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ENTREVISTA - EDISON LOBÃO
Brasil não pode se tornar refém de ambientalistas
Ministro de Minas e Energia diz que atraso em liberação de usinas hidrelétricas fará consumidor pagar mais caro por energia de geração térmica, mais poluente
Alan Marques - 14.ago.2009/Folha Imagem
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O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, em Brasília; ele diz que ainda não foi identificada nenhuma falha para o apagão denovembro
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá enviar
ao Congresso em 2010 um projeto de lei que prevê a
criação de benefícios fiscais para a implantação de
usinas siderúrgicas no país. O ministro de Minas e
Energia, Edison Lobão, disse à Folha que o objetivo
da medida é reduzir a exportação de minério de ferro bruto, uma bandeira de Lula e um dos motivos
das desavenças entre o presidente e o comando da
mineradora Vale do Rio Doce no ano passado.
Na entrevista, Lobão também afirma que o Brasil
não pode ficar "refém dos humores" do Meio Ambiente. Caso contrário, vai enfrentar "dificuldades"
no futuro na área energética.
Segundo Lobão, essas dificuldades não serão de falta de
energia, mas da necessidade de
o consumidor pagar por uma
energia "mais cara e poluente"
das termelétricas. Elas terão de
ser acionadas se as usinas hidrelétricas em construção sofrerem grandes atrasos.
O ministro volta a repetir que
o apagão ocorrido no país no
início de novembro passado,
que afetou 18 Estados mais o
Distrito Federal, deveu-se a
"fenômenos atmosféricos adversos" e afirma: "Eu quase diria que estou torcendo para que
haja uma falha técnica, para
que ela possa ser corrigida daqui para a frente. Mas até agora
não apareceu".
A seguir, os principais trechos da entrevista:
FOLHA - Qual lição o apagão deixou? Houve falha de manutenção?
LOBÃO - Nós não temos nenhuma ideia fixa no sentido de defender o sistema naquilo em
que ele eventualmente não devesse ser defendido. Mas nosso
sistema de transmissão de
energia é considerado um dos
melhores do mundo, senão o
melhor.
FOLHA - Mas nenhuma falha foi
identificada no apagão?
LOBÃO - Não. Já fizemos vários
estudos, relatórios, e a conclusão é que tinha havido realmente fenômenos atmosféricos adversos. Bem, ainda estamos fazendo novas investigações. Se você me perguntar, eu
quase diria que estou torcendo
para que haja uma falha técnica
para que ela possa ser corrigida
daqui para a frente. Mas até
agora não apareceu.
FOLHA - Segundo as previsões, o
país volta a crescer acima de 5% neste ano. E várias usinas hidrelétricas
em construção estão enfrentando
problemas no seu cronograma de
obras. Isso não coloca em risco o fornecimento de energia?
LOBÃO - Nós não trabalhamos
com a possibilidade de racionamento de energia no Brasil.
Além das hidrelétricas que estamos construindo, ou em fase
de licitação e de recebimento
das licenças ambientais, temos
a solidez das termelétricas, que
constituem uma energia cara e
poluente. Todavia é um estoque de energia que possuímos,
estoque estratégico. Falhando
o sistema hídrico, seja porque
não choveu, seja porque não se
conseguiram as licenças a tempo, entrará em funcionamento
o sistema térmico do país.
FOLHA - É a melhor solução?
LOBÃO - Não, é a pior solução.
Mas é um estoque estratégico
que possuímos.
FOLHA - Como o sr. classifica o embate no governo em torno das licenças ambientais para a construção de
usinas hidrelétricas?
LOBÃO - Não quero qualificar
as dificuldades que temos tido
com o Meio Ambiente. Temos
tido, sim, tais dificuldades intensamente cada vez mais. O
caso de Belo Monte [no rio Xingu, no Pará] é um exemplo flagrante. Não se concedeu a licença, embora o ministro do
Meio Ambiente [Carlos Minc] e
o presidente do Ibama [Roberto Messias], numa reunião com
o presidente, com a ministra
Dilma [Rousseff], comigo e
com outras autoridades, tenham nos garantido para o mês
de novembro [passado] a emissão da licença ambiental.
FOLHA - Não veio?
LOBÃO - Eu, perguntado pela
imprensa, declarei que na segunda-feira seguinte a licença
seria concedida. Isso foi motivo
para que um alto funcionário
do Ibama dissesse que não estava concedendo a licença porque os ministros do Gabinete
Civil e de Minas e Energia haviam marcado data para a concessão da licença. Ora, a data foi
marcada pelo ministro do Meio
Ambiente e pelo presidente do
Ibama no Palácio do Planalto.
Não era motivo para que a licença não fosse concedida.
O Brasil não pode ficar refém
dos humores do Meio Ambiente. Não há energia melhor, mais
limpa e mais barata do que a hídrica. Mas, como estamos sujeitos aos humores do Meio
Ambiente, poderemos ter dificuldades no futuro. Dificuldades de que natureza? Falta de
energia? Não, mas seguramente vamos ter que pagar, o consumidor vai ter que pagar por
uma energia mais cara e poluente.
FOLHA - É um contrassenso?
LOBÃO - Acho um contrassenso. Até porque estamos tendo
todos os cuidados no sentido de
que os reservatórios das hidrelétricas sejam os menores possíveis e estamos até, já agora,
introduzindo um sistema de reflorestamento de toda devastação feita em volta da construção de uma hidrelétrica.
FOLHA - Os projetos do marco regulatório do pré-sal não foram aprovados no tempo esperado e devem
avançar no calendário eleitoral. Isso
compromete os planos do governo
de fazer os leilões neste ano?
LOBÃO - Compromete. Nós
imaginávamos que poderíamos
realizar esses leilões ainda no
fim de 2009 ou no começo deste ano. Já verificamos que isso
não será possível. As leis não foram votadas.
FOLHA - O que aconteceu?
LOBÃO - Dificuldades de entendimentos entre os próprios
parlamentares, a questão dos
royalties [distribuídos a Estados e municípios] sobretudo.
FOLHA - O sr. acha que coloca em
risco até a aprovação em 2010?
LOBÃO - Não tenho esse receio.
Na medida em que se observa
que há essa possibilidade, o
presidente Lula pode solicitar a
urgência [para a tramitação dos
projetos] que ele havia retirado
no começo [em setembro, dias
após ter enviado os projetos de
lei ao Congresso].
FOLHA - E o novo código de mineração, quando ele será enviado ao
Congresso? Terá aumento dos royalties cobrados das mineradoras ou do
imposto de exportação?
LOBÃO - Ainda não está definido. Queremos fazer algo que
modernize todo o sistema, mas
sem embaraços às empresas
exportadoras. É claro que, na
medida em que nos convencermos de que estamos cobrando
taxas muito inferiores do que o
mundo cobra, teremos que aumentar um pouco.
FOLHA - O marco regulatório vai
tratar da preocupação do presidente
Lula, revelada no embate com a Vale, de reduzir a exportação de minério de ferro bruto e aumentar a de
produtos acabados?
LOBÃO - Não, não deve constar
do novo código mineral brasileiro. Mas o presidente está disposto a enviar um outro projeto
de lei ao Congresso estabelecendo vantagens para quem
produzir aqui, quem se implantar na transformação do minério em produtos acabados.
FOLHA - Que benefício?
LOBÃO - Benefícios fiscais. Hoje o benefício fiscal é o contrário. Consegue benefício quem
exporta o minério bruto. Ou semiacabado ou semielaborado.
E cobra dos produtos acabados.
A ideia é inverter. Basta inverter para resolver o problema.
FOLHA - O empresário Jorge Gerdau diz que hoje há capacidade ociosa no parque siderúrgico e diz que
construir novas usinas siderúrgicas
não é a solução.
LOBÃO - Olha, o doutor Jorge
Gerdau é um dos maiores empresários brasileiros, um dos
maiores do mundo. É um empresário de grande competência e temos orgulho da presença dele no setor produtivo nacional. O que não quer dizer
que estejamos absolutamente
de acordo com todas as concepções empresariais dele.
FOLHA - E o botijão de gás social,
vai sair?
LOBÃO - Foi uma ideia do presidente Lula, que solicitou ao Ministério de Minas e Energia um
trabalho nesse sentido. O presidente quer um abatimento de
20% a 30% no preço do botijão
de gás para as famílias de baixa
renda.
Estamos trabalhando nessa
direção. Procurando meios e
modos de encontrar uma solução. A primeira que encontramos foi no sentido de o Tesouro
financiar. O Ministério da Fazenda, obviamente, não gosta
dessa solução. Isso importaria
num custo da ordem de R$ 1 bilhão por ano. Estamos procurando outras saídas.
FOLHA - Quem é o melhor vice do
seu partido [o PMDB] para compor a
chapa com ministra Dilma?
LOBÃO - Há muitos nomes
bons. Mas eu creio que o nome
do presidente do partido, Michel Temer, por ser exatamente aquele que, no meu entendimento, mais agrega, mais une o
partido, é o melhor nome.
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