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RETOMADA
Aumento do crédito e recuperação da renda fazem índice superar expectativa, mas falta de investimento preocupa
Consumo interno puxa alta de 4,2% do PIB
GABRIELA WOLTHERS
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
A economia brasileira teve no
primeiro semestre deste ano seu
melhor desempenho desde 2000.
O PIB (Produto Interno Bruto, soma das riquezas produzidas no
país) cresceu 4,2% em relação ao
mesmo período de 2003 e apresentou, pela primeira vez no ano,
uma reação do mercado interno,
segundo dados divulgados ontem
pelo IBGE (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística).
Em relação ao primeiro trimestre deste ano, a expansão foi de
1,5%. Favorecido pela fraca base
de comparação de 2003, ano muito ruim para a economia, o PIB do
segundo trimestre de 2004 teve
uma alta ainda maior em relação
ao mesmo trimestre daquele ano:
5,7%, a maior taxa de crescimento
trimestral desde o terceiro trimestre de 1996.
Em razão especialmente do melhor desempenho do setor de serviços -que cresceu 2,8% no semestre-, as taxas superaram as
expectativas de analistas, que previam um crescimento de 3,4% a
5,3% em relação ao segundo trimestre de 2003. Na série trimestre
contra trimestre anterior, grande
parte apostava numa alta de apenas 1%.
Mais crédito e renda
Para o IBGE, o resultado é "bastante positivo" pelo fato de a expansão não estar mais sendo puxada somente pelas vendas ao
mercado externo, que, ainda assim, subiram 17,8% no semestre.
"O crescimento do PIB vinha sendo gerado pelas exportações, agora ele começa a se espalhar. Fica
uma situação menos monopolizada", afirmou Roberto Olinto,
gerente das Contas Nacionais do
IBGE.
Aliado a esse "efeito multiplicador", ele ressalta dois outros fatores que contribuíram para o crescimento da economia: o aumento
do crédito e, mais recentemente, o
início da recuperação da renda
média do trabalhador -que registrou em julho a primeira alta
(2%) em relação ao mesmo mês
do ano anterior desde que a comparação começou a ser feita pelo
IBGE, em março de 2003.
Apesar disso, o rendimento real
médio continua abaixo do recebido dois anos atrás. Em julho de
2002, ele chegava a R$ 1.056,64,
contra R$ 901,20 em julho deste
ano.
"Depois de muito tempo, há
uma homogeneidade bastante
grande entre o crescimento dos
diversos setores, seja pelo lado da
produção, seja pelo lado do consumo [as duas formas de mensurar o Produto Interno Bruto], disse Olinto.
O consumo das famílias, que representa 57% do PIB, aumentou
3,1% no semestre -a mais alta taxa desde o segundo semestre de
2001. Tal expansão também deve
ser relativizada, em parte, por
causa da base de comparação deprimida. No segundo semestre de
2003, as famílias consumiram
4,5% menos.
Especialistas ouvidos pela Folha
dizem que os números apresentados pelo IBGE são positivos e até
mesmo "surpreendentes" por sua
magnitude. Ressaltam que, pela
primeira vez, mostram uma reação "consistente" do mercado interno e dos chamados investimentos na aquisição de máquina
e equipamentos e na construção
civil, que teve expansão de 6,8%
no semestre, a maior desde o segundo semestre de 2000.
"O resultado é bom. Mas o mais
importante é que existem indicadores, como a produção de veículos, que mostram que a economia
continua crescendo num ritmo
acelerado", disse Francisco Pessoa, economista da consultoria
LCA.
Para Alex Agostini, especialista
da Global Invest, os novos dados
do IBGE revelam que o "perfil e a
dinâmica do crescimento está
mudando, ganhando qualidade".
Isso porque não está mais só baseado nas exportações, mas também no aumento do mercado interno.
Na visão de Estêvão Kopschitz,
do Ipea (Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada), órgão do
Ministério do Planejamento, o
que desencadeou a recuperação
do consumo interno foi mesmo a
maior oferta de crédito com prazos mais longos. O crédito, disse
Kopschitz, beneficiou primeiro a
produção de bens duráveis -como veículos, móveis- e, por
"contágio", acabou alavancando
outros setores que fornecem para
esse ramo.
Para Juan Pedro Jensen, da Tendências, a partir de agora o "padrão" será a demanda interna
sustentar o crescimento do PIB,
com aumento tanto do consumo
das famílias quanto dos investimentos.
Por causa do resultado do segundo trimestre, o Ipea afirma
que irá rever para cima sua projeção de 3,5% para o crescimento
do PIB deste ano. A Global Invest
já aumentou sua previsão de 3,9%
para 4,2% de aumento. Pelos cálculos da LCA e da Global Invest, o
crescimento do PIB anualizado
(indicador muito usado nos Estados Unidos, que projeta o desempenho atual na taxa com ajuste sazonal para os próximos trimestres) seria de 6,1%.
Falta investimentos
Apesar do bom desempenho,
ainda persistem dúvidas com relação a uma ritmo sustentado de
crescimento, especialmente por
causa dos investimentos.
Embora tenha registrado um
crescimento elevado na comparação com o segundo trimestre de
2003 (11,7%), a Global Station
destaca que os investimentos na
taxa do trimestre contra trimestre
anterior caíram pela segunda vez
consecutiva, "o que confirma o
receio de interrupção" da trajetória de crescimento sustentável.
Kopschitz revela o mesmo temor. Diz que nem o setor público
nem o privado estão fazendo hoje
os investimentos de infra-estrutura necessários para manter o atual
nível de crescimento nos próximos anos.
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