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LUÍS NASSIF
Decifrando o Plano Real
Na semana passada, procurei destrinchar a aparente falta de lógica da política
cambial do Plano Real, à luz
da internacionalização da
poupança interna. Nos anos
80, houve intenso processo de
acumulação na ciranda financeira, época em que fortunas
foram criadas em cima da mera "adivinhação" das taxas do
Banco Central, dos movimentos de futuros da Bolsa, da corrupção pública facilitada pela
inflação.
Esse dinheiro ficava no Brasil
em contas ao portador. Em
março de 1990, quando advém
o Plano Collor -com o bloqueio dos cruzados e o fim das
contas ao portador-, um volume expressivo sai através de
doleiros.
A possibilidade de reciclar esse dinheiro, disfarçado de investimento externo, permite
ganhos inéditos aos bancos de
investimento, corretoras e consultores especializados em fundos agressivos, criados na ciranda dos anos 80. O butim era
apenas deles, já que os bancos
comerciais, conservadores, não
disputariam essa poupança.
Sucessivos erros
São esses interesses que explicam a lógica dos erros sucessivos da política cambial. Veja
como a lógica econômica foi
aviltada em três episódios conhecidos:
Episódio 1: a apreciação cambial do Real.
Os autores do Plano Real defenderam insistentemente a
necessidade de geração de déficits em contas correntes, a fim
de abrir espaço para o capital
financeiro. Segundo a teoria
econômica, a geração de déficits visa evitar a apreciação do
câmbio. Se entra muito dólar
via conta comercial e muito
dólar via conta financeira, o
excesso de dólares provoca a
apreciação do câmbio, tirando
a competitividade da produção
interna. A alternativa é facilitar as importações, reduzindo
o superávit comercial sem
apreciar o câmbio. O que o Plano Real fez foi não apenas escancarar o país para as importações, como apreciar o câmbio, acelerando a dependência
do país desse capital especulativo. Não foi acidental: foi uma
meta perseguida e comemorada.
Episódio 2: a facilitação, pelo
Banco Central, da remessa de
dólares através dos esquemas
de fronteira.
Com a apreciação do real,
grandes grupos brasileiros são
vendidos e aumenta o capital
rentista no país. Esse dinheiro
saía através do câmbio paralelo. O Banco Central alegou que
o ágio do paralelo conturbava
o mercado e criou facilidades
para que esse dinheiro saísse
pelo câmbio oficial através das
contas CC5 (destinadas a não-residentes no país). Na verdade, o que o Banco Central fez
foi eliminar o imposto-ágio e o
risco legal, dois fatores inibidores à saída de dólares, em momento em que era crucial para
o país manter o dinheiro aqui.
Episódio 3: a compra de dívida externa.
Ainda no primeiro governo
de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), correm rumores
de que o Banco Central pretendia recomprar títulos da dívida
externa brasileira. Para quê, se
o país necessitava robustecer
sua reserva em dólares? Grupos
brasileiros se antecipam e adquirem títulos da dívida externa brasileira, aguardando a
valorização. A crise da Rússia
(em agosto de 1998) surge de
forma imprevista, apanhando
muitos fundos no contrapé.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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