São Paulo, segunda-feira, 01 de dezembro de 2008

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Fora das estatísticas, "pastinhas" perdem emprego com retração nos empréstimos

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os últimos 12 meses foram um período de prosperidade na vida de Wesclei Pinheiro Tavares. Além de conseguir pagar as dívidas dos móveis adquiridos para a casa onde mora com a mulher, nunca mais atrasou o aluguel de R$ 500, conseguiu comprar um videogame e um microondas e ainda instalou TV a cabo. Tudo com os R$ 1.200 mensais que conseguia, em média, trabalhando como "promotor de vendas" em Brasília. Esse é nome dado àquelas pessoas recrutadas pelos bancos e financeiras para abordar prováveis clientes na rua e oferecer "crédito fácil e barato".
A sorte desse goiano de 29 anos, que começou a trabalhar aos 12 cortando cana no interior de Goiás e teve raros empregos com carteira assinada, virou na última semana. Ele foi demitido na financeira em que trabalhava. Com isso, entrou na estatística precária de desligamentos nesse segmento do setor bancário, o primeiro a cortar em razão da crise atual.
Os funcionários e os colaboradores terceirizados contratados na esteira do boom do crédito estão no centro desse processo. Empresas, sindicatos e entidades de classe têm dificuldade para quantificar trabalhadores como Wesclei, já que eles não são bancários nem comerciários e iniciaram uma atividade relativamente nova. Até quem sobreviveu aos cortes ainda não consegue respirar aliviado. "Minha loja não tem como ficar com menos gente. Éramos quatro promotores e só ficaram dois", diz Marcos Antônio da Silva, 22, que há três anos é "pastinha".
Segundo Renato Oliva, presidente da ABBC (associação dos bancos pequenos), os correspondentes -nome técnico dos "pastinhas"- são uma alternativa acertada para popularizar o crédito em um país com as dimensões do Brasil. "As reduções que estão ocorrendo são localizadas e servem para o setor se ajustar à nova demanda. Neste momento, é natural que haja retração no crédito."
Segundo a ABBC, os correspondentes bancários (que incluem lotéricas, padarias e supermercados) somam 100 mil no país -em 2003, eram 83,4 mil. Estima-se que eles tenham sido responsáveis por cerca de 9 milhões de operações de crédito neste ano. Em 2003, eles responderam por 1,210 milhão.
"O que está encolhendo mais neste momento é a atividade do promotor independente."
De acordo com Oliva, já está em discussão a criação de um sindicato específico para as empresas que contratam os promotores, assim como um para representar os trabalhadores. A ABBC estuda um modelo de certificação das empresas para garantir treinamento dos profissionais.
Enquanto isso, Wesclei, que já começou a procurar emprego, enfrenta o dilema de como contar à mulher que foi demitido. "Não é fácil chegar ao final do ano, na véspera do Natal, e dizer que fui demitido", afirma. "Chego em casa todos os dias e conto a história da demissão de um amigo. Com isso, ela já sabe que estou na área de risco." (SD)


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