São Paulo, quarta-feira, 02 de março de 2005

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ARTIGO

Ainda desacelerando

ROGÉRIO MORI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Publiquei no início de dezembro do ano passado um artigo na Folha intitulado "Desacelerando na Margem", comentando os resultados do PIB do terceiro trimestre de 2004. Naquele artigo, havia apontado que, a despeito dos bons resultados do PIB naquele trimestre, o crescimento brasileiro já estava em desaceleração e as elevações da taxa de juros e a apreciação do real ante o dólar aprofundariam esse movimento, apesar do bom resultado que ficaria registrado em 2004.
Os dados do IBGE relativos ao PIB do quarto trimestre do ano passado sancionam essa visão e sugerem um grau maior de preocupação quanto ao futuro. De fato, o resultado de 2004 ficou bem acima do verificado em anos anteriores: o crescimento de 5,2% contrapõe-se aos fracos desempenhos de 2002 e 2003. Setores ligados à exportação e/ou mais sensíveis ao ciclo de crédito tiveram um desempenho bom no ano passado. É o caso da agropecuária, cujo produto registrou expansão de 5,3%, e da indústria, com expansão de 6,2%. O setor de serviços, cujo desempenho está mais atrelado à evolução da renda real, registrou uma performance mais modesta, com variação de 3,7%.
Apesar desse crescimento no ano passado, o resultado do último trimestre reforça o fato de que a economia brasileira seguiu desacelerando no final de 2004. A variação sazonalmente ajustada do PIB no quarto trimestre em relação ao anterior foi de 0,4%, equivalente a 1,7% em termos anualizados. Para ter uma idéia da velocidade de desaceleração do crescimento do produto ao longo do ano passado, essa mesma comparação realizada com o resultado do primeiro trimestre de 2004 relativamente ao último trimestre do ano anterior mostra uma variação de 1,8%, equivalente a 7,3% em termos anualizados.
Vale ressaltar que o resultado do PIB do último trimestre ainda não incorpora plenamente os efeitos das elevações dos juros. De fato, leva alguns trimestres para que os efeitos das altas das taxas sejam percebidos em sua plenitude do lado da demanda.
Adicionalmente, o real apreciou-se fortemente nos últimos meses, o que desestimula as exportações brasileiras no médio prazo e, em certo sentido, elimina um dos principais vetores do crescimento no ano passado. Em outras palavras, a conjugação das elevações da taxa de juros e da apreciação cambial deverá ter efeitos adicionais sobre a desaceleração no começo de 2005. Nesse sentido, não se deve descartar inteiramente a possibilidade de uma variação nula ou negativa do PIB no primeiro trimestre deste ano na comparação sazonalmente ajustada.
Outro aspecto que chama a atenção no resultado do PIB do quarto trimestre de 2004 diz respeito à componente de investimentos produtivos. Após alguns trimestres de crescimento, a formação bruta de capital fixo registrou uma queda dessazonalizada de 3,9%, o que sugere, à primeira vista, uma contração preocupante dessa variável. A retomada dos investimentos produtivos havia sido comemorada com grande ênfase pelas autoridades brasileiras e sua expansão está intimamente associada ao crescimento da oferta agregada e à melhoria da produtividade da economia brasileira. Esse comportamento deve ser encarado com alguma preocupação caso venha a se repetir nos próximos resultados do PIB, pois, em certo sentido, limita naturalmente o próprio crescimento econômico de longo prazo.


Rogério Mori é professor e Coordenador do Cemap (Centro de Macroeconomia Aplicada) da FGV/EESP.


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