existiam alguns, poucos, e me lembro de um amigo de cerca de 30 anos, bonito, rico, inteligente, culto, charmoso, que se matou quando veio a público que ele era gay -isso no final dos anos 60, vê se pode. Mas, continua o jovem, será que eram tantos quanto hoje, só que ninguém sabia? E mulheres gays, pergunta, já existiam? Bem, existir existiam, mas era diferente.
Conto que havia em Paris uma boate chamada Carrol's, onde todas -da que abria a porta às que serviam as bebidas- pareciam saídas da mesma fôrma. O cabelo era cortado curtinho como o dos homens, vestiam terno completo, camisa, gravata e sapato masculino; eram quase todas gordas e feias e faziam questão de não usar um pingo de maquiagem -de não se enfeitar, enfim.
A clientela era igual; dançavam entre elas, e era um programa turístico ir às vezes -muito bem escoltadas- ver esse mundo tão diferente. Morrendo de medo, pensávamos estar correndo grandes riscos de um assédio sexual, que naquele tempo devia ter outro nome; lá, nunca nenhuma de nós, as garotas do grupo, se aventurou a ir ao banheiro retocar a maquiagem.
O tempo passou, o mundo foi mudando e o número de gays aumentando: hoje os jornais informam sobre as novas conquistas desse universo cada vez maior (10% da população assumida, segundo as pesquisas), o direito, em alguns países, ao casamento e à adoção de crianças, a "saída do armário" com menor ou maior dificuldade, a aceitação pelo mundo em geral de sua opção sexual (será que "opção sexual" é como se deve dizer? Se não for, já vou me desculpando).
Por outro lado, há anos ouço minhas amigas, das mais diversas gerações, se queixando de que não existem homens "na praça". As casadas fazem parte de outro circuito, as solteiras e divorciadas não conseguem namorar. Segundo elas, quando o namoro vai ficando mais sério, se surge a mais leve perspectiva de um dia, talvez, quem sabe, irem morar junto -nenhuma é louca de pronunciar a palavra casamento-, eles somem, desaparecem. Aliás, minto: eles começam a desaparecer quando percebem que as saídas sem compromisso estão virando saídas com compromisso. Para essas mulheres, se uma parte dos homens não quer nada, outra está casada, e outra é gay, a vida fica difícil, convenhamos.
Talvez seja por isso (também) que existem em certos círculos, sobretudo nas cidades grandes, tantas menininhas, todas gracinhas, sofisticadas, bonitinhas, saradas e -ai, a dificuldade de escolher a palavra sem ofender, vamos lá- sapatinhas. Dizem (eles) que às vezes elas resvalam e dão uma voltinha com um deles, bem à moda antiga, mas que voltam logo ao que preferem, isto é, elas com elas. Sabe-se também que a geração mais novinha vai às raves, todos se beijam muito a noite inteira e, depois, nada.
É impossível não refletir sobre todas essas novidades: como explicar este vento gay que está varrendo o mundo? Será a liberdade de poder fazer todas as experiências, será uma fase, estará havendo um mal-entendido entre homens e mulheres, será um modismo, será que os impulsos pelo mesmo sexo sempre existiram e a diferença é apenas que antes havia a famosa repressão que agora não existe mais, ou será tudo junto?
Boas perguntas.

E-mail - danuza.leao@uol.com.br


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