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DIREITOS HUMANOS
Em relatório sobre o Brasil, ONG alerta para o aumento do número de mortes pela polícia do Rio e de São Paulo
Para a Anistia, impunidade continua no país
MARIA LUIZA ABBOTT
DE LONDRES
A Anistia Internacional divulgou ontem relatório sobre a violência no Brasil dez anos depois
das chacinas da Candelária e de
Vigário Geral, no Rio. De acordo
com a organização, passada uma
década, "continua a sensação de
impunidade" que cercou os dois
episódios e as vítimas não receberam indenizações do Estado, nem
mesmo Wagner dos Santos, único sobrevivente da Candelária.
Foram feitas prisões de responsáveis pela chacina na Candelária,
mas, no caso de Vigário Geral, só
duas das 33 pessoas acusadas no
processo principal estão presas.
A organização alerta que o número de mortes pela polícia em
São Paulo e no Rio voltou a subir,
após um período em queda, e denuncia o que chama de "apoio
político" a elas.
No Rio de Janeiro, 621 pessoas
foram mortas pela polícia no primeiro semestre deste ano, um aumento de mais de 30% em relação
ao ano passado.
Em São Paulo, a Polícia Militar
matou 435 pessoas entre janeiro e
maio, o que corresponde a 60%
do que foi registrado em todo o
ano passado.
"Para a Anistia, a violência extrajudicial não se resolve porque
continua o apoio político ao assassinato de criminosos ou alegados criminosos", disse Damian
Platt, uma dos representantes da
Anistia para o Brasil.
A Anistia diz ter documentado
"evidências consistentes de que
não mudou o contexto" em que
assassinatos por policiais acontecem no país. O relatório cita "declarações públicas de políticos
eleitos que parecem apoiar a matança de civis, apresentando as
mortes como produto necessário
e aceitável do controle do crime".
Cita declarações do prefeito do
Rio, Cesar Maia (PFL), que disse
que se ele fosse o governador na
época da rebelião em Bangu 1 em
setembro de 2002, "não tinha
conversa, não tinha negociação.
Mandava entrar o Bope [Batalhão
de Operações Especiais] e matava
quem tinha que matar".
Cita também o discurso do então secretário de Segurança do
Rio, Josias Quintal, que, no lançamento da Operação Rio Seguro,
em 26 de fevereiro deste ano, disse: "Nosso bloco está nas ruas e, se
tiver que ocorrer conflito armado,
vai ter. Se alguém tiver que morrer por isso, que morra."
A Anistia conta ainda que o
atual governador de São Paulo,
Geraldo Alckmin (PSDB), usou
imagens durante sua campanha
para a reeleição que mostravam a
morte pela polícia de um grupo
de suspeitos em um ônibus.
Tim Cahill, pesquisador da
Anistia para o Brasil, comparou o
que está acontecendo no país com
a atual situação no mundo. "No
Brasil, embora não haja terrorismo, a guerra contra o crime justifica o desrespeito aos direitos humanos, como é o caso da guerra
contra o terrorismo no mundo."
O relatório avalia que a segurança no país é destinada ao brasileiro da "classe média para cima",
enquanto os mais pobres sofrem,
normalmente nas mãos da polícia. "A segurança só existe para
certos setores da sociedade. Jovens, pobres e de origem africana
continuam morrendo no país",
afirma Cahill.
Na abertura da apresentação do
relatório, a Anistia mostrou um
vídeo do afroreggae "Tô Bolado",
que fala da chacina de Vigário Geral em que "só morreu trabalhador". As imagens mostram episódios de violência policial.
O relatório reconhece que o policiamento em cidades como o
Rio e São Paulo é difícil e perigoso, e que as autoridades têm o dever de buscar proteger os cidadãos, mas alerta que os policiais
têm treinamento insuficiente,
além de receber baixos salários.
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