São Paulo, domingo, 02 de julho de 2006

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Fracasso em Cannes faz publicidade rever modelo

País teve o pior desempenho no festival desde 2002, levando apenas 29 leões

Desgaste do formato brasileiro de negócio, que passa pela "regionalização" das campanhas, afeta a performance do país

Reprodução TV
Peça criada para a Volkswagen com Pelé, que foi finalista


ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Mesmo após o seu término no sábado, dia 24, o 53º Festival Internacional de Publicidade de Cannes continuou a ser palco de novos constrangimentos por parte dos brasileiros envolvidos na disputa.
Além do fato de ter conquistado apenas 29 leões -o pior resultado dos últimos quatro anos- e de ter ganho um prêmio com uma campanha "fantasma", o país se envolveu em mais tropeços nesta semana.
Um dos filmes publicitários premiados com o Leão de Bronze pode perder o prêmio. Isso porque a peça foi inscrita em 2005 e em 2006 no festival. Isso é proibido.
Publicitários brasileiros fazem um "mea culpa" a respeito do desempenho em Cannes, dizem que as agências estão amarradas em modelos ultrapassados e afirmam que os "criativos" -jargão para os profissionais que criam as campanhas- precisam sair do óbvio.
Eles criticam o trabalho de produção de filmes publicitários no Brasil, que recebe parcos investimentos dos clientes, e citam a Argentina como parâmetro de qualidade.
"Há um desgaste do modelo brasileiro. Nosso humor é o mesmo de anos atrás. Além disso, temos uma publicidade regionalizada, ou seja, que trata de questões locais. O mundo não se identifica com o que fazemos, nem Cannes, obviamente", diz Jader Rosseto, vice-presidente de criação da Fischer América e membro do júri de filmes do festival.
O Brasil somou 29 Leões e 277 pontos na edição de Cannes 2006. Em 2005, foram 42 prêmios e 363 pontos. O resultado deste ano é o pior em número de pontos e de Leões dos últimos quatro anos -em 2002 foram 24 leões e 282 pontos.
A Folha obteve os dados relativos ao desempenho do país no período de 2000 a 2006. Não houve queda no número de inscrições nas categorias em que o país se destaca mais (como anúncios e filmes) ou ocorreram mudanças no critério de classificação do material -o que poderia afetar o resultado.
Na avaliação dos publicitários ouvidos pela Folha, a questão esbarra em fatores que não se restringem à atuação dos profissionais e às suas criações. Há pontos relevantes como a falta de liberdade para arriscar -diante de um cliente temeroso em errar- e a limitação da verba (por parte dos clientes) para certos investimentos, como a produção.
A "ditadura das pesquisas de mercado", no passado utilizadas como um norte para as agências entenderem a eficiência do material criado, também acabou restringindo a capacidade de inovar, avaliam eles.
Para Roberto Dualibi, um dos sócios da DPZ, agência que ganhou um Leão de bronze na categoria impressos, "o desempenho do Brasil não foi tão ruim". Na análise de Dualibi, "é preciso lembrar que inscrever material em Cannes é caro e os diretores financeiros das agências estão muito mais rigorosos na liberação dessa verba", afirmou. "Discutimos aqui essa questão de como se arriscar a ser criativo e, ao mesmo tempo, fazer campanha para vender. Não achamos que isso seja uma escolha. É possível conciliar as questões."

Fatores operacionais
Na avaliação de Tomás Lorente, vice-presidente de criação da Young & Rubicam, a maior agência do Brasil, fatores operacionais podem interferir no produto final e isso tem ocorrido nos últimos anos. "Às vezes há excelentes idéias, mas pelo prazo a ser seguido e pelo tempo determinado para executar o trabalho, o resultado pode ficar comprometido."
Um dos pontos mais citados por publicitários é a chamada "regionalização" das campanhas. Como tratam de costumes locais, podem ser eficientes no Brasil como ferramenta de mídia, mas serem incompreensíveis a outros públicos.
Neste ano, o país foi personagem de momentos embaraçosos na competição. A agência Giovanni, FCB devolveu Leão de Bronze na categoria anúncios porque entendeu que a peça era "fantasma" -não havia sido publicada e, portanto, não poderia concorrer.
A criação era de antigos profissionais da empresa, que encaminharam o material a Cannes. A direção da Giovanni solicitou a retirada da peça da competição, mas, por "falha na comunicação interna", a retirada não aconteceu.
Dias após esse fato, na semana passada, a Lew, Lara foi questionada sobre o fato de ter ganho, equivocadamente, um Leão de Bronze com o filme publicitário para o grupo Schincariol. A peça já tinha concorrido em 2005 com o título "Glass". Neste ano, entrou com o título "Ilusão de ótica".
O regulamento proíbe reinscrição. A empresa diz que desconhecia esse fato e que solicitará uma posição da organização do festival. Não há informação de que isso tenha sido feito oficialmente ainda.


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