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VINICIUS TORRES FREIRE
A política dos números e os pobres
Ministro da Previdência lança debate que politiza cálculo das despesas e das receitas do governo. E isso é bom
O MINISTRO da Previdência,
Nelson Machado, está à beira
de conseguir politizar as contas dos gastos do governo. Machado
lançou o debate ao propor a mudança dos métodos de cálculo do balanço da Previdência. Soa mal a expressão "politizar"? Não deveria, pois
aqui se trata de política no sentido
forte e civilizado do termo.
O cidadão pode prezar ou execrar
as opiniões do ministro sobre o que
fazer das despesas do INSS e da assistência social. Mas a essência do
debate proposto é outra.
Em suma, o ministro pretende
que fique claro quem recebe benefícios, quem paga a conta e quem é
isento, em parte ou totalmente, de
contribuir (caso da maioria dos trabalhadores rurais, de empresas
isentas parcial ou totalmente das
contribuições para o INSS etc.).
Literalmente no fim das contas, o
dinheiro sai dos cofres do governo
federal, não importa a rubrica, o nome que se dê a tal ou qual despesa.
Mas, quando arrecadação e gasto do
dinheiro público são explicados de
maneira clara, a qualidade do debate
sobe. Mais, ficam explícitas preferências políticas e sociais das ações
de governo. Sobre quem pesam os
impostos? Quem é o recipiente da
despesa? Esclarecer e politizar decisões sobre o orçamento público chama-se democracia. Há uns 20 anos,
não se sabia direito no Brasil quanto
o governo gastava, de quanto era o
déficit ou a conta de juros.
Há quem diga que Machado queira apenas desviar o foco sobre a despesa previdenciária e seu déficit.
Mas a nova contabilidade dos gastos pode reforçar argumentos de
quem prega a contenção na despesa
dita social. Exemplo: as aposentadorias dos trabalhadores rurais respondem por dois terços do déficit do
INSS. A contribuição dos aposentados rurais para o fundo da Previdência é quase nula.
De fato, trata-se de um Bolsa Idoso, não de Previdência. Como no
Bolsa Família, o beneficiário não
contribuiu para um fundo específico. Mas o aposentado rural recebe
ao menos o salário mínimo, cinco
vezes maior que a média do benefício do Bolsa Família. Há quem prefira fazer mais gastos no Bolsa Família, usando dinheiro do INSS rural,
despesa que teria mais impacto na
redução da pobreza.
Mas o debate não deveria parar no
INSS. Há despesas sociais grandes
como o seguro-desemprego (reservado a quem tem carteira assinada),
aposentadoria de servidores públicos (2,3% do PIB) etc. Quem merece
receber quanto? Quem paga? Proporcionalmente, impostos pesam
mais na renda dos mais pobres.
Há inúmeras e bilionárias isenções de impostos para empresas. Para educação e saúde da classe média
alta e rica. A despesa anual com juros tem sido igual à do INSS (8% do
PIB). Colocadas essas contas na mesa do debate público, o que diriam os
diversos setores sociais sobre a justiça dessas receitas e despesas?
A despesa com Previdência no
Brasil é recorde mundial? É. Assim
como desigualdade, impostos, juros,
violência etc. Como usar (ou não) o
dinheiro público para resolver tais
problemas e/ou fazer com que a economia cresça de modo que a sociedade dependa menos do Estado?
O ataque histérico à "mera mudança contábil" é economicismo,
reacionarismo ou burrice mesmo.
vinit@uol.com.br
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