São Paulo, sexta-feira, 02 de abril de 2004

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COMÉRCIO MUNDIAL

Principal impasse está na questão dos subsídios agrícolas

Mercosul já descarta Alca na data original de 2005

Tony Gentile - 11.mar.04/Reuters
Rafael Bielsa, chanceler argentino, para quem há maior chance de acordo com a União Européia


CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA, EM MADRI

"É claro que não haverá Alca no antigo prazo de 2005."
A frase é do chanceler argentino, Rafael Bielsa, em encontro com representantes da sociedade civil que se opõem à Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
Pela primeira vez, uma alta autoridade de um dos 34 países que negociam a Alca diz em voz alta o que muita gente já vinha afirmando nos bastidores: são tamanhos os desencontros entre, principalmente, o Mercosul e os EUA que tendem a zero as chances de concluir a área de livre comércio no prazo originalmente acertado.
O encontro de Bielsa com os membros da sociedade civil se deu em Buenos Aires, no intervalo das negociações em que um grupo de 12 países, os mais representativos das Américas, tentava superar os impasses.
Não funcionou. Martín Redrado, vice-chanceler e principal negociador argentino, anunciou que, como as negociações "estão travadas", fica adiada a reunião do CNC (Comitê de Negociações Comerciais) marcada para a partir do dia 23, na cidade mexicana de Puebla.
O adiamento serve para reforçar com fatos objetivos a previsão de Bielsa. Em fevereiro, o CNC, principal grupo técnico da Alca, se reuniu, sempre em Puebla, para tentar definir como as negociações se dariam daí em diante.
A reunião foi um fracasso, mas, para evitar o rótulo, os delegados preferiram falar em "suspensão" por algumas semanas. O documento final dizia que "a tarefa revelou-se muito complexa" e, por isso, "as delegações precisam de mais tempo" para "realizar consultas em nossas capitais e entre as delegações".
Marcou-se o mês de março para o reinício das negociações. Não deu, de novo. Ficou para abril. Agora, já não será nem neste mês.
Com isso, o cenário é este: o principal grupo técnico (CNC) não consegue definir as instruções a dar aos grupos negociadores, que, obviamente, não podem sequer começar a negociar. Se não há negociação, não há como levar o produto delas à instância máxima, a reunião ministerial.
Como faltam nove meses apenas para vencer o prazo originalmente definido, e como os EUA têm uma campanha eleitoral em que o ambiente se torna pouco ou nada propício para liberalização comercial, fica claro que o palpite de Bielsa é corretíssimo.
O impasse básico está na questão agrícola, como em todas as negociações comerciais em andamento. Os EUA só pretendem fazer concessões na área agrícola no âmbito global, o da Organização Mundial do Comércio, para não favorecer os europeus, também protecionistas na questão.

Acordo com europeus
Para o Mercosul, a liberalização agrícola é um ponto básico, porque é no agronegócio que está a maior e mais imediata possibilidade de Brasil e Argentina, os principais sócios do bloco do Sul, aumentarem suas exportações.
Bloqueada a Alca, e com as negociações na OMC caminhando muito lentamente, para o Mercosul resta um acordo com a União Européia, sobre o qual há otimismo nas chancelarias.
No encontro com representantes da sociedade civil, Bielsa perguntou, e ele mesmo respondeu:
"Por que o acordo com a União Européia caminha? Porque recebemos sinais de que [os europeus] estão dispostos a ceder. [O acordo] Mantém os subsídios, mas [os europeus] nos oferecem vantagens, como abrir o mercado para determinados produtos."
Se é assim mesmo ou só expressão de desejos, é o que se verá a partir de 15 deste mês em Bruxelas (Bélgica), quando se dará a nova -e eventualmente decisiva- rodada de negociações entre o Mercosul e os europeus.


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