São Paulo, domingo, 31 de março de 2002

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SAÚDE

Triagem auditiva deve ser feita no berçário

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Mikaelly, 3, só escuta sons fortes, como o barulho de um tambor. Ela nasceu com uma deficiência auditiva muito grave, que não foi detectada na maternidade, nem pelo pediatra que consultava mensalmente. O problema só foi notado pela mãe quando a menina fez um ano e não falava.
Mais um ano se passou até Mikaelly ter o problema diagnosticado e conseguir iniciar a reabilitação auditiva. Hoje, usando um aparelho de amplificação sonora emprestado, ela reage a estímulos de sons e fala algumas palavras. Começa, finalmente, a se comunicar com o mundo.
A surdez de Mikaelly é muito mais comum do que se pensa. A cada grupo de 1.000 bebês que nasce no Brasil, em média 3 sofrem de deficiência auditiva. A doença poderia ser identificada e tratada a partir dos primeiros meses, o que aumentaria muito as chances de reabilitação da criança, mas são poucas as maternidades brasileiras que dispõem de equipamentos e de pessoal treinado para esse fim. Nos EUA, a triagem auditiva neonatal vem sendo realizada desde 1990.
Em média, a idade de diagnóstico da surdez no Brasil é aos quatro anos, fase em que o desenvolvimento da fala e da linguagem já estão seriamente prejudicados. Por causa do seu mundo silencioso, a criança perde a fase mais importante da aquisição da linguagem e, consequentemente, terá dificuldades de comunicação e de se relacionar socialmente.
O ideal, segundo os fonoaudiólogos, é que toda criança, ao nascer, seja submetida a um exame chamado Emissões Otoacústicas Evocadas (EOA), conhecido por "teste da orelhinha", que avalia se o bebê apresenta perda auditiva.
Se o primeiro exame detectar a falha, recomenda-se repeti-lo depois de alguns dias porque pode ser que haja líquido amniótico no ouvido do bebê, o que levará a um resultado falso positivo.
Caso a falha persista, a criança deve passar por um outro teste chamado Audiometria de Tronco Cerebral, que avalia a condução do estímulo auditivo da porção periférica até o tronco cerebral, e ser avaliada clinicamente.
O médico Manoel de Nóbrega, 39, responsável pelo departamento de otorrinolaringologia da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), afirma que a detecção precoce da surdez e a intervenção adequada, até os seis meses de idade, permitem que a criança apresente desenvolvimento muito próximo ao de uma outra normal.
Segundo a fonoaudióloga Altair Pupo, mais conhecida por Lila, diretora da Faculdade de Fonoaudiologia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica), ao ser confirmada a deficiência, a criança deve usar imediatamente um aparelho de amplificação sonora.
O acompanhamento de um fonoaudiólogo, que fará a adaptação desse aparelho e ensinará a criança a reconhecer os sons e a integrá-los ao cotidiano, é fundamental, afirma Lila. A PUC mantém um serviço chamado Derdic (Divisão de Educação e Reabilitação dos Distúrbios da Comunicação), que faz o diagnóstico e o acompanhamento audioeducacional das crianças.
Para a fonoaudióloga Beatriz Mendes, também é essencial um trabalho de suporte emocional aos pais das crianças surdas. "Ninguém está preparado para aceitar que aquele bebê lindo, rosadinho, não escuta", afirma.


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