São Paulo, sexta-feira, 02 de maio de 2008

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Cruzando uma fronteira importante


Com o grau de investimento, não tenho dúvida de que os juros reais vão voltar a cair durante os próximos meses

AO RECEBER o grau de investimento da Standard & Poor's, o Brasil cruza uma fronteira importante. Não se trata de um movimento mágico que fará desaparecer nossos problemas na economia, mas ele certamente abre uma estrada mais fácil de ser trilhada. Essa é a primeira mensagem que gostaria de passar a meu leitor da Folha.
No mundo de hoje, o papel das chamadas agências de risco é muito importante como balizador para os investidores internacionais. Isso vale tanto para os movimentos de natureza financeira como para as decisões de investimento das empresas multinacionais. Durante os últimos anos, tivemos uma terceirização da avaliação de risco dos investimentos na direção dessas agências internacionais. Mesmo hoje, depois da crise profunda a que assistimos no sistema bancário do Primeiro Mundo, sua influência continua muito importante.
Um exemplo prático de seu papel na alocação de poupança em países emergentes é a restrição que importantes investidores institucionais têm para alocar seus recursos fora do universo dos títulos de crédito com grau de investimento. Mas as avaliações das agências também indicam a qualidade das políticas macroeconômicas dos países, influenciando o comportamento dos mercados financeiros.
Uma terceira força por trás do julgamento das agências deriva das conseqüências que uma piora na avaliação de um país pode trazer para sua economia. Em outras palavras, ele funciona como um estímulo positivo e, também, como uma forte restrição para movimentos de política econômica entendidos como incorretos.
O presidente Lula, com sua incrível capacidade de se comunicar com o cidadão comum, associou o grau de investimento com a divisão entre países sérios e não-sérios. Segundo ele, o Brasil deixou o segundo grupo e passou a fazer parte do primeiro. Acho isso um exagero, pois existem países sérios que ainda não receberam o grau de investimento. Para mim, a decisão da S&P tem outra dimensão. Ao estender ao Brasil o grau de investimento, a agência está dizendo que nossa política econômica segue o receituário da ortodoxia das economias de mercado. Em outras palavras, que o governo Lula segue os caminhos trilhados por seu antecessor na busca de um crescimento econômico centrado nas forças de mercado.
Mas não tenho dúvida de que o grau de investimento alcançado pelo Brasil é um fato importante e positivo para nosso futuro. Ele vai reforçar o interesse que os grandes investidores internacionais mostram pelo Brasil, trazendo novos investimentos de natureza financeira. Tenho escrito sobre a importância que a entrada desses capitais está tendo, por exemplo, na criação de um mercado de títulos de crédito de prazos mais longos.
Essa mudança tem sido fundamental para a criação do que os economistas chamam de estrutura a termo de juros. Pela primeira vez em nossa história, é possível precificar papéis com vencimentos de 5, 10 e até 15 anos de prazo. Esse fato tem permitido ao sistema bancário aumentar -sem riscos maiores- os prazos de seus financiamentos.
Outro benefício tem sido o aumento dos prazos dos títulos da dívida pública, tornando mais eficiente sua gestão. Esses movimentos serão fortalecidos a partir do grau de investimento do Brasil. Não tenho dúvida de que os juros reais vão voltar a cair durante os próximos meses.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br


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