|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Geração de emprego colide com interesses sindicais
MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Para combater o desemprego e
aumentar a renda, o presidente
Lula terá de promover mudanças
que colidem com os interesses das
bases do sindicalismo do setor
público- do qual a CUT (Central
Única dos Trabalhadores) representa cerca de um terço.
A constatação é feita por Leôncio Martins Rodrigues, professor
titular de ciência política da Unicamp e autor de "Destino do Sindicalismo" (Edusp, 2002).
Hoje, são 7,7 milhões de desocupados no país segundo o IBGE,
número que coloca o Brasil em
terceiro lugar no ranking mundial
do desemprego, atrás apenas da
Índia e da Rússia. Foi nesse contexto que, uma semana antes do
1º de Maio -dia simbólico para o
sindicalismo-, aconteceu a primeira greve de trabalhadores filiados à CUT, central historicamente ligada ao presidente Lula.
Na greve comandada pelos trabalhadores da GM (General Motors), o governo interveio nas negociações, o que fez com que o
Sindicato dos Metalúrgicos de
São José dos Campos (filiado à
CUT e ligado ao PSTU) suspendesse a greve e retirasse a reivindicação de gatilho salarial quando a
inflação atingisse 3%.
A intermediação do governo na
questão causou mal-estar no
meio sindical e foi alvo de críticas
da CUT e da Força Sindical. Para
Rodrigues, essa tensão entre governo e sindicatos cria uma situação "incômoda". A seguir, a entrevista concedida à Folha.
Folha - Qual sua análise do relacionamento do movimento sindical
com o presidente Luiz Inácio Lula
da Silva, considerando que ele foi
importante líder metalúrgico?
Leôncio Martins Rodrigues -
Considerando a quantidade de
ex-dirigentes sindicais em importantes funções de comando no
Executivo federal, tanto o governo como os sindicatos ligados à
CUT encontram-se agora numa
posição bem incômoda. Os primeiros porque têm que assumir
as funções e a responsabilidade de
elite governante; os outros, porque devem passar a ser opositores
dos que ajudaram a eleger.
Ocorre que, para fazer a economia funcionar e, consequentemente, aumentar o emprego e a
renda das classes assalariadas, o
governo tem que promover mudanças que atingem os interesses
das bases do sindicalismo do setor público, aliado aberta ou veladamente aos altos estamentos burocráticos da República.
Trata-se de uma situação bem
diferente da que existiu na época
do governo Goulart. Então, quase
não havia sindicalistas no governo, mas o antigo CGT (Comando
Geral dos Trabalhadores) apoiava
fortemente o governo e era tido,
antes que o golpe de 64 mostrasse
o contrário, como um dos pilares
de sustentação de Goulart.
Agora, são ex-sindicalistas que
estão no governo e os diretores de
sindicatos estão na oposição.
Folha - Quais as mudanças pelas
quais o movimento sindical passou
dos tempos de metalúrgico do presidente Lula para cá?
Rodrigues - As duas mais importantes, na minha opinião, são primeiro o forte declínio do sindicalismo de trabalhadores manuais
do setor privado e segundo a expansão do sindicalismo de funcionários. Na época de Lula, os
sindicatos de metalúrgicos eram
os mais ativos e os maiores do
país, como aliás acontecia também na maioria dos países industrializados.
Folha - Recentemente, o presidente Lula disse em entrevista que
os sindicalistas deveriam organizar
melhor sua pauta de negociações,
pedindo que a prioridade seja o
apoio às reformas tributária e previdenciária. Como o sr. encara esse
posicionamento do presidente?
Rodrigues - Acho que, em tese,
Lula tem razão. Para sobreviver
em sociedades em que os sindicatos estão deixando de ser um ator
político e social importante, os
sindicatos não podem se manter
apenas no terreno da mera reivindicação corporativa.
Têm que ser mais inventivos,
assumir um arco mais amplo de
demandas capazes de atender aos
trabalhadores enquanto cidadãos. Mas, no caso, os dirigentes
sindicais dificilmente apoiarão o
presidente em seus projetos de reformas. Os sindicatos tendem fortemente para o corporativismo,
para a defesa dos interesses que
representam. Especialmente nos
casos das reformas da Previdência e da legislação trabalhista, as
bases entendem- com ou sem
razão- que serão prejudicadas.
No caso do sindicalismo do setor público, o apelo do presidente
Lula cai inteiramente no vazio
porque os sindicatos irão defender propostas contrárias às intenções do governo.
Folha - Dentro da CUT existem diferentes sindicatos que pedem
abono, reposição ou antecipação
salarial, dependendo do caso. Essa
diferença de posições indica que a
central pode estar rachando?
Rodrigues - Parece-me cedo para dizer enfaticamente que haverá
um racha na CUT. Mas não há
dúvida de que ela passa por um
momento de tensão e perplexidade. Os amigos no poder não parecem muito amigáveis. Assim, as
divergências entre as tendências
que sempre existiram nessa organização devem se acirrar.
O próximo congresso será um
indicador importante, especialmente considerando que Lula já
indicou o futuro presidente que,
pelos estatutos da CUT, deve ser
eleito pelos delegados [Luiz Marinho, presidente do Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC". Se a decisão presidencial for referendada
pela grande maioria dos delegados, podemos inferir que um racha na CUT, se ocorrer, será de
pequena dimensão.
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Frase Índice
|