UOL


São Paulo, sexta-feira, 05 de setembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

GRÃOS

Ministério confirma que funcionário norte-americano entregou lista de medidas

EUA propuseram quarentena à soja

DO COLUNISTA DA FOLHA

O Ministério da Agricultura confirmou, em nota oficial, a suspeita levantada por Jorge Salim Waquim, chefe de gabinete da Secretaria de Defesa Agropecuária: os EUA propuseram, de fato, "uma série de medidas" de quarentena no comércio de soja e derivados com o país.
A suspeita de Waquim tornou-se pública na segunda-feira, quando ele denunciou o fato de que um funcionário da agricultura norte-americana havia sido localizado na região de Barreiras (BA) fazendo pesquisas sobre a praga chamada "ferrugem da soja" (mal que se originou na Ásia).
Waquim exagerou na acusação, ao dizer que poderia se tratar de bioterrorismo, na medida em que o esporo, o microorganismo que causa a doença, está na lista norte-americana de agentes do terrorismo biológico.
Mas a outra suspeita do funcionário brasileiro era correta: depois de visitar a Bahia entre 18 e 23 de maio passado, o funcionário (só agora identificado como Hossein El-Nashaar) solicitou audiência com seu congênere brasileiro, o DDIV (Departamento de Defesa e Inspeção Vegetal).
O encontro realizou-se no dia 11 passado e foi nele que El-Nashaar listou as medidas de quarentena que propunha.
Os técnicos brasileiros rejeitaram a lista alegando que a quarentena só poderia ser adotada após "processo oficial de análise de risco de praga, e não de uma simples visita", como a que o norte-americano fizera.
Sheila Ribeiro, técnica do DDIV, disse ontem à Folha que análises de risco de praga são rotineiras em diferentes países. O erro de El-Nashaar foi não ter feito o pedido oficial para a análise, que até teria base técnica: os Estados Unidos não têm a "ferrugem da soja" e poderiam, em tese, importá-la com os 70 mil quilos de farelo que o Brasil lhes venderia.
Embora pudesse ser tecnicamente justificado, o comportamento do funcionário norte-americano foi tão irregular que levou o Ministério da Agricultura a pedir esclarecimentos a seu congênere norte-americano sobre "os reais objetivos da visita do pesquisador ao Brasil".
É óbvio que o miniincidente ganhou maiores proporções no contexto da acesa polêmica entre Brasil e Estados Unidos sobre protecionismo agrícola (polêmica que existe também entre Brasil e União Européia).

Risco de retaliação
O governo e os produtores brasileiros se julgam prejudicados e não escondem o temor de que, à medida que aumenta a exportação do agronegócio brasileiro, aumente também o risco de retaliação, com o uso de instrumentos como o da quarentena para a soja.
Ainda ontem, o Ministério da Agricultura divulgou o balanço exportador do agronegócio brasileiro, o qual mostra que 47,5% das exportações do país provêm da agropecuária.
A soja contribuirá, neste ano, com US$ 8 bilhões de exportações, número com o qual o Brasil desloca os EUA do posto de maior exportador mundial.
O ministro Roberto Rodrigues (Agricultura), nas conversas com seus assessores, tem dito que esse avanço exportador significa que "o Brasil está tirando alguém do mercado e esse alguém não vai ficar satisfeito com isso".
É natural, nessas circunstâncias, que haja um imenso ruído quando um funcionário justamente do país que perdeu o primeiro lugar para o Brasil dá um passo em falso, como o de sugerir uma quarentena da soja sem análise de risco devidamente formalizada.
Pelo que a Folha apurou, foi exatamente isso que se deu: sem ter feito análise nenhuma, El-Nashaar propôs a quarentena.
A dúvida é se foi uma iniciativa pessoal ou orientação superior.
A Embaixada dos EUA, em resposta à consulta feita pela Folha, informa que tinha conhecimento da discussão sobre medidas de quarentena, mas alega que foi "preliminar e sujeita a futura troca de informações sobre a ferrugem no Brasil".
Diz também que as suspeitas sobre o risco da praga se basearam em "informações públicas amplamente disponíveis em sites na internet e publicações brasileiras".
Lembra, ainda, que o Brasil relatou a existência de ferrugem asiática desde 2001. (CLÓVIS ROSSI)


Texto Anterior: Amorim aponta assédio contra parceiros do país
Próximo Texto: Saúde: Suspender internação pode dar multa
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.