São Paulo, domingo, 01 de outubro de 2006

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LUCIANO COUTINHO

Reforma fiscal e desenvolvimento

Os investimentos do setor privado no país são punidos pelos juros altos e por uma carga tributária excessiva

A FALTA de dinamismo da formação de capital fixo na economia brasileira (menos de 20% do PIB) nas duas últimas décadas e meia é, ao mesmo tempo, causa e reflexo do crescimento medíocre, sucessivamente ameaçado por crises inflacionárias, cambiais e fiscais. Sem a elevação firme e persistente da taxa de investimento (de 20% para 25% do PIB) não será possível realizar plenamente o potencial de crescimento da renda per capita, com estabilidade de preços, geração de empregos e redução das desigualdades.
Mais investimentos são imprescindíveis para expandir a oferta de bens e serviços (inclusive infra-estruturais) com velocidade e em escala suficiente para prevenir a formação de focos de pressão inflacionária à medida que, simultaneamente, cresça também a demanda.
Sem investimentos com ganhos de produtividade não há como combinar estabilidade e crescimento acelerado. Considerando a fragilidade fiscal do Estado, o aumento dos investimentos deve ser, principalmente, uma tarefa do setor privado. Não obstante, em setores de baixo retorno (especialmente nas infra-estruturas) e na oferta de bens tipicamente públicos, o investimento do Estado é imprescindível.
Infelizmente, porém, esse necessário aumento do investimento público é obstaculizado pela baixa capacidade fiscal e, por sua vez, os investimentos privados são punidos pelos juros altos e por uma carga tributária excessiva (que reduz a taxa de retorno e estimula a informalidade predatória).
Mais além dos onerosos encargos de juros da dívida mobiliária do Tesouro (que representaram, em média, cerca de 8% do PIB a cada ano, nos últimos dez anos), a rápida expansão das despesas correntes do conjunto do setor público (cujo peso em relação ao PIB cresceu de 20% no início dos 90 para cerca de 32% neste ano) tem sido o principal fator de debilitação da situação fiscal.
Além de comprimir a sua capacidade de investimento, a veloz expansão das despesas correntes obriga o governo a empreender sucessivos aumentos da carga tributária para evitar que a expansão do déficit público resulte numa trajetória explosiva da dívida mobiliária do Tesouro. Esse risco mina a confiança na solvência pública bloqueando uma redução significativa e não-inflacionária da taxa de juros, deixando o Tesouro e o Banco Central vulneráveis ante o mercado financeiro.
Por tudo isso, o controle firme a longo prazo e com qualidade crescente das despesas correntes é a única chave para: a) recuperar a capacidade de poupança e investimento do Tesouro; b) reduzir progressivamente a carga tributária em prol do estímulo ao investimento; c) assegurar credibilidade à dívida mobiliária, permitindo uma substancial redução da taxa real de juros, sem riscos desestabilizadores.
A instituição, por emenda constitucional, de um teto para a expansão dos gastos correntes do setor público em todas as esferas, com o objetivo de reverter a sua escalada enquanto porcentagem do PIB, constitui, assim, esteio indispensável à retomada do desenvolvimento com base em um programa fiscal de longo prazo.


LUCIANO COUTINHO, 59, é consultor e professor convidado do IE/Unicamp.

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