São Paulo, terça-feira, 02 de junho de 2009

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EUA querem formar G2 com a China

Secretário do Tesouro, Timothy Geithner, diz que grupo traria equilíbrio à economia

Discurso enfraquece teoria de que o G20 será o novo protagonista global e dá relevo somente à China dentro do grupo dos Brics

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O secretário norte-americano do Tesouro, Timothy Geithner, apresentou ontem o que é uma nítida proposta de G2, um grupo formado apenas por EUA e China, para devolver o equilíbrio à economia mundial.
A proposta de Geithner, em discurso na Universidade de Pequim, atropela claramente o G20, o clube das 20 maiores economias do mundo, o veículo pelo qual o governo do presidente Lula pretende ocupar espaço na linha de frente da gerência econômico-financeira do planeta.
Geithner olhou além das tarefas do G20, quais sejam, recuperar a economia mundial e redesenhar a arquitetura do sistema financeiro internacional.
O que Geithner sugere é atacar os desequilíbrios que já existiam antes da crise e que não estão no radar nem do G20 nem do G8, o grupo dos sete países mais ricos do mundo mais a Rússia.
Resumindo o que disse Geithner: a China precisa tornar sua moeda mais flexível e deve diversificar sua economia de forma a depender menos pesadamente das exportações para crescer.
Os EUA, em troca, poriam o foco em controlar o seu colossal déficit, o que serviria para proteger os maciços investimentos chineses em títulos do governo norte-americano. Esse déficit, como é óbvio, é potencial combustível para uma disparada inflacionária, que minaria o valor dos papéis norte-americanos que os chineses compraram e do próprio dólar.
Qual é o desequilíbrio na economia global que antecede a crise e foi pelo menos parte das suas causas? Explica Brad Setser, especialista do Council on Foreign Relations: "Os norte- -americanos poupam muito e tomam empréstimos excessivamente. Na outra ponta, muitos dos credores dos Estados Unidos consomem muito pouco e poupam demasiado", em alusão não apenas à China e a outros países asiáticos, mas também aos países exportadores de petróleo.
Grande número de especialistas considera esse desequilíbrio insustentável, no médio prazo. Corrigi-lo, ao menos a julgar pelo que disse Geithner, é um mano a mano China-EUA, o que torna no mínimo exagerado todo o alarido em torno da importância que o G20 -e, por extensão, o Brasil- teria na reordenação do sistema financeiro global.
Tanto é assim que o foco da mídia chinesa a respeito da visita do secretário do Tesouro foi precisamente em torno do papel mais substancial que Pequim deveria desempenhar na elaboração da política econômica planetária.
Mesmo os Brics (Brasil, Rússia, Índia e China, supostas grandes potências a partir de 2020, segundo a firma financeira Goldman Sachs) perdem relevância porque apenas a letra C, de China, está sendo convocada a esse papel de colíder na restauração do equilíbrio econômico no planeta.
A propósito, há uma reunião de cúpula dos Brics marcada para este mês na Rússia, mas está por ver se a pauta inclui os desequilíbrios de que Geithner falou em Pequim.
Convém notar também que G2, para EUA e China, é uma sigla que aparece recorrentemente em análises acadêmicas sobre o novo mundo que emergirá do fato de o unilateralismo norte-americano ter batido no muro sem que tenha surgido um coletivo capaz de liderar o multilateralismo, a menos que ele se transforme mesmo em bilateralismo China-EUA.


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