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OPINIÃO ECONÔMICA
É preciso ajudar os dados com argumentos
ANTONIO BARROS DE CASTRO
Não cabem dúvidas, para
muitos, de que a política
macroeconômica atual explica
não apenas o decepcionante desempenho da economia como
também a perda de apoio por
parte do governo. As próprias deficiências no que se refere ao gerenciamento da máquina pública
seriam explicadas por um tipo de
política que não conta com o Estado, e sim, unicamente, com o
mercado.
No que toca ao decepcionante
desempenho da economia, três
ponderações parecem-me oportunas.
A retomada que estamos atravessando não tem se mostrado
decepcionante, e sim vigorosa.
Comprovam-no o crescimento de
5,8% da indústria no primeiro
trimestre deste ano, comparado
com o mesmo período de 2003, e a
expansão de 9,1% da massa salarial da indústria no mesmo tipo
de comparação. A expansão da
massa de salários e o início da recuperação do emprego sugerem,
aliás, que a retomada está deixando para trás a sua fase inicial
(em que crescem, basicamente, o
comércio e a produção de duráveis de consumo) e ingressando
numa segunda etapa.
A segunda ponderação consiste
em que, admitindo que esteja em
curso um processo de recuperação, claramente ainda não se ingressou na fase de crescimento
propriamente dito. Nela, tipicamente, o emprego (e não apenas o
número de horas trabalhadas)
começa a crescer, e o investimento
tende a assumir papel de destaque na expansão. Só então, acrescente-se, a massa de salários e os
investimentos passam efetivamente a interagir, alimentando-se um ao outro.
A terceira ponderação é apenas
um lembrete. Numa economia
complexa e diversificada como a
nossa, herdeira, ademais, de graves problemas histórico-estruturais, é (sempre) fácil apontar aspectos negativos. O importante é
saber se estão ocorrendo mudanças e se elas são para melhor. No
meu entender, duas mudanças
saltam aos olhos no momento,
uma positiva e a outra negativa.
A primeira consiste em que pela
primeira vez em 20 anos (desde
1984) a expansão é acompanhada
de dados cada vez mais favoráveis no tocante às trocas externas.
O saldo de comércio, inusitadamente positivo, surge, dessa feita,
acompanhado da expansão das
importações (e, portanto, de forte
elevação da corrente de comércio). Além disso e em flagrante
contraste com a vigorosa recuperação de 1984/85, a inflação se encontra basicamente sob controle.
Já o aspecto negativo que mais
chama a atenção nessa recuperação consiste, possivelmente, no fato de que ela não tem contaminado as expectativas. No início de
1991, por contraste, não obstante
o desmoronamento argentino e o
colapso da Bolsa de Nova York,
muita gente (empresários, destacadamente) apostava no prosseguimento da expansão em curso.
O patente divórcio que estamos
vivendo entre o desempenho das
atividades econômicas e o clima
geral da economia tem certamente vários ingredientes. As altíssimas expectativas geradas pelo
novo governo já foram invocadas
por mais de um observador, para
ajudar a entender o presente anticlímax. Concordo. Parece-me,
no entanto, adequado ter em conta dois outros argumentos, que ficam aqui apenas sugeridos.
Primeiramente, desde o golpe
militar (1964), difundiu-se neste
país a noção de que existem alternativas de política econômica, totalmente diferentes das praticadas pelas autoridades, muito
mais eficientes e, no entanto, não-radicais. Essa convicção manteve-se viva até durante o crescimento acelerado da década de 70!
Em momento nenhum ficaram
claras, no entanto, quais eram as
propostas substantivas -e como
elas seriam politicamente levadas
a efeito.
Atenção: a incessante invocação da China e da Índia a esse
propósito é altamente enganosa.
Ambos os países começaram a
crescer rápida e sustentadamente
-diferentemente do ocorrido na
América Latina- a partir de reformas liberalizantes. Mas era
um liberalismo evolucionista e,
sobretudo, adaptado às instituições locais.
Finalizo dizendo que falta a este
governo, clamorosamente, mostrar, com sólidos argumentos, que
a política macro que aí está tem
futuro, não sendo, portanto, mera
imposição da "herança maldita"!
Há que mostrar, por exemplo, como se pretende -preservada a
política macroeconômica- recuperar, nos próximos anos, o investimento público, já que a carga
tributária, consensualmente, não
pode ser ampliada. Alem disso,
como pretende o governo efetivamente estimular o investimento
privado e, em particular, com será levada à pratica a política industrial e tecnológica recentemente anunciada?
Também poderia ajudar a melhorar o clima uma assumida
reabertura da discussão acerca
das políticas sociais -que é, afinal, onde se supunha que este governo traria importantes contribuições. E não faria mal nenhum
a admissão de que o governo, como todos sabem, subestimou dificuldades. Afinal FHC disse, no
início do primeiro mandato, que
estava achando muito fácil governar o país!
Antonio Barros de Castro, 65, professor titular da UFRJ (Universidade Federal
do Rio de Janeiro) e ex-presidente do
BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), escreve às
quartas, a cada 15 dias, nesta coluna.
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