São Paulo, quarta-feira, 02 de julho de 2008

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Lula ataca especulação com alimentos

Presidente quer "enfrentamento internacional" da inflação para evitar que países ricos culpem economias mais pobres pelo aumento

Alta de preços foi o tema central no encontro de presidentes do Mercosul; brasileiro atacou especulação atual no mercado futuro


Juan Mabromata/France Presse
O presidente Lula durante encontro com colegas do Mercosul, na Argentina, onde propôs criar grupo de estudos sobre inflação

ADRIANA KÜCHLER
ENVIADA ESPECIAL A SAN MIGUEL DE TUCUMÁN

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou ontem os países do Mercosul a discutir urgentemente a questão da alta mundial dos alimentos para que não sejam culpados "por uma crise que não é nossa".
"Se não começarmos a discutir essas coisas enquanto temos tempo, eles vão jogar outra vez -por todos os discursos que estamos vendo- a crise da inflação e a crise dos alimentos nas custas dos países pobres."
O anúncio foi feito ontem na 35ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul, em San Miguel de Tucumán, na Argentina, durante o discurso em que Lula assumiu a presidência temporária do bloco.
Lula prometeu criar grupo de estudos para discutir o tema e preparar documento "para que haja um enfrentamento internacional" sobre o tema. "Não temos o direito de permitir que sejamos tratados como coadjuvantes num assunto em que somos os artistas principais."
Lula afirmou que a crise imobiliária americana envolveu muitos bancos europeus, e "o FMI não deu um único palpite de como os americanos devem consertar a sua economia, em função da especulação".
"Mas, logo, haverá muitos países [da América do Sul] recebendo missão do FMI dizendo que têm que fazer um ajuste fiscal pesado, que precisam fazer contenção de despesas, e nós já conhecemos o resultado final dessa história."
Segundo o presidente, é preciso investigar dois temas que dizem respeito aos países do Mercosul: o preço no mercado futuro de alimentos e o do petróleo. "Uma especulação no mercado futuro permite que um produtor de milho ou de soja possa vender a sua produção de três anos sem ter produzido, e o que pode ser grave é que o preço no mercado futuro precifica o preço no presente."
Sobre o valor do petróleo, afirmou que notícias relataram que o mercado futuro do produto tem o mesmo estoque que consome a China. "Então, não temos apenas uma China, temos duas Chinas: uma que utiliza o petróleo e outra que especula com a mesma quantidade da China."
Em relação à acusação de que a produção de álcool e de biocombustíveis, encabeçada pelo Brasil, poderia ser responsável pela alta dos alimentos, Lula disse que é preciso saber "o que tem de verdade nisso". "Se alguém me convencer de que o biocombustível vai causar o problema da fome no mundo, não trocarei o meu estômago por um tanque de gasolina."
O discurso de Lula seria uma prévia da declaração que fará na reunião do G8 no Japão, que acontece nos dias 7 e 8. "Nem queria ir ao Japão, mas vou só para ver se alguém aceita fazer essa discussão."
Com Chávez e a presidente argentina, Cristina Kirchner, Lula teve uma reunião trilateral para discutir os principais problemas do bloco: alimentos e energia. "A Venezuela tem petróleo e gás de sobra, mas tem problemas de abastecimento alimentar", afirmou Lula. "Tanto nós podemos resolver o problema alimentar deles quanto eles resolverem nosso problema energético." Para isso, representantes dos três países devem ter reuniões mais freqüentes para tratar de como pôr a política em prática.
Com Cristina, Lula teve reunião bilateral em que trataram das divergências sobre a Rodada Doha. A Argentina vem apresentando barreiras para a negociação, travada há anos, mas, segundo Lula, um acordo estaria "prestes a se concluir". Para isso, os dois países teriam reunião no próximo dia 14, ainda sem local confirmado.
Lula afirmou ainda que a inflação causada pelos alimentos é apenas "um alerta" para que o país produza mais alimentos. Afirmou que o fenômeno da inflação "não vai voltar a acontecer" no Brasil por mais que se especule. "Não brincaremos com a inflação", disse Lula, afirmando que, por isso, a meta para 2010 foi fixada em 4,5%, a mesma deste ano e de 2009.


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