São Paulo, segunda-feira, 31 de julho de 2000


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SEGURANÇA PÚBLICA
Na periferia de São Paulo, fornecedores de armas ganham em cima de crimes cometidos por outras pessoas
Revólver alugado é usado para matar 3

DA REPORTAGEM LOCAL

Um revólver alugado por R$ 50 serviu para assassinar três pessoas em um mesmo final de semana em São Paulo. O esquema recém-descoberto pela polícia mostra que os fornecedores diversificaram e estão ganhando em cima de crimes que outros cometem.
As duas primeiras vítimas foram os frentistas Ademário Brito Trápia, 40, e o vigia Nivaldo Amaro de Oliveira, 43, surpreendidos por um assaltante dia 17 de junho em um posto na região do Ipiranga (zona sudeste).
Dois dias após, a mesma arma foi usada contra a pediatra Natália Rodrigues Garcia, abordada pelo mesmo assaltante em um semáforo na periferia da capital.
""Após a fita (crime), o revólver era entregue de volta para Flávio (o dono da arma) e o pagamento girava em torno de R$ 40 a R$ 50", consta do depoimento que Wellington Rufino de Matos, 18, acusado de participar dos dois assaltos, deu à polícia após ser preso.

"Dedo mole"
Flávio, segundo a polícia, trabalhava como perueiro e está foragido. Além do revólver, ele teria em casa uma pistola.
O suposto autor dos disparos, Willian da Silva Félix, 33, conhecido como Lia, nem chegou a ser preso. Morreu assassinado a tiros no último dia 7.
""Lia é dedo mole, principalmente se tiver com algumas pingas na cabeça", disse o gráfico Paulo Henrique Brasilino Furtado, 28, que está preso devido à participação no assalto, em depoimento à polícia.
O revólver usado nos dois assassinatos não foi encontrado. Segundo a polícia, as vítimas não reagiram ao assalto.

Pesquisa
A Folha encontrou armas a serem alugadas na periferia da cidade de São Paulo. Um revólver oferecido à reportagem em um dia, no outro estava servindo para cobrar uma dívida.
""O cara vai usar para cobrar uma grana, depois me devolve e você pode passar para pegar", explicou o rapaz.
Durante uma semana, a Folha visitou locais de São Paulo onde é possível comprar armas.
Revólver calibre 38 cano curto novo, parecido com o que a Polícia Militar usa, custa R$ 300.
Uma pistola calibre 380, que tem maior poder de destruição, sai por R$ 500. Uma submetralhadora, 80 tiros, custa entre R$ 1.500 e R$ 2.000.
A lista de preços do mercado informal é menos que a metade das lojas especializadas.
A principal diferença entre pistola e revólver, além do poder de provocar ferimento mais grave, é a capacidade de munição.
O revólver leva de cinco a sete cartuchos, enquanto as pistolas podem ter no pente ate 15 balas.

Entrega
A entrega é na hora ou sob encomendada, dependendo da complexidade do pedido. A submetralhadora vem do Paraguai e o restante das armas está no bairro mesmo, espalhado por várias casas de conhecidos.
As informação foram passadas por um rapaz de 19 anos, um dos ""soldados" de quadrilha de assaltantes instalada na periferia da capital. São os mais antigos no crime que abastecem esse mercado paralelo de armas.
""Agora está mais embaçado arrumar quadrada (pistola). Quem tem está segurando, achando que vai ficar mais difícil e caro, mas dá para arrumar uma."
E munição? ""É com a gente mesmo, pode pedir. Quanto vai querer levar?"

Mobilete
Durante as visitas, a Folha conheceu André (nome fictício), 18, ex-interno da Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor) e que já foi ferido em tiroteio com a polícia.
Aos 16 anos, ele diz ter trocado a mobilete que tinha por um revólver calibre 38.
Um ano depois, estava escondendo uma submetralhadora dos pais dentro do próprio guarda-roupa e arrumava carros para assaltantes de banco.
""O ladrão pedia moto ou carro e eu trazia à noite mesmo", afirmou André.
(ALESSANDRO SILVA)


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