São Paulo, sábado, 30 de setembro de 2000

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LETRAS JURÍDICAS

Nós somos o remédio

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O mundo vive a crise inevitável da transformação, pois não absorveu suas novas realidades, geradas pelo progresso científico, nem se liberou das antigas. A convulsão social da vida predominantemente urbana (três quartos da população vivem nas cidades), do acesso da mulher ao mercado de trabalho e de sua liberação sexual e a mudança da estrutura familiar e da "operação econômico-administrativa" dela deram mais uma contribuição para ampliar a confusão em que mergulhamos.
No Brasil, acrescentou-se ao dado mais antigo, da grande miscigenação racial, o dado novo (posterior a 1960) da conquista do oeste e do noroeste, no sentido sul-norte, ao lado das migrações no sentido nordeste-sul, desenraizando milhões de brasileiros, para a agressividade encontrada em seus novos lugares de habitação e trabalho.
No corte sintético da segunda metade do século 20, inseriu-se o gráfico da retomada da democracia após o Estado Novo de 37, a volta aos governos autoritários em 64 e a reversão democrática com mais acidentes políticos do que seria razoável suportar: com a morte de Tancredo Neves, Sarney governando mais surpreso do que todos; Collor sendo afastado pelo impeachment e Fernando Henrique reeleito e antecipando eventual imitação do Peru.
Haja confusão, portanto. O direito entra nessa história graças ao processo eleitoral em curso em milhares de municípios brasileiros, quando reavaliamos, horas antes do pleito, o verdadeiro interesse público, na ponderação sobre as promessas feitas agora e no passado. Avaliar a credibilidade dos políticos não é matéria jurídica, mas parece pouco provável que o leitor venha a me criticar se admitir, observando as tais promessas, algumas delas absolutamente fora da competência constitucional de prefeitos e vereadores -por isso, de cumprimento impossível-, dizer que está faltando seriedade a essa gente. Corrijo a generalização, pois também há gente boa na disputa. Vendo, porém, a propaganda eleitoral, contraposta às pesquisas divulgadas de tempos em tempos, observa-se a descrença do povo de que haja intimidade entre muitos políticos e a verdade.
Bons ou maus, porém, são eles que criam, na administração das cidades, as normas e os fatos regentes da vida dos cidadãos. Caberia ao Judiciário, sendo-lhe requerido, corrigir o erro, fazendo o carro do bem comum retornar aos trilhos do direito, em politização da magistratura.
O Judiciário, porém, vive imerso em dúvidas, como se comprova com as muitas liminares concedidas, cassadas, restauradas, no vai-e-vem da moderna sanfona judicial, agravando a confusão das leis desconexas.
Então, dirá o leitor-eleitor, se os candidatos mentem e o Judiciário falha, não há remédio? Há sim. O remédio somos nós. E sendo nós tão heterogêneos quando efetivamente devemos ser, a nossa voz tende a não ser uniforme. Tudo o que ela significa demora a acontecer. Contudo, pensando na próxima eleição, devemos sintonizar o voto com o verdadeiro sentido do bem comum, nosso e de nossos filhos. Sem afastarmos o presente. Tomando cuidado com a qualidade moral e com a capacidade de quem sufragarmos, mas avaliando o futuro. Assim, encontraremos a luz no fim do túnel convulsionado e obscuro, no qual nos encontramos e do qual queremos distância.



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