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OPINIÃO ECONÔMICA
CPMF e o custeio da Previdência Social
MARCOS CINTRA
Em 20 de março último, o Ministério da Previdência Social
promoveu um seminário no qual
se discutiu o leque de alternativas
de financiamento do regime geral
da Previdência Social. Dada a excessiva tributação sobre os rendimentos do trabalho, discutiu-se a
necessidade de eliminar a contribuição ao INSS. Na oportunidade,
defendi um novo modelo de financiamento do regime geral da Previdência Social baseado na adoção de uma contribuição sobre
movimentação financeira capaz
de reduzir, ou até eliminar, a contribuição incidente sobre a folha
de salários das empresas.
Em geral, os modelos previdenciários tiveram início como sistemas de capitalização, e, nesse caso,
o mecanismo de financiamento
apropriado é a incidência sobre a
folha de salários, paga pelos beneficiários assalariados, e pelos empregadores. Contudo, por razões
que não cabe discutir no momento, a sociedade brasileira optou
por garantir os benefícios da Previdência, até o teto legal, como direito de todos os cidadãos, justificando-se, assim, a evolução do
custeio para o sistema de repartição. Assim, o financiamento da
Previdência comporta ser feito
não apenas com contribuições dos
beneficiários mas também com
impostos gerais, incidentes sobre
toda a sociedade. A Constituição
de 1988 incorporou essa conceituação ao definir, conforme o caput
do artigo 195, que o custeio do sistema previdenciário compete a
"toda a sociedade, de forma direta
e indireta".
A proposta de desonerar a folha
de pagamento das empresas mediante a eliminação das contribuições patronais ao INSS foi levantada na Comissão Especial da Reforma Tributária, na Câmara dos
Deputados, na legislatura passada. Propôs-se a introdução de
uma contribuição social incidente
sobre as transações financeiras,
capaz de gerar volume de recursos
equivalente ao arrecadado pelo
INSS sobre a folha de pagamento
das empresas (R$ 35 bilhões).
Uma mera substituição de fontes,
é bom observar, que em nada alteraria a destinação dos recursos recebidos e não alteraria as receitas
e as despesas referentes ao salário-educação e ao denominado Sistema S. A vantagem seria reduzir a
cunha tributária sobre os salários,
estimular a formalização dos contratos trabalhistas, incentivar a
abertura de novos postos de trabalho, reduzir custos tributários,
combater a sonegação e reduzir o
"custo Brasil".
Recente estudo da EESP/FGV
(Escola de Economia de São Paulo), patrocinado pela Fesesp (Federação de Serviços do Estado de
São Paulo), "Efeitos Macroeconômicos da Substituição da Contribuição Patronal ao INSS por uma
CMF" (disponível em www.marcoscintra.org/padrao.asp?id=258), analisa em termos
agregados e setoriais o impacto na
produção, no nível de emprego,
nos preços e na carga tributária
da substituição da contribuição
das empresas ao INSS por um tributo sobre a movimentação financeira.
O trabalho, que utiliza dados do
Sistema de Contas Nacionais do
IBGE, estima o efeito de alíquotas
adicionais à atual sistemática da
CPMF. Para substituir o recolhimento efetuado pelas empresas ao
INSS, o estudo estima uma alíquota adicional necessária de
0,802%.
Nesse cenário, os agregados macroeconômicos apontam o seguinte: o PIB (Produto Interno Bruto)
cresceria 1,089%, o nível de emprego se elevaria em 1,423% e a
demanda global teria incremento
de 0,591%. Já os indicadores de inflação apontam uma queda considerável. O IGP (Índice Geral de
Preços) cairia 0,977%, o IPA (Índice de Preços no Atacado),
1,153%, e o IPC (Índice de Preços
ao Consumidor), 0,803%.
No tocante ao impacto setorial,
a substituição da contribuição ao
INSS incidente sobre folha pelo
adicional de 0,802% na CPMF teria impacto positivo sobre o valor
agregado setorial superior a 1%,
com destaque para os setores de
serviços privados não-mercantis
(+2,18%) e de fabricação de calçados (+1,92%).
Quanto aos custos de produção,
a queda chegaria a mais de 2%
em setores como o de extração de
petróleo e gás, comunicações, instituições financeiras, administração pública, publicidade, locação
de imóveis, entre outros.
A expansão da oferta de emprego seria mais favoravelmente afetada em setores como o de serviços
privados não-mercantis
(+10,87%), o calçadista (+3,47%),
farmacêutica e perfumaria
(+2,07%) e artigos de vestuário
(+1,96%).
O estudo da FGV mostra ainda
que quase todos os setores teriam
redução na carga tributária. Os
destaques ficam para os seguintes
segmentos: serviços privados não-mercantis (-52%), serviços prestados às empresas (-26%), artigos de
vestuário (-26%), artigos de plásticos (-25%), madeira e mobiliário
(-25%), calçadista (-21%), comércio (-21%), transportes (-21%) e
comunicações (-21%).
Cumpre lembrar que nos primeiros trabalhos sobre o Imposto
Único tentou-se avaliar o impacto
dessa nova contribuição social na
formação dos preços na economia. Foram utilizadas as matrizes
de relações interindustriais do IBGE e suas atualizações, tendo-se
chegado à conclusão de que os impostos sobre movimentação financeira (IMF) impactam com menor
intensidade os preços na economia do que impostos sobre valor
agregado (IVA), já que os primeiros exigem alíquotas nominais
sensivelmente mais baixas para
uma dada meta de arrecadação.
A simulação nesta página compara o impacto nos preços setoriais de um IMF sendo usado como fonte de financiamento do
INSS, relativamente ao atual modelo tributário, mediante a substituição da alíquota básica de 20%
da contribuição patronal sobre a
folha de salários por um IMF com
alíquota total de 0,585%.
Vê-se que o desvio nos preços relativos causado pelo IMF foi de
0,61%, ao passo que, no caso do
modelo convencional, atingiu
1,8%. Comprova-se assim a inveracidade da afirmação de que necessariamente os tributos cumulativos geram maiores distorções
nos preços relativos e que, por isso,
seriam mais ineficientes do ponto
de vista alocativo.
Outra constatação importante é
a redução significativa da carga
tributária setorial resultante da
alteração nas fontes de financiamento do INSS. Enquanto no caso
convencional o peso das contribuições sociais no preço setorial
variava de 11,28% a 16,01%, no
caso do IMF a variação caiu significativamente para 1,08% a
2,48%. Percebe-se que houve redução de cerca de 80% da carga
tributária setorial vinculada ao
custeio do INSS.
Confirma-se assim a possibilidade de que a alteração proposta
abrirá espaço para a redução de
preços e, consequentemente, para
a ampliação dos salários reais e
das margens de contribuição das
empresas. Ademais, tornam-se
possíveis aumentos nominais de
salários, sem impactos negativos
no grau de eficiência da economia.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 58, doutor pela Universidade
Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, é secretário das Finanças
de São Bernardo do Campo e autor de "A
verdade sobre o Imposto Único" (LCTE,
2003). Escreve às segundas-feiras, a cada
15 dias, nesta coluna.
Internet: www.marcoscintra.org
E-mail - mcintra@marcoscintra.org
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