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São Paulo, sábado, 29 de novembro de 2003

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ADMINISTRAÇÃO

Em Pinheiros, lei da limpeza pública é usada para impedir rabino de distribuir cestas básicas em avenida

Subprefeita quer vetar doação de alimentos

AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

A Subprefeitura de Pinheiros quer proibir a distribuição de alimentos para pessoas carentes em um canteiro no Alto de Pinheiros -bairro de classe média alta na zona oeste de São Paulo.
A prefeitura alega que o projeto é ilegal por ser realizado em área pública. Para o rabino Avraham Zajac, que coordena a distribuição das cestas, a proibição é fruto do preconceito de moradores.
As doações ocorrem todas as terças-feiras, desde agosto, num canteiro da avenida Pedroso de Morais, ao lado da praça Ernâni Braga. Segundo Zajac, cerca de 300 cestas básicas são entregues a cada semana. A distribuição começa às 14h mas, às 6h, já há pessoas à espera dos alimentos, doados por membros da comunidade judaica do bairro.
Há duas semanas, a Subprefeitura de Pinheiros avisou o rabino, por escrito, que, se ele continuasse a distribuir alimentos no local, tomaria as medidas previstas na lei municipal de limpeza pública.
A lei proíbe a exposição ou depósito de qualquer material (mercadorias, placas etc.) em locais públicos, como canteiros e jardins. A pena prevista é a apreensão do material e o pagamento das despesas de remoção.
Zajac, porém, diz que continuará a distribuir as cestas.
A subprefeita Bia Pardi afirmou ontem que não pretende tomar nenhuma atitude "agressiva" no caso. "Eu vou insistir em conversar com o rabino até ele entender que a praça não é lugar para isso. Não é só porque é uma benemerência que ele pode fazer à revelia de todas as outras pessoas."
As principais críticas ao projeto são referentes à sujeira deixada no local e ao risco de acidentes, já que a Pedroso de Morais é uma avenida movimentada e a distribuição ocorre no canteiro central.
O primeiro aspecto -a sujeira- já está resolvido, segundo Zajac. Ele contratou uma das pessoas assistidas para recolher todo o lixo deixado após a distribuição das cestas básicas.
Quanto à segurança, Zajac diz que pediu à subprefeitura que articulasse com a guarda municipal ou com a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) um esquema que garantisse a ordem no local durante a distribuição.
Outra alternativa proposta por Zajac à subprefeitura foi a transferência do projeto para um local público mais adequado. Pardi, porém, argumenta que a prefeitura não dispõe de terrenos para acolher o projeto, pois Pinheiros já é um bairro urbanizado.
"Concordo com todas as questões verbalizadas [limpeza e segurança], e todas elas podem ser solucionadas. As não-verbalizadas são o preconceito e o medo de que chegue ao bairro um tipo de elemento que antes não tinha", afirma o rabino.
Pardi contesta. "A população daqui conhece a legislação e acha que praça não é para isso. Ninguém está proibindo ele de distribuir cestas básicas, ninguém disse que isso não é bonito. O que não pode é fazer ali."
O projeto surgiu no canteiro por ser o local onde, há 11 anos, mora o sem-teto Raimundo Arruda Sobrinho, 65. Folclórico na vizinhança, onde se diz que ele é filósofo e está escrevendo um livro, Sobrinho já foi atendido pela prefeitura mas não quis sair dali.
Quando Zajac perguntou como poderia ajudá-lo, pediu comida para os amigos. "Na minha vida, não mudou nada. Mas o povo está feliz. Eles precisam de quem os ajude", afirma Sobrinho.


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