São Paulo, terça-feira, 01 de dezembro de 2009

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EUA e Brasil trocam farpas sobre atraso no comércio

Países se acusam sobre responsabilidade pela paralisação da Rodada Doha

Desentendimento acentua clima de divergência entre EUA e Brasil, após embates sobre as eleições em Honduras e relação com Irã

LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

Brasil e EUA subiram o tom das acusações sobre responsabilidades por paralisar as negociações comerciais globais e travaram no plenário da reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio em Genebra novo round do embate que cada vez mais os contrapõem na arena internacional.
Nos discursos na sessão de abertura do evento, ontem, o secretário americano para Comércio Exterior, Ron Kirk, atacou. O chanceler brasileiro, Celso Amorim, rebateu. Tudo menos de 24 horas após, em uma visita informal do primeiro ao segundo, terem falado de futebol e trocado promessas de fechar um acordo de cooperação econômica em 2010.
"Segundo o FMI, 58% do crescimento econômico global de agora a 2014 será promovido pela China, pela Índia, pelo Brasil, pela Argentina, pela África do Sul e pelos países da Asean [associação dos países do Sudeste Asiático]", jogou a bola Kirk, após dizer que seu país estava "comprometido" em concluir a Rodada Doha de liberalização do comércio global em 2010.
"A criação de fluxos comerciais e a abertura significativa dos mercados é necessária para preencher a promessa de desenvolvimento de Doha. Sucesso não é uma coisa que os líderes dos grupos de negociação ou nosso querido diretor-geral [Pascal Lamy] possam nos entregar", afinou a pontaria.
Minutos depois, Amorim chutaria de volta: "Não é racional esperar que concluir Doha envolva mais concessões unilaterais dos países em desenvolvimento. Estamos no meio de uma crise, de uma crise de paralisia". A frase foi acrescentada à mão pelo chanceler em seu discurso preparado, no qual criticou os subsídios, só para responder ao colega.
A fala de Kirk, por sua vez, também soa como revide ao comunicado do chamado G20 agrícola na véspera. Capitaneado pelo Brasil, o texto dos países em desenvolvimento pede um debate no início de 2010 para verificar os obstáculos a Doha. O nome dos EUA nunca é citado em plenário, mas é o principal a ecoar nos corredores quando se fala em atrasos no processo.

Campos opostos
Na mesa de negociações, o embate não é novo -surgiu com a divisão entre emergentes e países desenvolvidos, os primeiros querendo o fim dos subsídios, e os segundos, pedindo maior acesso aos mercados.
Mas cada vez mais os dois países assumem o protagonismo dos respectivos lados, ao mesmo passo em que na política externa o governos Luiz Inácio Lula da Silva e Barack Obama se põem com mais frequência em quadras opostas.
Afora os comentários de dissabor que pontuam o discurso brasileiro, cortadas já foram trocadas em pelo menos três temas-chave no último mês:
Sobre a crise em Honduras (o Brasil critica os EUA por reconhecerem as eleições promovidas no domingo passado pelo governo golpista); na relação com o Irã (a visita do presidente Mahmoud Ahmadinejad a Brasília dias antes de seu governo anunciar a construção de novas usinas em um programa nuclear que Washington acusa de ser bélico); e mesmo na frente climática, na qual o brasileiro pede ao americano que assuma mais responsabilidade no corte dos gases estufa.
Em duas semanas, Lula e Obama estarão em Copenhague para a conferência do clima. É a ocasião para observar eventuais impactos à dinâmica pessoal entre os dois líderes.


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