São Paulo, terça-feira, 03 de março de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

A febre terçã da finança e o Brasil


Finança vive febre trimestral da divulgação dos balanços podres; Brasil despiora um pouco, mas cresce quase nada

TERÇÃ É aquela febre dos desafortunados doentes de malária, que volta de três em três dias, mais ou menos, e causa tremedeiras tristes de ver. O mercado financeiro está assim desde 2007, com sua tremedeira terçã, sua febre "balancê", causada pela divulgação de balanços trimestrais, infectados pelo parasita financista. É quando o mercado deixa de acreditar em suas patranhas e propagandas do "pior já passou". Embora febril, tem acessos de lucidez e derruba os preços ainda inflacionados de seus ativos.
Em trimestres piores morre alguém, um Lehman, um Bear Stearns. É verdade que a AIG quebrou pela enésima vez e agora apareceu um paciente inglês novo, o HSBC, que está menos pior que o resto, mas, a fim de fazer capital, vai ofertar uma baciada de ações na xepa do mercado, baratas como abobrinhas no fim de feira. Mas, como os doentes mais ricos estão no hospital do governo, em UTIs carésimas, os mortos-vivos resistem. Nada de novo na selva financeira.

Brasil despiora
O risco é a febre durar mais do que a temporada do balancê ou revoadas de mosquitos da finança virem nos chupar o sangue, exaurindo o real, encarecendo rápido demais o dólar, por exemplo. Pode ser também que doentes bancários e a UTI dos governos suguem ainda mais o soro do crédito mundial, deixando-nos na pindaíba. Apesar dos esforços razoáveis do governo para substituir a seca de dinheiro global, há um limite para o crédito estepe.
Por falar em crédito estepe e outras sobressalências, a redução de imposto e liquidações fizeram com que a venda de carros em fevereiro empatasse com a de fevereiro de 2008. A medida do governo Lula evitou uma desgraça maior -impediu que a bola de neve das demissões e cortes de produção das montadoras crescesse rápido demais.
Mas a bola de neve ainda desce a ladeira. No total, as vendas de veículos estão 10% menores que em fevereiro de 2008. Vendem-se menos caminhões (20% menos), ônibus e motos, por exemplo.
A economia brasileira despiora um tico. "Despiora", sim. Tem de ser na base do neologismo, pois apenas nos recuperamos do infarto geral de dezembro. A carga de energia subiu um pouquinho, 0,7%, sobre fevereiro de 2008, mas foi um crescimento tão fraco como o do já terrível novembro do ano passado.
O nível de utilização das fábricas, porém, caiu mais um pouco de janeiro para fevereiro, segundo medida da Fundação Getulio Vargas. O mês foi, como em janeiro, o menor da série histórica, não lá muito histórica, pois iniciada em 2005. No caso das fábricas de máquinas ("bens de capital"), a coisa foi um pouco pior; na indústria de materiais de construção, nem tanto.
Saiu ontem ainda o balanço do comércio exterior do primeiro bimestre. O valor das exportações ficou 21% menor que no mesmo período do ano passado. A julgar pelo comportamento dos anos anteriores da balança e algumas estimativas de comércio mundial, deve ser o tamanho da queda das exportações para o ano inteiro.
Porém e enfim, apesar de estarmos despiorando, vamos por ora na batida do crescimento quase zero.

vinit@uol.com.br


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