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LUÍS NASSIF
As razões
de Morales
Há um evidente exagero em
julgar a política externa
brasileira pelo episódio Evo
Morales. A política externa
brasileira não elegeu Morales e,
provavelmente, facilitará nos
próximos contatos com ele. Só
daqui a 40 dias -quando terminarem as eleições para a nova Constituinte, razão maior
para os últimos atos de Morales- se saberá com clareza o
que ele quer e se a política externa brasileira em relação à
Bolívia renderá frutos positivos
ou não.
Antes de pretender lançar os
"marines" brasileiros para sufocar a ação de Morales, seria
conveniente entender direito o
que ocorre na Bolívia. O país
tem enormes riquezas minerais
e uma pobreza africana. As riquezas naturais sempre foram
vistas como o caminho para
sua redenção social e econômica, e sua nacionalização foi claramente explicitada no programa de campanha de Morales.
Morales venceu as eleições
com 54% dos votos e com o discurso claro de fundar um novo
Estado -e, diferentemente do
Brasil, no caso da Bolívia, o termo "refundar" tem lógica. Assim como em muitos países latino-americanos, não adianta
ganhar eleição presidencial
sem ter maioria no Parlamento. O nó de Morales consistia
em, após ganhar a Presidência,
conquistar a governabilidade.
E, aí, tem que se haver com os
três pilares que dão sustentação ao seu governo. O primeiro
é o chamado "circulo palaciano", formado por um grupo de
intelectuais responsáveis pela
administração do governo. São
três nomes fortes: Juan Ramón
Quintana, ministro da Presidência, Alfredo Rada, vice-ministro de Coordenação com
Movimentos Sociais, e Héctor
Arce, vice-ministro de Coordenação Governamental.
O segundo pilar são as populações indígenas, de onde vêm
a força e as lealdades maiores a
Morales. No ministério, esse setor é representado por David
Choquehuanca. O terceiro pilar
são as centrais sindicais, cujo
homem de confiança de Morales é o líder camponês Román
Loayza.
Morales enfrenta desafios em
sua base de apoio. Há um grupo que propõe a insurreição para conquistar o poder; e outro
adepto do constitucionalismo.
As atitudes recentes de Morales
têm muito mais a ver com a
Constituinte do que com a revolução.
No plano da estratégia continental, o desenvolvimento econômico e social do continente e
a estabilização política dependem mais do que nunca da integração econômica e física. E
esse processo passa pelo desenvolvimento equilibrado entre
todos os países. Não se trata de
questão ideológica. É uma inevitabilidade, independentemente dos governos de plantão.
É essa integração que criará zonas de desenvolvimento e permitirá montar metas continentais, da mesma maneira que na
União Européia.
O decreto de expropriação
prevê uma auditoria para garantir que o ganho das empresas permita um retorno do capital. A França já se dispôs a
negociar com Morales. Por isso
mesmo, seria bom esperar os
próximos lances do jogo, antes
de se propor a analisar o resultado da uma partida que mal
começou.
Pode ser que se confirmem
um Morales troglodita e uma
diplomacia brasileira ingênua.
Pode ser que não.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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