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ARTIGO
Bernanke está certo em se preocupar
MOHAMED EL-ERIAN
DO "FINANCIAL TIMES"
O DEPOIMENTO do presidente do Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA), Ben Bernanke,
no Congresso americano merece atenção cuidadosa dos agentes do mercado -e isso em um
momento no qual as medidas
tomadas pelas autoridades desempenham papel incomumente forte em determinar os
valores absolutos e relativos de
muitos mercados.
No texto de seu depoimento,
Bernanke aponta corretamente para o processo de cura em
curso em diversos elementos
críticos dos mercados financeiros, entre os quais transações
interbancárias e de "commercial papers". Também aponta
para a melhora do funcionamento do crédito empresarial.
Mas os aspectos mais interessantes do depoimento são
outros. Relacionam-se às
nuanças em sua perspectiva
econômica mais ampla e à tentativa de Bernanke de dar às
questões fiscais o lugar devido.
Bernanke reconhece que, a
despeito dos "brotos verdejantes", continuam a existir dúvidas sobre exatamente que componentes da demanda entrarão
em marcha assim que a recuperação cíclica de estoques esgotar seu curso, como deve inevitavelmente acontecer ao longo
dos próximos meses.
O presidente do Fed aponta
que, "mesmo depois que uma
recuperação se iniciar, o ritmo
de crescimento da atividade
econômica real deve se manter
abaixo de seu potencial de prazo mais longo por algum tempo, o que implica que a atual
folga na utilização de recursos
deve se ampliar ainda mais".
No entanto, ele não chega a
mencionar aquilo que ocupará
cada vez mais espaço nas preocupações das pessoas. Especificamente, a questão quanto ao
que acontece no longo prazo
vai bem além da ideia de um período prolongado de crescimento abaixo do potencial. O
nível de crescimento potencial
em si pode terminar declinando. De fato, isso é um elemento
central daquilo que, aqui na
Pimco, definimos como "nova
normalidade".
Quando as questões fiscais
estão em jogo, Bernanke não
demonstra timidez em se preocupar quanto a questões de
prazo mais longo -e está certo
em fazê-lo. Ele é explícito sobre
a necessidade de maior clareza
sobre como a sustentabilidade
fiscal será restaurada.
Bernanke afirma que "manter a confiança dos mercados
requer que nós, como país, comecemos a planejar agora uma
restauração do equilíbrio fiscal.
A atenção imediata a questões
de sustentabilidade fiscal é especialmente crítica, devido aos
desafios orçamentários e econômicos vindouros, associados
à aposentadoria da geração
"baby-boom" e à elevação continuada dos custos médicos".
São palavras fortes, e justificadas, dada a preocupante situação fiscal que os Estados
Unidos estão encarando. Por
necessidade, Bernanke cada
vez mais terá a tarefa de combater as preocupações sobre inflação e monetização.
De fato, os mercados já dispararam dois claros tiros de alerta
nas duas últimas semanas, como os recentes movimentos
nas cotações dos títulos e no
dólar dos EUA demonstram.
Os desafios que Bernanke
enfrenta com relação a essas
questões não são fáceis ou passíveis de soluções rápidas.
Além disso, à medida que os
mercados passam a considerar
cada vez mais os fatores subjacentes, o que inevitavelmente
acontecerá, reconhecerão a dificuldade que o governo enfrenta para manter um compromisso confiável de ajuste
fiscal primário.
Em suma, Bernanke parece
mais cauteloso quanto às perspectivas de crescimento e deseja tirar as questões de sustentabilidade fiscal da esfera do Fed
e devolvê-las à sua alçada correta, o Congresso e o Executivo.
Ele tem razão quanto a ambas as coisas.
MOHAMED EL-ERIAN
é presidente-executivo e
copresidente de investimentos na administradora de fundos Pimco.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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