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São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

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MARCHA LENTA

Para banco, comportamento retraído das companhias é causado pelo endividamento elevado em dólar

Empresas temem investir, detecta BNDES

CHICO SANTOS
DA SUCURSAL DO RIO

Os resultados operacionais do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) no primeiro trimestre revelam um dado preocupante. Segundo os números, só há crescimento nos financiamentos de pequeno porte, destinados a projetos de renovação ou modernização das unidades já existentes.
De janeiro a março, enquanto os desembolsos do banco caíram 14%, aqueles destinados a pequenos investimentos cresceram 25,9%. São empréstimos de, no máximo, R$ 10 milhões.
Esses empréstimos se encaixam no âmbito dos programas Finame (compra de máquinas e equipamentos), BNDES Automático (investimentos pequenos em instalações) e Finame leasing (aquisição de máquinas e equipamentos por meio de contratos de aluguel).
Nos três primeiros meses do ano passado esses três programas haviam emprestado R$ 1,431 bilhão, valor que passou para R$ 1,802 bilhão no primeiro trimestre deste ano, crescimento concentrado, basicamente, na aquisição de máquinas e equipamentos. Nessa rubrica, o aumento foi de 34%, passando de R$ 787,3 milhões para R$ 1,055 bilhão.
A participação desses pequenos empréstimos no total desembolsado pelo banco atingiu quase um terço (32,8%) no primeiro trimestre deste ano, contra menos de um quarto (22,4%) no mesmo período do ano passado.
Esses números revelam que os investimentos em novas unidades encolheram. Os empresários, no geral, estão preferindo aplicar poucos recursos para obter ganhos de capacidade produtiva adicionais dentro dos limites das instalações já existentes.
Analistas estão preocupados com a possibilidade de que essa timidez leve a uma nova redução da taxa de investimentos do país, que no ano passado já foi a menor em dez anos (17,3%).
Essa constatação se soma a dois outros motivos de preocupação que já haviam sido constatados nos números do banco, praticamente a única fonte de financiamentos produtivos de longo prazo do país: a drástica redução tanto no número de aprovações de novos projetos (queda de 65%) quanto no de pedidos de novos financiamentos (menos 57%).
A queda do número de aprovações está ainda relacionada com a transição no BNDES, uma mudança que foi não apenas de nomes, mas de modelo. Já a queda nos pedidos parece decorrer da mesma causa que faz crescer as pequenas operações: a falta de fôlego das empresas para investir.

Endividamento
O diretor da Área Industrial do BNDES, Maurício Lemos, disse que esse comportamento retraído das empresas decorre, principalmente, do elevado endividamento no qual muito setores mergulharam por conta da alta do dólar no ano passado. "O problema número um deles é ficar livre do endividamento", ponderou.
Segundo Lemos, como a instabilidade segue presente no cenário cambial, "há uma incerteza muito grande" entre os empresários. Para ele, os empresários ainda não sabem qual a taxa de câmbio com a qual irão trabalhar.
Lemos avalia que, embora seja boa para os endividados, a queda do dólar não pode seguir indefinidamente, sob pena de prejudicar não apenas as exportações, como os setores que, estando protegidos contra a alta do dólar, ganharam no final do ano passado e estão em condições de investir, como o de papel e celulose e o siderúrgico. Para ele, o dólar abaixo de R$ 3 já é "preocupante".
"Eu não esperaria nada diferente neste momento", disse a economista Simone Saisse, coordenadora-adjunta da Área de Política Econômica da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Para ela, há outro fator inibindo as intenções de investimentos dos empresários, que é o aperto monetário materializado na alta dos juros e na retração do crédito. "O baque levou a uma piora na expectativa do empresário, apesar das perspectivas de melhoria no médio e no longo prazos", disse.
A indústria de construção naval, uma das prioridades da atual gestão do BNDES, recebeu dois dos três maiores financiamentos neste ano, totalizando R$ 155 milhões.
A maior aprovação, no valor de R$ 409 milhões, foi para a Embraer, que tem sido a maior beneficiária individual dos empréstimos do banco nos últimos anos.
Os números são referentes ao período de janeiro a março. De acordo com os técnicos do banco, como o tempo de tramitação de um projeto, desde a chegada do pedido até a aprovação, demora mais do que três meses, todas as aprovações feitas até março ainda são remanescentes de pedidos deixado pela gestão anterior.
Isso, de acordo com esses técnicos, não impediu que já tenha havido alguma interferência da nova política do BNDES nessas aprovações. A liberação de recursos para reativar a indústria naval tem sido considerada por Carlos Lessa, presidente do banco, uma das marcas do seu início de gestão. Ele disse que neste ano pretende aprovar projetos de construção de embarcações em valor total superior a US$ 400 milhões.



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