São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009

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Meirelles já flerta com vários partidos

Presidente do Banco Central estuda alternativas para lançar-se candidato nas eleições de 2010 e consulta marqueteiros

Governo vê movimento com desconfiança e curiosidade; até possibilidade, remota, de ser vice na chapa de Dilma Rousseff é cogitada


MARCIO AITH
DA REPORTAGEM LOCAL

Até ser convidado para a presidência do Banco Central pelo senador Aloizio Mercadante, em 2002, numa recepção na embaixada brasileira em Wa- shington, Henrique Meirelles era apenas um azarão.
Só foi chamado porque outros três banqueiros haviam declinado do convite, crentes no desastre econômico do governo petista que se iniciaria.
Meirelles também não tinha vínculo com petistas: era deputado eleito pelo PSDB. Pior. Ex-presidente do BankBoston, simbolizava o que a esquerda via como uma doença: o sistema financeiro internacional.
Meirelles, no entanto, sobreviveu, contra todos os prognósticos, exceto o dele. Driblou o fogo amigo do PT, a picardia dos analistas econômicos e duas denúncias graves -foi investigado por sonegação fiscal e um sobrinho dele foi pego no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com uma mala contendo dinheiro vivo do tio.
Apresenta-se agora como o fiador de avanços econômicos substanciais. Na sua gestão, as reservas brasileiras pularam de US$ 14 bilhões para US$ 210 bilhões; a inflação anualizada (IPCA) caiu de 28,3% para 4,4%; e a Selic anual despencou de 25% para 8,75%, o patamar mais baixo da história.

Mexe-mexe
Com tais realizações, que acredita serem em grande parte suas, Meirelles forjou até uma relação mais próxima com Lula. Ambos conversam sobre política e economia com certa frequência e informalidade. Até tiveram uma noite de mexe-mexe, o jogo de cartas preferido do presidente, que requer dois baralhos, sem os curingas.
Tudo indica que agora, após seis anos e meio no cargo, Meirelles vai candidatar-se a um cargo eletivo em 2010. Para isso, terá de escolher uma legenda até o fim de setembro, um ano antes do pleito, prazo de filiação partidária para os potenciais candidatos a presidente, vice-presidente, senador e deputado federal.
Refiliando-se, Meirelles poderá ficar no BC até abril do ano que vem. Só então, caso realmente decida candidatar-se, terá de se desincompatibilizar da presidência do BC.
A Folha conversou sobre os planos dele com funcionários do BC, integrantes do governo e de partidos com os quais negocia a filiação (PMDB, PR, PTB E PP). Dessas conversas, surge um leque de opções que inclui a candidatura à Vice-Presidência, ao Senado e ao governo de Goiás. Meirelles não quis comentar o assunto.
Assim que se refiliar a um partido, Meirelles sabe que será criticado por nutrir justamente aquilo que enxergava em seus adversários -o desejo de politizar o Banco Central e a política monetária.
Sua filiação colocará em suspeição gestões feitas por ele próprio a favor da autonomia do BC. Afinal, essa autonomia deveria valer não só para blindar o banco contra ingerências políticas externas, mas também contra ambições internas.
Mas ele está disposto a enfrentar essas críticas. Argumenta que vai preservar a independência técnica da política monetária porque sabe que nela está seu ativo eleitoral. Por esse motivo, não se sente moralmente obrigado a deixar o cargo com a simples filiação.
O presidente do BC vê a escolha de um partido como um contrato de opção no mercado futuro. Ao decidir-se por um partido, diz a assessores, apenas adquire um ingresso para entrar no jogo eleitoral. Caso contrário, fecha a porta da política, algo não compatível com sua ambição e missão pública.
O PMDB parece ser seu partido preferido porque permite voos maiores do que a candidatura ao Senado por Goiás.
Maior legenda da base aliada, o partido provavelmente definirá o nome do companheiro de chapa da ministra Dilma. Ainda que seja um balaio de gatos, repleto de cardeais com projetos próprios, o PMDB seria suficientemente pragmático para enxergar em Meirelles uma âncora de credibilidade.
Isso, é claro, segundo marqueteiros, para os quais já existiriam pesquisas qualitativas indicando ser possível associar um nome como o de Meirelles à estabilidade econômica -principalmente se Lula der uma "ajudazinha" retórica.

À direita e à esquerda
O governo vê a movimentação de Meirelles com um misto de desconfiança e curiosidade.
A maioria a desaprova. Alguns, no entanto, dizem que a chapa Dilma/Meirelles pode atrair doadores de peso, além de permitir ao PT combater a provável candidatura do governador José Serra tanto pela esquerda, com Dilma, quanto pela direita, com o banqueiro.
A segunda opção de Meirel- les é a candidatura ao governo de Goiás, o que também não é trivial. Depende do apoio do prefeito de Goiânia, Íris Rezende (PMDB), possível candidato ao mesmo cargo. Rezende tem confundido o presidente do BC com declarações dúbias sobre as suas intenções políticas.
Meirelles pode optar por um partido menor. Ele mantém canal aberto com o PP, com o PR e com o PTB. Por esses partidos, poderia, em tese, disputar o próprio governo contra Íris Rezende. Mas Meirelles prefere ganhar o apoio do prefeito.
E a Presidência da República? Meirelles já pensou muito mais nessa hipótese do que hoje. Há alguns anos, ouviu até a opinião de marqueteiros de peso -um português, outro americano, ambos cientificamente entusiastas do projeto.
Mas seu objetivo de curto prazo é bem mais prosaico. Ele ainda não tem um partido.


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