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São Paulo, domingo, 02 de fevereiro de 2003

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Retomada pode não ser tão forte quanto governo previu se ataque dos EUA ao Iraque se prolongar

Guerra deve atrasar crescimento do país

LEONARDO SOUZA
SÍLVIA MUGNATTO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A equipe econômica avalia que um eventual prolongamento da guerra no Iraque comprometerá a retomada do crescimento econômico do país, o que implicará expansão do PIB (Produto Interno Bruto) menor do que os 2,8% esperados pelo governo para o ano.
"Se [a guerra] for por janeiro, fevereiro, poderemos manter as projeções. Se for por um semestre, teremos de rodar de novo o modelo [refazer as contas"", disse à Folha o chefe da Assessoria Econômica do Ministério do Planejamento, José Carlos Miranda.
"É uma lástima. Mais uma vez choques externos interrompem possibilidades de um ciclo mais virtuoso da economia", completou. Miranda usa o mesmo argumento dado pelo ex-ministro da Fazenda Pedro Malan ao explicar o baixo crescimento brasileiro durante os anos FHC (1995-2001). Segundo Malan repetiu diversas vezes, as crises de 95 (México), 97 (Ásia), 98 (Rússia), 2001 (Argentina e atentado aos EUA) e 2002 (recessão nos EUA e escândalos corporativos) secaram as fontes de financiamento ao país, tornaram o dólar mais escasso e inibiram a elevação da produção.
Segundo Miranda, ao fazer as atuais projeções macroeconômicas (PIB, inflação, taxa Selic, desemprego etc.), o governo pressupôs que, como reflexo das medidas econômicas que seriam anunciadas, o dólar cairia de forma mais intensa agora no começo do ano -o que de fato ocorreu nas primeiras semanas de janeiro.
Isso permitiria, de acordo com Miranda, iniciar, em três ou quatro meses, cortes na taxa básica de juros, hoje em 25,5% ao ano. Com uma cotação mais baixa da moeda americana, haveria menor pressão inflacionária, o que daria mais espaço ao Banco Central para afrouxar a política monetária.
Segundo o economista, os efeitos da guerra barraram essa trajetória. O dólar, depois de ter sido cotado abaixo de R$ 3,30, superou no começo da semana passada a casa dos R$ 3,60. Na sexta, encerrou em R$ 3,515.
Para enfrentar esse cenário e manter a confiança dos investidores, o governo deverá aumentar a meta de superávit primário (economia de receitas para pagamento de juros) nos próximos dias. "Ou aumenta o superávit ou aumentam os juros para manter alguns canais de financiamento abertos", disse Miranda.
Ele diz que a economia começa a enfrentar dois choques de oferta, que poderão ser debelados com mais ou menos facilidade dependendo da duração do conflito.
O primeiro choque é uma redução da disponibilidade de crédito no mercado externo para o Brasil. "Podemos esperar uma contração enorme da liquidez internacional. Isso não tem nada a ver com o risco Brasil, mas com o risco global", disse.
Além da guerra, Miranda citou a desconfiança provocada pela fragilidade apresentada por algumas corporações americanas. "Alguns bancos tiveram grandes prejuízos e as empresas estão tendo que fazer provisões contra devedores duvidosos."
Depois de bancos e empresas brasileiras captarem cerca de US$ 2 bilhões no mercado internacional em janeiro, os investidores estrangeiros voltaram a se retrair, limitando empréstimos para mercados emergentes.
Isso significa menor ingresso de dólares na economia, o que pode provocar elevação da cotação da moeda americana em relação ao real. Devido ao aumento de custos de produtos e insumos importados, os preços no país começam a aumentar, o que pode gerar mais inflação.
O outro choque ocorre nos combustíveis. A guerra provoca elevação do preço do petróleo no mercado internacional. Como os combustíveis no Brasil seguem a cotação do óleo no mercado externo, esses itens -de grande peso na inflação- também aumentam internamente.
A inflação mais alta impede que o BC reduza mais os juros, ou corte a taxa básica mais rapidamente. O crédito mais caro reduz o consumo, que gera menor crescimento econômico. Miranda acredita, no entanto, que a guerra termine em pouco tempo.
Segundo o economista, o Ministério do Planejamento ainda trabalha com projeções realizadas pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) em dezembro passado.
Pelas contas do Ipea, o país cresceria 2,7% neste ano, a uma taxa de juros média nominal de 21%, inflação pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de 9,84% e câmbio médio de R$ 3,35.
Confrontado com esses números, o cenário básico do BC, apresentado pelo presidente da instituição, Henrique Meirelles, e pelo ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) é otimista.
O BC perseguirá meta de inflação de 8,5% neste ano, crescimento esperado do PIB de 2,8%. Se as contas do Ipea estiverem corretas, o BC terá de, ao mesmo tempo, reduzir a taxa de juros de forma significativa até o final do ano e contar com cotação do dólar bem mais baixa do que a de hoje.



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