São Paulo, quarta-feira, 29 de julho de 2009

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GILBERTO DIMENSTEIN

Vibração digital


Aquele episódio só reforçara a visão de Pedro de que o ensino formal impõe limites a atitudes muito inovadoras

QUANDO a professora do curso de comunicação digital, na Unisinos, no Rio Grande do Sul, pediu aos alunos que escolhessem qualquer produto para um trabalho sobre inovação tecnológica, Pedro Markun quis fugir do lugar-comum: escolheu o vibrador.
Em meio a estudos sobre a história do orgasmo, relatou o desenvolvimento dessa engenhoca desde os tempos da máquina a vapor até a aplicação dos chips. Teve uma boa nota, mas, para evitar embaraços, foi vetado de expor sua pesquisa em público. "Recorri à direção da universidade e acabei ganhando."
O episódio apenas reforçou a visão de Pedro de que o ensino formal impõe limites a atitudes muito inovadoras. Não concluiu nem o curso de comunicação nem o de história.
"Só que eu não quero parar de descobrir." Há duas semanas, ele, aos 23 anos, resolveu colocar sua inquietude em duas casas numa antiga vila operária tombada pelo patrimônio histórico, no bairro de Santa Cecília, para criar um misto de escola e laboratório digital.

 

Há vários anos ele já vem desenvolvendo projetos digitais. Elaborou um site (www.livrolivre.art.br) para a criação de uma biblioteca comunitária. São listadas pessoas que gostariam de doar um livro e como localizá-las. "O livro não precisa ficar preso na estante. Queríamos fazer com que as pessoas desenvolvessem o hábito de fazer uma corrente de livros." Para evitar transtornos, uma das possibilidades é o doador avisar onde vai deixar as obras, e quem entrasse no site saberia onde pegá-las.
Pedro também desenvolveu um projeto de cinema colaborativo: filmes escolhidos coletivamente, mediante votação por internet, são projetados em espaços públicos, com a mobilização da comunidade.
"A cultura digital é uma chance de fortalecer a sociedade."

 

Pedro resolveu se associar a seis grupos, todos de jovens que realizam experimentação digital. Alugaram duas casas na vila operária Savoia, na Santa Cecília. A vila inteira ainda pertence à família que tinha indústrias.
É nesse local que nasce a "Casa de Cultural Digital", onde se pretende gerar não só produtos -e disseminá-los- mas promover cursos, palestras e seminários, num misto de escola, empresa e laboratório. Na primeira aula, eles são alunos.
Todos aqueles jovens estão aprendendo sobre a história da cidade ao investigar aquela vila. Da descoberta da história, surge o primeiro projeto: a construção de um mapa digital para que as pessoas conheçam melhor aquele bairro.
É a união dos tempos da chaminé com as fibras óticas.

 

PS - Coloquei em meu site (www.dimenstein.com.br) as fotos da vila operária. Ali, é como se São Paulo tivesse parado no tempo das chaminés e dos bondes -aliás, naquela época, segundo a pesquisa de Pedro, o vibrador, acoplado a um fio elétrico, era apenas usado para tratamento psiquiátrico contra histeria.

gdimen@uol.com.br


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