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OPINIÃO ECONÔMICA
Idéia estragada
LUIZ ANTONIO DE MEDEIROS
A criação de um fundo de ativos
para resolver o problema dos servidores inativos da União, onde
estão encastelados os privilegiados
de aposentadorias milionárias que
os trabalhadores do setor privado
sustentam, é mais um exemplo
vergonhoso de como uma idéia
criativa e generosa pode ser estragada. Um burocrata a serviço do
Estado, não da sociedade à qual o
Estado deve servir, roubou a idéia
e transformou-a numa pavorosa
injustiça.
O fundo de ativos seria formado
com dinheiro da privatização,
ações de estatais, imóveis e créditos a receber da União, num valor
não inferior a R$ 200 bilhões, e
deixaria o Estado livre de um gasto
anual de R$ 20 bilhões. Resolveria,
num passe de mágica, parte do
problema do déficit público.
É um engenho contábil, apenas,
porque não gera riqueza, não cria
emprego, não estimula o desenvolvimento. Só muda a forma de
pagar a conta.
A verdade que os burocratas escondem é esta: quem continuará
pagando a conta dos privilegiados? A sociedade, da qual se retirarão R$ 200 bilhões. Quem continuará sendo beneficiado? O setor
estatal e uma parcela ínfima da população, menos de 1 milhão de
funcionários, alguns dos quais superfuncionários com superaposentadorias.
De uma reforma previdenciária
verdadeira ninguém fala, mas só
ela acabaria com a injustiça dos
dois regimes -um, de privilégios,
para o setor público, e outro, de
fome, para o setor privado.
Com o fundo de ativos, cada servidor aposentado da União levará
mais de R$ 200 mil. Enquanto isso,
os aposentados do INSS continuarão com sua aposentadoria de um
salário mínimo, os depositantes
do FGTS continuarão tungados
em seus rendimentos, os milhares
de excluídos, sem-terra, sem-teto
e sem-emprego continuarão ao
deus-dará. É como se uma empresa decidisse dar um bom aumento
-mas só para a diretoria.
Em 1993, quando tentamos fazer
a revisão constitucional, a Força
Sindical e o Instituto Atlântico
apoiaram a idéia generosa, proposta pelo economista Paulo Rabello de Castro, de pagar toda a dívida social mediante um "encontro geral de contas", da seguinte
forma: municípios, Estados e
União estão endividados. Como
todo mundo deve para todo mundo (dívidas cruzadas), cada um
pagaria sua dívida com ações de
suas estatais municipais, estaduais
e federais.
É mais ou menos como se eu devesse para você, você devesse para
mim, e a gente nunca acertasse as
contas. Não é melhor a gente se entender a respeito?
Feito o acerto geral de contas, todos passariam a governar sem dívidas e sem juros. Existe melhor
receita para acabar com o déficit
público? Existe algo mais justo?
Por exemplo: o governo federal,
com esse lastro (as ações que receberia de seus devedores, principalmente Estados), poderia pagar a
dívida social depositando nos fundos públicos -como o FGTS-
um certificado, que poderíamos
chamar de Obrigações Sociais do
Tesouro Nacional (OSTN).
Com isso, os correntistas do
FGTS poderiam sacar as OSTNs e
entregá-las para o administrador
de sua preferência. No decorrer do
programa de privatização, o governo coloca à venda as empresas
que recebeu dos Estados. Os fundos nos quais as OSTNs estivessem
depositadas comprariam essas
ações com as OSTNs. O cidadão
torna-se acionista das empresas,
por intermédio dos fundos, o governo recolhe as OSTNs e o círculo
se fecha.
Qual o resultado disso? No
exemplo dado, os governadores
pagam suas dívidas, os trabalhadores recebem seus benefícios, e a
propriedade das estatais é democratizada. Os fundos, fortalecidos,
poderão agora emprestar dinheiro
-com segurança- para os governadores e para quem mais quiserem, com prazos longos, pois esse dinheiro só poderá ser sacado
na aposentadoria. E que aposentadoria! Pois, nesse caso, o dinheiro
passa a render mais do que rende
hoje, nessa Previdência Social falida.
Essa é a idéia. Compare as duas.
A nossa é a do justo e possível, fácil
de fazer, "encontro geral de contas", que defendemos há anos. A
do burocrata governamental é a
do fundo de ativos, para maquiar
o déficit público e salvar apenas os
privilegiados da União. São idéias
parecidas, mas com propósitos
bem diferentes. A nossa quer fazer
justiça. A do burocrata governamental quer manter privilégios e
apenas fazer um acerto contábil de
contas.
Luis Antonio de Medeiros, 49, é presidente da
Força Sindical. É autor de "A Conquista da Modernidade" (Geração Editorial).
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