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Apoio de laboratório é necessário para a reciclagem, dizem médicos
DA REPORTAGEM LOCAL
A participação da indústria farmacêutica é importante para a
educação continuada dos médicos e essa parceria não compromete o exercício da medicina se o
profissional se guiar por princípios morais e éticos.
A avaliação é de médicos entrevistados pela Folha sobre reportagem publicada ontem em que
dois médicos denunciam a relação promíscua entre os laboratórios e os profissionais da saúde,
que, muitas vezes, estaria calcada
mais em benefícios pessoais do
que no bem da população.
"A influência do laboratório sobre o médico tem um limite: a ética e o caráter do profissional. Se
ele ultrapassa essa barreira, é um
problema individual dele, não
institucional", diz o ginecologista
Artur Dzik, chefe do serviço de reprodução do Pérola Byington e
diretor da Sociedade Brasileira de
Reprodução Humana.
Na sua opinião, se não existisse
o patrocínio dos laboratórios, a
realização de congressos científicos seria muito difícil. "Se dependêssemos dos órgãos públicos para nos atualizar, estaríamos na
Idade da Pedra", diz Dzik.
Em geral, os eventos médicos
(congressos, simpósios e encontros), uma das fontes de atualização científica da categoria, são organizados com recursos vindos
da venda de estandes para os laboratórios. Não há recursos públicos para esse tipo de evento.
O reumatologista Morton
Scheinberg, do Hospital Israelita
Albert Einstein, diz que, na sua
área de atuação, por exemplo, há
médicos que receitam remédios
ultrapassados por desconhecerem os tratamentos de ponta -
muitos dos quais apresentados
por estudos dos laboratórios.
"Eles estacionaram nos corticóides e antiinflamatórios enquanto
os tratamentos imunobiológicos
são muito mais eficazes", afirma.
Em algumas sociedades médicas, a parceria entre os profissionais e os laboratórios está institucionalizada. A SBD (Sociedade
Brasileira de Dermatologia), por
exemplo, reúne-se anualmente
com representantes da indústria
farmacêutica e discute como será
sua participação na agenda de
eventos da especialidade.
O apoio ocorre por meio da
compra dos estandes e de espaço
publicitário em revistas, jornais e
malas diretas, explica a médica
Denise Steiner, presidente da regional paulista da SBD.
"É preferível assim do que os
profissionais da área participarem de simpósios promovidos
por laboratórios em que os temas
abordados acabam sendo enviesados. Nesses casos, só prevalece a
idéia dele [laboratório]."
Para Raimundo Marques do
Nascimento, diretor da Sociedade
Brasileira de Cardiologia, um dos
caminhos para moralizar a relação entre os médicos e laboratórios, especialmente nos congressos científicos, é que as sociedades
obriguem os filiados a manifestarem o conflito de interesse em
suas apresentações.
"Existe um misto de cenários:
há laboratórios e médicos com
posturas éticas e não-éticas. Não
dá para generalizar. Há gente séria na indústria farmacêutica."
O médico José Erivalder Guimarães de Oliveira, 53, secretário-geral da Federação Nacional dos
Médicos, considera que apenas
uma minoria de médicos, os formadores de opinião, ligados às
universidades, sofra assédio direto da indústria farmacêutica. "A
grande maioria recebe, no máximo, o propagandista em seu consultório", afirma.
Mas nem por isso deixam de ser
influenciados. Na falta de educação continuada oferecida pelos
gestores de saúde e empresas de
medicina de grupo, explica Oliveira, muitos médicos se valem
dos propagandistas como forma
de se atualizar.
Em setembro, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) deve colocar em consulta pública uma nova resolução em que
pretende apertar o cerco ao assédio exercido pelos propagandistas nos consultórios médicos. A
idéia é editar, entre outros pontos,
regras mais claras em relação à
oferta de amostras grátis de medicamentos.
(CLÁUDIA COLLUCCI)
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