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FINANÇAS
Bancos usaram direito de converter dívida pública em investimento para desviar divisas; esquema pode ter usado "laranja"
PF apura fraude bancária na dívida externa
LÁSZLÓ VARGA
DA REPORTAGEM LOCAL
O Banco Central (BC) virou alvo
de uma devassa promovida pela
Polícia Federal, destinada a identificar bancos estrangeiros e brasileiros que driblaram a legislação
sobre conversão de títulos da dívida externa nos anos 80, enviando
ilegalmente recursos ao exterior.
A Folha teve acesso a uma lista
parcial de 25 bancos investigados,
responsáveis por US$ 277 milhões
em transações. Lloyds, American
Express Bank, Brasilpar e Bankers
Trust Company (hoje Deutsche
Bank) estão na relação.
As investigações no BC tiveram
início em janeiro e estão sob sigilo. O objetivo da Polícia Federal é
descobrir os bancos que teriam lesado o país com essas operações e
contribuído de modo ilegal para o
aumento da dívida externa, que
hoje está no patamar de US$ 228
bilhões. A Folha apurou que a determinação no BC é que seus funcionários colaborem com o trabalho da PF.
Os bancos sob investigação podem ter usado empresas "laranja", sem registro na Junta Comercial do Estado de São Paulo, para
fazer uma triangulação e reenviar
os dólares para o exterior sem
permissão do BC.
A Folha apurou, por exemplo,
que as companhias COF Chimie
do Brasil Participações, Bolsa Empreendimentos Comerciais e
Goodman Fieldex do Brasil teriam recebido um total de US$
135 milhões de bancos como Bankers Trust Company e Lloyds
Bank. Mas essas empresas não
têm registro na Jucesp.
Estratégia de remessa
A PF acredita que parte dos bancos ou empresas sob investigação
utilizaram um artifício muito comum nos anos 80, quando o Brasil entrou em moratória e suspendeu o pagamento de sua dívida
externa.
Vários instituições financeiras
ou indústrias tinham créditos a
receber do Brasil, mas, devido aos
problemas de falta de dólares no
país, tiveram seus recursos retidos no Banco Central.
A liberação do dinheiro era na
base do conta-gotas. O mercado
financeiro começou a negociar esses títulos com deságios de até
80% do valor de face. Para evitar a
saída de recursos do país, o Banco
Central emitiu, em 1984, a carta
circular nº 1.125, que garantia o
pagamento do valor de face dos títulos, desde que o portador do papel se comprometesse a investir o
dinheiro em projetos no Brasil
durante 12 anos.
Em 1988, a resolução nº 1.940
aperfeiçoou o esquema. A Folha
apurou que a PF já identificou vários casos em que o dinheiro não
permaneceu no país pelo prazo de
12 anos. Isso caracterizaria crimes
de evasão de divisas e de lavagem
de dinheiro. As condenações para
esses crimes são de até 20 anos de
detenção.
Um dos casos que a PF está investigando é o do banco Paribas
(hoje BNP Paribas), que, em 1993,
conseguiu a liberação de US$ 20
milhões originários de títulos da
dívida externa. Comprometeu-se
a construir um hotel no Estado de
São Paulo.
O advogado contratado para
conseguir a liberação dos dólares
foi Marcos David Figueiredo de
Oliveira. O dinheiro, ao ser liberado, foi enviado para a empresa
Achcar, que ficou responsável pela construção do hotel. Mas Oliveira não recebeu os US$ 2 milhões que reivindicava como honorários. "Cobrei então o dinheiro do Paribas, mas eles propuseram pagar apenas US$ 200 mil."
A partir daí, Oliveira entrou em
uma epopéia de ações na Justiça
para receber os honorários. Elas
sempre foram rejeitadas. "Em
1996, acabei descobrindo que os
US$ 20 milhões já haviam voltado
para o exterior, pois a IDB Investment Company, uma empresa do
paraíso fiscal da Ilha Jersey, declarou ter assumido a empresa que
tocaria o projeto hoteleiro". O hotel nunca saiu do papel.
Oliveira pretende processar diversos juízes, acusando-os de incompetência ou descaso para
atender suas reivindicações.
Inquérito policial
A PF entrou em 1996 no caso do
Paribas, a pedido de Oliveira. Um
inquérito policial foi aberto e, em
novembro do ano passado, o delegado Protógenes Pinheiro de
Queiroz determinou o indiciamento e a quebra do sigilo bancário de três ex-diretores do banco
-Alain Charles Bouedo, Marc
Richmond Jacques Hartpence e
Jean Patrick Rene Marie Toulemonde. O processo judicial corre
na 5ª Vara Criminal da Justiça Federal em São Paulo.
Diante dos fortes indícios de
evasão de divisas no Paribas, a PF
decidiu deflagrar no BC as investigações de todas as operações suspeitas de manejo ilegal de títulos
da dívida externa para remessas.
Atualmente, a PF aguarda a remessa pelo BC da lista dos bancos
envolvidos, que pode ser entregue
nas próximas semanas.
BC nega informação
Durante dez dias a Folha procurou o BC para que a instituição se
pronunciasse sobre o assunto. O
objetivo era obter dados sobre o
total de operações de conversão
de títulos da dívida externa, principalmente nos anos 80, assim como o número de bancos e empresas envolvidos. Sua assessoria se
recusou a fornecer as informações, alegando sigilo.
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