São Paulo, domingo, 02 de julho de 2006

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Cristiana Arcangeli afirma que empresa fez apenas encomenda e nega subfaturamento

DA REPORTAGEM LOCAL

Cristiana Arcangeli, dona da PH Arcangeli e da rede de lojas de perfumes Phytá, suspeita de ser beneficiada em uma importação irregular de perfumes feita pela Nova Importação, afirma: "Fiz uma encomenda, sim, de perfumes para a Nova Importação. Qual o problema? Esse é o trabalho dela. A Receita quer acabar com as tradings?" Arcangeli diz que há uma grande confusão em relação à legislação que trata de operações de importação realizadas pelas empresas brasileiras. "Existe uma legislação que permite a encomenda às tradings. Todas as empresas que importam perfumes e cosméticos trabalham dessa forma. A Receita Federal acha que, só porque uma empresa é suspeita de importar de forma irregular, todas fazem a mesma coisa?" Ex-proprietária da Phytoervas, Arcangeli, que emprega aproximadamente 200 pessoas, decidiu criar um departamento de importação para não correr riscos e ficar desabastecida de perfumes. Ela lançou nesta semana uma linha de 35 produtos para o cabelo com a marca éh, em parceria com o empresário João Alves de Queiroz Filho, o Júnior, dono da Assolan. Leia a seguir os principais trechos da entrevista com a empresária. (FF e CR)  

FOLHA - A sua empresa, a PH Arcangeli, é suspeita de ter se beneficiado de importação que teria sido feita de forma irregular pela Nova Importação e que resultou numa apreensão de perfumes pela Receita Federal.
CRISTIANA ARCANGELI
- Há uma grande confusão no mercado de importação. O setor de perfumaria inteiro trabalha dessa forma [com encomenda de produtos às tradings]. Eu, a L'Oréal, a LVMH. Todas as empresas que trabalham com produtos importados, de A a Z, operam dessa forma. Isso não significa que a importação seja feita de modo irregular.

FOLHA - Isso significa que a sua empresa e as outras que você mencionou fazem encomendas dos produtos às tradings. Não fazem importação direta.
ARCANGELI
- Sim. Existe um fabricante lá fora e existe uma trading no Brasil. Você faz a encomenda e a trading traz as mercadorias. Todas as empresas trabalham assim no país, inclusive as marcas multinacionais. As tradings existem desde que o mundo é mundo fazendo esse trabalho.

FOLHA - A Daslu também utiliza tradings para importar.
ARCANGELI
- Não sei. Parece que a Daslu, pelo menos é o que a gente lê nos jornais, enfrenta outros problemas. O que eu posso dizer é que, no caso de cosméticos, o mercado no Brasil trabalha dessa forma.

FOLHA - Após o caso Daslu [butique suspeita de participar, em parceria com tradings, de esquema de importação irregular e, com isso, se livrar do pagamento de impostos], a Receita Federal está com o olhar mais atento às importações?
ARCANGELI
- Talvez o caso da Daslu tenha criado essa nuvem sobre os importadores. Qualquer empresa que traz, por exemplo, um pneu por meio de uma trading está fazendo algo de errado? Não é bem assim. Existe uma nova legislação da Receita Federal que diz que é legal comprar por encomenda.

FOLHA - Outras empresas que importam perfumes, como a PH, e cosméticos estão com problemas também para importar?
ARCANGELI
- Estão, sim. Existe uma confusão tão grande no mercado de importação que ninguém mais sabe como é possível importar. As tradings vão ter de fazer o quê? Fechar as portas. Existe uma empresa com 30 contêineres parados na Alfândega. Algumas estão com prejuízos sérios, porque vários desses produtos possuem data de validade.

FOLHA - A PH Arcangeli está trazendo importados para o país?
ARCANGELI
- Por causa de toda essa discussão, optei por montar um departamento interno de importação, que está me custando uma fortuna. Já tenho o Radar [registro concedido pela Receita para importar e exportar]. Já estou importando tudo de forma direta. Como não faço nada de errado, já tenho o registro. Não há processo contra mim.

FOLHA - Em razão da apreensão de perfumes importados pela Nova Importação para a PH, a PH recebeu alguma autuação da Receita Federal?
ARCANGELI
- Não. Olha, vou explicar a minha preocupação. O poder da mídia é muito grande. Tudo o que sai no jornal acaba se transformando numa verdade até que você consiga explicar o contrário. O fato de uma empresa fazer algo que não é correto não significa que todo mundo trabalha da mesma forma, que todo empresário é bandido, meu Deus do céu. Sou uma empresária. Comecei em 1986, com três funcionários. Com a Phytoervas, cheguei a ter 600 empregados. Agora, seis anos após a venda da Phytoervas, volto para lançar uma linha nacional própria de cosméticos.

FOLHA - Algumas tradings afirmam que há problema na interpretação da legislação que trata das importações.
ARCANGELI
- Eu concordo. Uma empresa pode fazer encomenda a uma trading, que é o que eu fiz no caso da Nova Importação. Em nenhum momento minha empresa se escondeu para não pagar IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados]. Sempre paguei IPI sobre os produtos que vendo. O imposto está destacado na minha tabela de preços.

FOLHA - As fiscalizações da Receita Federal nas operações de importação têm qual intenção, na sua avaliação?
ARCANGELI
- Aumentar a arrecadação. O que eu acho lindo, maravilhoso. Só que para isso não é preciso matar todo um setor. O governo não pode acabar com as empresas que operam de acordo com a lei. As tradings empregam muita gente e muitas delas estão sendo forçadas a demitir porque não têm mercadorias para vender. Se existiu alguém loiro de olho azul que matou alguém, não significa que todo loiro de olho azul é ruim. É preciso tomar muito cuidado. Se não, você acaba colocando todo mundo na vala comum. Tenho muito medo disso.

FOLHA - A Nova Importação fez algo de errado, em sua avaliação, em relação à importação de seus produtos?
ARCANGELI
- A Nova Importação é uma empresa séria, que existe, tem endereço, é só ir lá e ver, faz o trabalho que tem de fazer. Agora, como ela não pode mais importar, estou importando por conta própria.

FOLHA - A sua nova linha de cosméticos será produzida no país ou importada?
ARCANGELI
- Será produzida a nosso pedido em uma fábrica em Louveira (SP). Vou terceirizar a produção, o que é muito mais inteligente, muito mais econômico.

FOLHA - Como a PH avalia o fato de Justiça de Itajaí ter ratificado auto de infração para a perda dos perfumes importados pela Nova Importação?
ARCANGELI
- Na prática, quem dá o perdimento da mercadoria é a Receita Federal. O fiscal apreende e julga. A Justiça não julgou o mérito. Em mandado de segurança, não se discute o mérito. A Justiça ratificou a decisão da Receita. A Nova Importação tem de ter direito à defesa. Como pode o próprio fiscal que apreende a mercadoria lavrar auto de perda dos produtos? A empresa tem de poder se explicar no processo administrativo.

FOLHA - Auto da Receita cita que há suspeita de subfaturamento dos produtos importados e que os produtos eram revendidos por vocês por preços sete vezes maiores.
ARCANGELI
- Não houve subfaturamento algum. Eles até já desistiram de tocar nesse assunto no processo. A margem de lucro da importadora é de 3% sobre os perfumes trazidos. Essa é uma margem normal de lucro. Se o preço sobe muito, ninguém compra. Não existe mais no país aquela inflação que chegou a 70% em um mês. As pessoas precisam passar a entender isso. Os números são outros nos dias de hoje. Se você começar a trabalhar com margens de 50% de lucro, quanto vai custar um perfume para o consumidor?


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