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Após perdas, Buffet faz investidor sorrir
Em encontro com investidores, bilionário come cookies e coça ouvido ao responder perguntas sobre crise
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL A OMAHA
O megainvestidor e bilionário Warren Buffett, 78, é um
personagem de si mesmo. Um
artista profissional, e dos bons.
Na reunião anual em Omaha
(Nebraska) de seu fundo de investimentos Berkshire Hathaway, no fim de semana, mostrou-se capaz não apenas de arrancar gargalhadas de milhares
de investidores que perderam
muito dinheiro em suas mãos
em 2008 quanto de dar sua visão clara e prática sobre o futuro da economia.
O encontro do Berkshire é
antológico entre seus investidores. O evento principal ocorre em um ginásio com capacidade para 18 mil pessoas sentadas e outras milhares em salas
adjacentes. Neste ano, 35 mil
foram a Omaha para a reunião.
Há também uma área de exposições no mesmo complexo.
Ali, pôneis e touros de chifres
imensos decoram o ambiente
ao lado de carros de corrida,
bandas de música "country" e
de infinitas opções de comidas
e bugigangas para que os ricos
investidores possam gastar um
pouco de seu dinheiro.
O seleto clube de Buffett não
é para qualquer um. Uma única
ação "Classe A" do Berkshire
custava US$ 92 mil (R$ 211 mil)
na sexta-feira. A "Classe B",
US$ 3.043 (R$ 7.000). Na média, elas perderam 32% de seu
valor em 2008, quando o fundo
de US$ 122 bilhões teve seu
pior tombo em 44 anos.
No ponto alto do evento, Buffett e seu braço direito no
Berkshire há décadas, "Charlie" Munger, 85, respondem a
dezenas de perguntas de seus
investidores durante nada menos do que cinco horas. Algo
notável, já que Buffett é o segundo homem mais rico do
mundo (atrás apenas de Bill
Gates), com uma fortuna estimada em US$ 37 bilhões. A de
Charlie, em US$ 1,8 bilhão.
Pouco antes, é exibido um filme. Neste ano, Buffett fez o papel de vendedor de colchões de
uma das empresas de seu fundo. Justifica o rebaixamento:
"É que no ano passado dormi
no ponto, e alguns perderam
muito dinheiro por isso".
A "isca" da loja é um novo
produto com um compartimento escondido para que as
pessoas possam, daqui em
diante, guardar seu dinheiro
debaixo do colchão. Além de
dólares, Buffett esconde no local duas "Playboys" antigas.
Na entrevista, é Buffett quem
comanda o show. Sentado ao
lado de Charlie em uma única
mesinha iluminada do alto na
penumbra do gigantesco estádio repleto de investidores e telões, come vários biscoitos e
sorve muitas Coca-Colas entre
as respostas, como se estivesse
na sala da casa de qualquer pessoa ali presente.
Buffett e Charlie fazem de
propósito o papel de bons velhinhos, mastigando seus "cookies", ajustando os óculos e coçando o ouvido com o dedo de
vez em quando. O ambiente e o
tom são jocosos, mas as respostas, diretas e muitas vezes surpreendentemente honestas.
Como esperado, neste ano o
grosso das perguntas girou em
torno da crise e das perdas do
Berkshire. A primeira delas: como tanta gente pôde estar tão
errada durante tanto tempo,
até a crise explodir?
"Aos 21 anos estive em Las
Vegas pela primeira vez. Vi tanta gente fazendo tanta besteira
com tanto dinheiro que ali cheguei à conclusão que os EUA
eram a terra da oportunidade",
disse Buffett.
Mais à frente, afirmou: "Há
cinco anos, todos seguiam um
modelo em que os preços dos
imóveis nos EUA nunca mais
poderiam cair tanto. Milhares
de pessoas cometeram esse erro (...) Estamos pagando as consequências disso e levaremos
anos para absorver os resultados dessa "bolha'".
Buffett e Charlie acreditam
que, apesar de alguns passos errados, as medidas do Estado no
combate à crise estão na direção correta. Mas que seu efeito
no futuro será, "certamente", a
volta da inflação.
"O governo está reagindo à
pior crise em 70 anos e tomando decisões sob pressão e com
boa fé. Não é razoável esperar
que tudo dê certo", diz Charlie.
Buffett emenda: "Quando você
está levando soco de todo lado,
do Congresso, dos contribuintes, não dá para fazer todas as
coisas certas. Mas o governo está fazendo bom trabalho".
"Estamos fazendo coisas que
nunca fizemos no passado e
não sabemos ainda as reais
consequências disso, mas não
será um "almoço grátis". No que
podemos apostar é em mais inflação", completou Buffett.
Em outra pergunta, a dupla
foi questionada sobre se haveria algo ainda "escondido", não
revelado, que ainda possa
ameaçar ainda mais o sistema
capitalista.
"Há ainda muita coisa errada
no mundo, mas é o único que
temos. Não tenho a menor
ideia do que vai acontecer, mas
sei que cada vez mais vamos viver melhor e melhor, pois esse é
o sistema que liberta o potencial de todos. Até a China descobriu isso. Teremos dias ruins
no capitalismo, mas, de modo
geral, estamos progredindo rapidamente", disse Buffett.
Ao que o bem mais irônico
octogenário Charlie comentou:
"Agora que estou cada vez mais
perto da morte, me sinto cada
vez mais otimista com o futuro
da economia".
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