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OPINIÃO ECONÔMICA
Orçamento complacente
MARCOS CINTRA
O projeto de lei para o Orçamento de 2006 apresentado ao Congresso confirma uma
característica bem brasileira que
é o improviso, a permissividade, o
desrespeito às regras. O governo
não cumpriu o que ele próprio determinou em abril deste ano,
quando apresentou a LDO (Lei de
Diretrizes Orçamentárias). Naquela ocasião, foi definido que a
carga tributária federal respeitaria o teto de 16% do PIB. No entanto, a proposta de Orçamento
fixou-a em 16,24% do PIB. O governo pretende abocanhar mais
0,24% do produto nacional para
alocar verbas numa reserva que
poderá servir para aumentar gastos com servidores e transferir recursos para Estados, municípios e
Previdência Social.
É lamentável que o Orçamento
tem sido tratado como uma simples formalidade desprovida de
sentido prático e desprezado como elemento estratégico de informação e planejamento. Aos atos
casuísticos como o do governo federal, desrespeitando a LDO, e à
irresponsabilidade do Congresso,
criando novas despesas com servidores, somam-se outros que vão
rotineiramente sendo "pendurados" no Orçamento.
Quem não se recorda do recente
aumento do salário mínimo
aprovado no Senado e que poderia criar um rombo da ordem de
R$ 16 bilhões para as contas públicas? Além disso, as vinculações
orçamentárias tornam o quadro
ainda mais grave. A alegação de
que essas vinculações, assim como os gastos sociais de natureza
assistencialistas, são indispensáveis para promover justiça social
são argumentos vazios e sem respaldo na realidade do dia-a-dia
do país.
Um Orçamento público mais
flexível com regras claras e constantes reduz os riscos para investidores e potencializa a capacidade de ação da política fiscal. Não
seríamos pegos por inesperados
aumentos na carga tributária
nem por cortes em projetos em
andamento decorrentes de "brincadeiras" com as contas públicas.
No passado, sempre defendi o
Orçamento autorizativo, em contraposição ao Orçamento impositivo. As incertezas da inflação e a
instabilidade conjuntural justificavam a concessão de ampla
margem discricionária para o governo. No entanto as arbitrariedades são tantas que começo a rever essa posição. Como está, o Orçamento em nosso país pode ser
comparado a um hímen complacente, do qual alguns se aproveitam para satisfazer seus interesses
enquanto o poder público faz de
conta que tudo continua como
antes.
A alegria do PIB
Ao mesmo tempo em que os atos
do Executivo e do Legislativo evidenciam sobejamente a esculhambação que rege a gestão público-financeira em nosso país, o
IBGE divulgou dado mostrando
que o PIB cresceu 4,3% em junho
na taxa em 12 meses. Isso é motivo de alarde por parte do governo
e de alento para alguns segmentos privados. Mas, na verdade,
não passa de um indicador que
confirma a mediocridade do desempenho econômico brasileiro
recente. Há quem ainda comemore quando o crescimento do
PIB supera 3% ou 4%, esquecendo-se de que o país tem potencial
para crescer de forma muito mais
vigorosa.
Há mais de duas décadas o PIB
brasileiro cresce em torno de 2,5%
ao ano, quando a verdade nua e
crua é que, com uma expansão de
menos de 5% no ano, o país não
consegue sequer absorver o aumento vegetativo da população
economicamente ativa. Com isso,
a economia brasileira vem perdendo terreno há anos para países como China, Índia, Rússia e
Chile. Essas economias registram
seguidamente expansão econômica de mais de 7% ao ano.
Eleições
A crise política atual mostrou
outra importante fragilidade institucional: as regras de financiamento eleitoral. O TSE pensa em
reformular os procedimentos de
fiscalização e controle. Com a assessoria do competente Everardo
Maciel, pode exigir que todas as
contribuições e despesas de campanha sejam feitas exclusivamente em cheque. Aproveito para propor uma complementação.
Todas as contas de campanha,
ainda que de titularidade dos
candidatos, serão geridas pelo
próprio TSE, que emitirá todos os
cheques de pagamentos após a
devida autorização dos candidatos. Qualquer despesa de campanha realizada sem a cobertura do
respectivo cheque emitido pelo
próprio TSE implicará a imediata
cassação do registro da candidatura.
Em suma, o TSE passará a ter o
controle dos valores recebidos e de
todos os pagamentos efetuados. O
caixa dois desaparecerá de imediato. Os gastos irregulares serão
praticamente inviabilizados.
Cumpre dizer que a implementação desse novo procedimento de
controle eleitoral é extremamente
simples. Uma planilha eletrônica
de contas a pagar e a receber, facilmente encontrada no mercado,
servirá para viabilizar o programa.
Se é para moralizar, não vamos
mais perder tempo.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 59, doutor pela Universidade
Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, foi deputado federal
(1999-2003). Atualmente é secretário
das Finanças de São Bernardo do Campo. É autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
Internet: www.marcoscintra.org
E-mail - mcintra@marcoscintra.org
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