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LUÍS NASSIF
A valsa brasileira
A história da valsa brasileira -e latino-americana- é curiosa. O gênero chegou
ao Brasil com a família real portuguesa, no início do século 19.
Teve como primeiro cultivador
o imperador dom Pedro 1º.
Quando já tinha desaparecido
de outras partes do mundo, começou o século 20 como o gênero romântico por excelência, se
impondo sobre a modinha, a
toada e a seresta e só perdendo o
posto para o samba-canção nos
anos 40.
Poucos gêneros produziram
tantas obras-primas no século
quanto a valsa.
No CD que gravei em 1995, solando bandolim (semifinalista
do Prêmio Sharp de música instrumental daquele ano, certamente pelo repertório escolhido), selecionei pelo menos quatro valsas clássicas: "Subindo
aos Céus" (Aristides Borges), de
1908, "Louca", (Chico Neto), de
1930, "Feia", (Jacob do Bandolim) e a venezuelana "El Marabino", de Antonio Lauro.
No início do século, já era o gênero brasileiro mais avançado
ao lado do choro.
É só conferir "Subindo aos
Céus", "Revivendo o Passado",
de Freire Júnior, "Ave Maria",
de Erotides Campos, as valsas
eruditas de Ernesto Nazareth,
alguns anos depois as valsas singelas de Zequinha de Abreu, o
"Rapaziada do Braz", de Marino Júnior, o "Abismo de Rosas",
de Américo Jacomino, "Rosa",
de Pixinguinha, as valsas de
Cândido das Neves.
Na formação clássica dos regionais, é gênero tão cultivado
quanto o choro, embora não tenha conseguido se modernizar
na forma.
Nos anos 40, Garoto ("Desvairada") e Jacob do Bandolim
("Feia", "Salões Imperiais") tentaram injetar ânimo novo no
gênero, mas em vão.
Nos anos 70 e 80 foram compostas algumas das mais belas
valsas da história, como "Luiza"
(Tom Jobim), "Beatriz" (Chico e
Edu), mas como produção esporádica, sem ressuscitar o gênero.
O cantor Carlos Galhardo
(1913-1985) foi considerado o
"rei da valsa" no país, assim como o compositor José Maria de
Abreu, autor do clássico "Boa
Noite, Amor", em parceria com
Francisco Matoso, com quem
Maria de Abreu compôs outras
37 músicas.
Matoso morreu jovem, em
1941, com apenas 28 anos. Além
desse clássico, em parceria com
Lamartine Babo compôs "Eu
Sonhei que Tu Estavas Tão Linda" e uma penca de músicas
com o grande pianista Nono, tio
dos irmãos Peixoto.
O repertório de valsas de Galhardo foi imbatível. Desde
"Cortina de Veludo" (Paulo
Barbosa e Osvaldo Santiago),
"O Destino Desfolhou" (Gastão
Lamounier e Mário Rossi), "Nós
Queremos uma Valsa" (Nássara
e Frazão) e sua gravação mais
famosa, "Fascinação" (versão
de Armando Louzada para a
valsa de Marchetti).
Todos os grandes cantores até
os anos 50 passaram pela valsa,
assim como os grandes compositores do século passado. Lamartine Babo ("Serra da Boa Esperança"), Ary Barroso ("Canta
Maria"), Claudionor Cruz e Pedro Caetano ("Caprichos do
Destino").
Algumas das mais belas valsas
brasileiras foram compostas por
compositores que ficaram pouquíssimo conhecidos fora dos
círculos dos iniciados. É o caso
de Jorge Faraj (1901-1963), que,
com Newton Teixeira (1916-1990) compôs um de nossos clássicos prediletos, "A Deus da Minha Rua".
Outros dois, extraordinários,
foram Roberto Martins -sobre
quem escrevi coluna semanas
atrás- e Mário Rossi, compositor de alta qualidade.
Juntos, compuseram uma das
mais belas valsas brasileiras, o
"Bodas de Prata" ("Beijando
teus lindos cabelos / Que a neve
do tempo marcou / Eu tenho nos
olhos molhados / A imagem que
nada mudou / Estavas vestida
de noiva / Sorrindo e querendo
chorar...")
Aldo Cabral foi outro autor
fundamental, parceiro de Benedito Lacerda em "Boneca".
Saint-Clair Senna, de quem não
se consegue obter nada, nem na
internet, compôs "Misterioso
Amor", entre outros clássicos de
Galhardo.
J. Cascata e Leonel Azevedo
conseguiram maior sucesso. É
deles "Lábios que Beijei", interpretação clássica de Orlando
Silva.
Sadi Cabral, que cheguei a assistir, já idoso, como ator de novelas da Globo, compôs a valsa
predileta do meu avô, "Velho
Realejo", em parceria com Custódio Mesquita.
Enfim, é uma torrente tão
imensa de talento e lirismo, que,
se não parar agora, ficarei escrevendo sobre a valsa brasileira a
semana toda. Para alívio do
presidente do Banco Central.
E-mail - luisnassif@uol.com.br
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