São Paulo, domingo, 02 de maio de 2004

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COMÉRCIO EXTERIOR

Reunião em Londres com ministros de países termina sem avanços na discussão da liberalização comercial

Acordo da Rodada Doha fica mais distante

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA, EM LONDRES

Ficou ainda mais improvável concluir a Rodada Doha, o mais recente movimento de liberalização comercial, no prazo combinado de janeiro de 2005.
Depois de um jantar na sexta-feira e de cinco horas de conversas na manhã de ontem, tudo o que ministros de cinco países, entre eles o Brasil, conseguiram produzir foi "um esforço honesto e franco para entender as questões e os limites de cada parte", na descrição de Celso Amorim, o chanceler brasileiro.
Com ele estiveram o norte-americano Robert Zoellick, autor do convite, o comissário europeu para o Comércio, Pascal Lamy, o queniano Mukhisa Kituyi e o sul-africano Alec Erwin.
Na verdade, eram muito mais que cinco os participantes, na medida em que Lamy fala pelos agora 25 países da União Européia; Brasil e África do Sul são parte do G20, grupo de países em desenvolvimento que luta pela abertura agrícola do mundo rico; e o Quênia lidera o G90, heterogêneo grupo de países, em geral pobres.
Em tese, esse grupo poderia começar a destravar negociações que, lançadas no fim de 2001, na capital do Qatar, ficaram bloqueadas desde então, por mais que se aproxime o limite fixado para concluir os entendimentos.
Ao relatar o resultado das conversas, Amorim bem que tentou demonstrar que houve algum avanço, mas não podia ocultar que os limites continuam estreitos.
Exemplo: "Avançamos no entendimento não só de fatos, mas também de posições. Mas há muito caminho a percorrer".
Ou então: "Todos querem chegar a um acordo, mas todos sabem que é difícil".
Tudo somado, o único progresso parece ser o de saber por onde não ir, mas não necessariamente por onde caminhar. Sempre na avaliação do chanceler brasileiro, as duas reuniões do fim de semana em Londres "foram um passo adiante para evitar procurar caminhos que não levam a lugar nenhum".

Nova reunião
A nova tentativa de desbloquear a rodada Doha ocorrerá em duas semanas, em Paris: à margem da reunião anual da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), haverá, no dia 14, nova reunião de ministros, mais ampla do que a de Londres.
Para o Brasil, a negociação na OMC é a mais importante das três em que o país está envolvido. Mas Celso Amorim não trata janeiro de 2005 como uma espécie de data cabalística.
"Janeiro de 2005 não é uma nota promissória, que, passou do dia de pagamento, leva a uma multa", compara o chanceler.
Mas 2005 continua sendo um bom parâmetro para concluir a chamada Rodada Doha, lançada em 2001.
"Não estou preocupado com janeiro, fevereiro ou março, mas com 2005, sim, de preferência no primeiro semestre", afirmou.
Por que a OMC é o terreno de preferência do Brasil? Amorim responde com o caso do algodão, ou seja, com a decisão da instituição internacional dando razão ao Brasil na sua queixa contra os subsídios norte-americanos.
"Seria impossível uma vitória dessas fora do sistema multilateral, seja nas negociações da Alca, seja nas negociações do Mercosul com a União Européia", explica o ministro.
Mas o chanceler diz que o caso do algodão só freqüentou marginalmente as discussões em Londres, ainda que dela participassem o vencedor (o Brasil) e o perdedor (os Estados Unidos).
O que surgiu foram temas que já circulam na negociação desde Doha. Exemplo: a necessidade de que seja fixada uma data para o fim dos subsídios à exportação de produtos agrícolas, uma das grandes reivindicações do Brasil e do G20.
Amorim acha que a União Européia, responsável pela maior parte desses subsídios, tem dado "sinais positivos a respeito" da questão, mas cobra "paralelismo" (e voltou a fazê-lo em Londres).
"Paralelismo" é o codinome para a eliminação também dos créditos à exportação usados pelos Estados Unidos e para a ajuda alimentar, áreas em que, como admite Amorim, "o subsídio não é tão óbvio".
Também foram discutidos na reunião os chamados "temas de Cingapura" (investimentos, compras governamentais, facilitação de negócios e políticas de concorrência), que a União Européia insistiu em introduzir na Ministerial da OMC em Cancún, em setembro do ano passado, ajudando a levá-la a um rotundo fiasco.
Para o chanceler brasileiro, tais temas, exceto a facilitação de negócios, ficarão de fora do pacote conjunto de Doha, embora devam continuar na agenda da OMC.
Mas o ministro deixa claro que é uma opinião pessoal, não uma conclusão dos encontros de Londres.
Sobre essas reuniões, sempre com a cautela da linguagem diplomática, Amorim deixa claro: "Já se sabia das dificuldades políticas, mas, agora, ficou claro que traduzi-las em termos técnicos dará mais trabalho do que se imaginava".


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