São Paulo, sexta-feira, 02 de janeiro de 2009

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Crise deve afetar mais os britânicos em 2009

Previsão é que PIB do Reino Unido caia 2,1%, décimo pior desempenho entre 187 países, segundo a Economist Intelligence Unit

Em abril do ano passado, a previsão do governo era crescer 2,5% em 2009; hoje, esperam-se recessão e 3 milhões de desempregados

PEDRO DIAS LEITE
DE LONDRES

A tempestade financeira global que castiga países ao redor do planeta deve provocar raios, trovoadas e temporais ainda mais intensos no Reino Unido do que em qualquer outra grande economia.
Com retração esperada de 2,1%, o PIB britânico deve ter o décimo pior desempenho entre 187 países que têm dados suficientes para uma análise, diz a influente consultoria britânica Economist Intelligence Unit em relatório a que a Folha teve acesso. Pior que o Reino Unido só países como Islândia, cuja economia derreteu, e o Zimbábue, onde a inflação é contada aos zilhões.
Como essa crise já deixou claro, tão impressionante quanto a sua dimensão é a sua velocidade. Em abril de 2008, a previsão do governo britânico para o crescimento em 2009 era de 2,5%. Hoje, ninguém pensa em outra coisa que não seja recessão.
Os resultados do PIB no terceiro trimestre mostraram retração maior do que a esperada, de 0,5%, pondo um duro fim à expansão de 63 trimestres -mais de 15 anos- consecutivos até então. Quando os números do último trimestre de 2008 forem revelados, a entrada na recessão deve ser confirmada oficialmente, com uma nova queda.
"Os indicadores aqui são ruins, mas não tão piores que os de outros países. O que é certo é que os números dos primeiros meses deste ano vão causar ainda mais espanto nas pessoas", afirmou à Folha Vanessa Rossi, diretora da Oxford Economics, consultoria ligada à universidade e analista do Centro de Estudos Chatham House.
Os efeitos dessa contração econômica vão bater fundo na vida real. Previsões de 3 milhões de desempregados, antes vistas como extremamente pessimistas, agora são as realistas e já são assumidas em público até por autoridades, como David Blanchflower, especialista em mercado de trabalho do Banco da Inglaterra (o banco central britânico).
O número tem um significado extra para os britânicos porque a última vez em que isso ocorreu -no início dos anos 1990- uma recessão severa atingiu o país. O patamar atual é de quase 2 milhões de desempregados, mas novembro registrou o maior aumento de um mês para o outro em 18 anos.
Outro número sombrio que deve chegar aos patamares de 1991 é o de casas retomadas pelos bancos por falta de pagamento no financiamento. O Conselho de Financiadores Imobiliários, principal entidade do setor, prevê que 75 mil propriedades serão retomadas neste ano, contra 45 mil em 2008, que já havia sido o pior em 12 anos. Os atrasos de mais de três meses devem chegar a 500 mil, de um total de 12 milhões de financiamentos.

A libra afunda
Um dos principais sinais da falta de confiança na economia britânica é o constante enfraquecimento da libra, que perdeu cerca de 30% em relação ao euro em 2008 e está no menor patamar desde que a moeda única foi criada, em 1999.
O primeiro pacote do governo, lançado no começo de outubro, era estimado em 500 bilhões de libras, valor que na época correspondia a US$ 867 bilhões. Se tivesse sido lançado no final de dezembro, o pacote seria de "apenas" US$ 768 bilhões -US$ 99 bilhões "perdidos" no câmbio.
Para 2009, muitos analistas já preveem até uma paridade entre as duas moedas, algo antes impensável.
As principais razões para a queda da libra são a piora contínua das contas do governo -que entra cada vez mais no vermelho na tentativa de salvar a economia- e a expectativa de juros ainda menores daqui para a frente.
Para a próxima reunião do Banco da Inglaterra, neste mês, todos os especialistas esperam nova redução na taxa de juros, atualmente em 2%. Se confirmada a queda, os juros terão o menor patamar desde que a instituição foi criada, em 1694.

O "salvador do mundo"
Em qualquer país onde a economia estivesse numa situação tão delicada, a rejeição ao atual governante deveria estar selada. Mas no Reino Unido ocorreu justamente o oposto, e, desde que as Bolsas começaram a cair, a aprovação ao primeiro-ministro, Gordon Brown, não parou de subir.
O governo reestatizou parcialmente o sistema bancário e gastou quase meio trilhão de libras para tentar retomar a normalidade. Num segundo momento, lançou um novo pacote, de 20 bilhões de libras, na tentativa de estimular a economia, principalmente por meio da redução de impostos.
"A recessão poderia ser pior ainda se não fossem essas medidas. Eles estabilizaram o sistema bancário, mas há dúvidas sobre o efeito do pacote fiscal", afirma Rossi, da Oxford.
O primeiro-ministro, no entanto, não tem dúvidas. Em um debate no Parlamento em meados de dezembro, Brown chegou a dizer: "Eu já salvei o mundo". Muita gente discorda.


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