São Paulo, sábado, 04 de agosto de 2007

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ROBERTO RODRIGUES

É preciso rever índices de produtividade?

Não há sentido mais em fixar índices de produtividade para desapropriar terras para reforma agrária

O GOVERNO federal tem um certo compromisso com os assim chamados movimentos sociais, no sentido de modificar os índices de produtividade agrícola.
É preciso entender bem esse tema. Os índices de produtividade foram criados nos anos 60 e tinham por objetivo forçar os produtores rurais a investir em tecnologia, para produzir mais por área. Com isso, a idéia era acabar a especulação com a terra, bem como levar ao cumprimento da função social da propriedade rural, que era gerar empregos e renda para o país de forma sustentada.
E, por trás desses objetivos, havia um outro: as terras que não atingissem o índice mínimo de produtividade, independentemente do cultivo ou da região onde estivessem, ficariam sujeitas a desapropriação para fins de reforma agrária. Embora discutível, havia um sentido nisso tudo: o setor rural não era homogêneo e havia segmentos extremamente atrasados e incapazes de competir: estimular a produtividade poderia ser um mecanismo interessante para mudar essa realidade.
Por outro lado, a inflação alta também inibia a eficiência, porque os custos de produção eram "comidos" por ela, de modo que não havia exposição dos produtores incapazes.
Mas isso tudo acabou. Os sucessivos planos de estabilização da economia produziram resultados brutais na agricultura: correções de preços, de dívidas rurais com índices diferentes no Plano Collor e o descasamento do Plano Real acabaram levando a uma tríplice colisão na primeira metade dos anos 90: estabilização interna da moeda, abertura comercial indiscriminada e falência das políticas públicas para o setor.
Isso gerou duas ondas simultâneas no campo: uma de conclusão e outra de competitividade. Aqueles produtores -especialmente os pequenos- que por diversas razões não conseguiram avançar foram excluídos da atividade. E os remanescentes tiveram que investir em tecnologia e em gestão para sobreviver. Com isso, o agronegócio brasileiro hoje é extremamente eficiente e competitivo, a produtividade aumentou espetacularmente e os índices ficaram desatualizados. Mas, então, por que corrigi-los agora? Por que aumentá-los? Só para ampliar o número de hectares para reforma agrária? Por que só no campo se exige uma produtividade mínima?
Indústria tem índice de produtividade? Loja tem? Restaurante, bares, cinemas, farmácias, fábrica de autopeças, de roupas, de alimentos, têm? Bancos têm?
Não, claro que não! Porque, se não são eficientes e competitivos, não agüentam a concorrência e quebram. Ora, isso também acontece no moderno agronegócio brasileiro.
Acabou o tempo em que comprar terra era bom investimento. Hoje, o produtor rural que não for competitivo também quebra. Também é excluído. Com a inflação dominada, não tem mais ineficiência escondida. Agora está tudo às claras: ou é bom ou cai fora.
Por essas razões, não há sentido mais em estabelecer índices de produtividade para desapropriar terras para reforma agrária: o mercado desapropria, por si só. E, além disso, seria uma injustiça: afinal, os agricultores investiram em tecnologia, e, com isso, a produtividade cresceu.
Aumentar os índices seria um castigo para quem investiu e melhorou as coisas para o país.
Não se discute se a reforma agrária é necessária ou não. Mas forçar a barra para arranjar mais terra para isso não parece lógico. Afinal, qual a garantia de que os novos proprietários serão mais produtivos?


ROBERTO RODRIGUES, 64, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.


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