São Paulo, quarta-feira, 04 de fevereiro de 2004

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SOSSEGA MERCADO

Após turbulência financeira, ministro da Fazenda dá entrevista, nega divergências internas e mostra otimismo

Política monetária não muda, diz Palocci

SÍLVIA MUGNATTO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A piora dos indicadores econômicos nos últimos dias fez com que o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) tentasse esclarecer ontem, em entrevista coletiva, que não há divergências no governo em relação aos rumos da política econômica e que a taxa básica de juros deverá voltar a cair.
Os juros foram mantidos em 16,5% ao ano pelo Banco Central em janeiro. Essa decisão e uma nota do Federal Reserve (banco central dos EUA) que apontou um possível aumento da taxa no país antes do esperado influenciaram o mercado brasileiro, que viveu dias de turbulência entre a semana passada e anteontem.
Segundo Palocci, a piora não foi "verde-amarela", pois atingiu todos os países emergentes. Leia a seguir trechos da entrevista.
 

INFLAÇÃO - As pressões inflacionárias estão muito concentradas em fatores sazonais como aumento de escola, transporte coletivo e produtos influenciados pelo clima. Esses preços têm mostrado uma repercussão maior. Não quer dizer que não possa ser outro nível de problema.

SELIC - O governo pode adotar uma postura mais conservadora? Não vejo o porquê. Existe uma expectativa em termos de crescimento, em termos de política monetária para o ano e não há indicação de que isso deva mudar. O próprio Copom [Comitê de Política Monetária] publicou nota dizendo que havia suspendido temporariamente o processo de queda das taxas de juros. Não retirou a perspectiva de uma curva de queda.
Mas é preciso que o Brasil se prepare para resolver os seus problemas de longo prazo. Não podemos depender apenas da política monetária para o crescimento. Temos que mexer nas questões estruturais, na microeconomia.
Esse governo, na medida em que decidiu priorizar o equilíbrio macroeconômico, sabe que isso tem um custo. Quando o presidente Lula faz afirmações nesse sentido, mostra o compromisso de longo prazo que ele tem.

JUROS NOS EUA - Não é uma piora verde-amarela [dos indicadores, por causa de uma eventual alta das taxas de juros nos EUA]. Houve uma desvalorização em todos os países emergentes e um aumento do risco. Esse é um efeito esperado quando o Fed dá esse sinal. Eu recebi muito uma pergunta antes da guerra no Iraque: Quais são as medidas drásticas que o ministro vai tomar diante da possibilidade da guerra? Os indicadores melhoraram com o início da guerra porque eles já estavam precificados. O Brasil estaria preparado para as mudanças? Só temos feito isso nesse último período. Melhoramos o perfil da nossa dívida, reduzimos nossos compromissos cambiais, estamos melhorando nossas reservas e fizemos um acordo preventivo com o Fundo Monetário Internacional. As coisas já estão mais calmas. Peço licença para não ser pessimista.

FOGO AMIGO - Não há, na verdade, um questionamento da política econômica dentro do governo. Há a expectativa de que, com o Brasil melhorando, nós possamos fazer mais. Acho que esse sentimento é positivo. Mas é preciso equilibrar a nossa vontade, pois, se o país fizer mais do que o que é possível, ele constrói uma conta a ser paga. Mudar de rota nesse momento seria incompreensível.
Os guardiões do Tesouro não são as pessoas mais amadas do governo. No ano passado, com o ajuste que nós fizemos, era difícil para o meu caro Joaquim Levy [secretário do Tesouro Nacional] se tornar a pessoa mais amada da Esplanada. Mas eu confio amplamente na competência do Joaquim e do Marcos [Lisboa, secretário de Política Econômica]. Muitas vezes atribuímos as coisas que dão certo no ministério ao fato de que temos uma boa equipe e apenas um médico. As pessoas podem dar opiniões de que um é mais duro no trato da coisa, mas isso faz parte da discussão da personalidade. Agora cabe ao secretário do Tesouro agir como é preciso em um país que deve equilibrar suas contas.

DÍVIDA E SUPERÁVIT - Às vezes as aparências nos trazem uma fotografia da dívida mais preocupante do que ela é. Ela aumentou pouco mais de 3,5%, enquanto a inflação foi de pouco mais de 9% em 2003. Não há motivos para acreditar que a dívida não possa cair neste ano. Se o Brasil tivesse feito um esforço fiscal nos oito anos anteriores a 2002, a dívida seria de até 26,5% do PIB [Produto Interno Bruto] no final de 2002 [hoje é de 58,2%]. Algumas pessoas olham o valor nominal da dívida no final do ano passado e acham que o esforço deu pouco resultado. Mas ela teve um comportamento bom no ano passado e neste ano começará a ser reduzida depois de dez anos.
O equilíbrio fiscal de longo prazo só dá certo se você considerar regras como as do superávit primário [economia de receita para o pagamento de juros da dívida] como regras de ouro. Apesar dele, em 2003, os grande projetos de transferência de renda não foram comprometidos em nenhum grau. Isso não é mágica. Estamos trabalhando para melhorar a qualidade do gasto público com menor custo.


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