São Paulo, sábado, 06 de fevereiro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Incerteza política complica crise na Europa

Apesar do alto deficit público, Portugal aprova lei para elevar gastos; na Grécia, pressão popular pode esfriar aperto fiscal

Relatório do banco UBS põe em dúvida vontade política do governo grego de levar as reformas adiante, mas descarta moratória imediata


LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

A crise da dívida pública na Europa ganhou contornos políticos bem mais nítidos ontem com a aprovação de uma controversa lei em Portugal que permite elevar os gastos regionais, enquanto na Grécia analistas colocam em dúvida a capacidade do governo socialista de levar adiante seu austero plano de reforma fiscal.
Uma eventual instabilidade nos governos em Atenas ou Lisboa daria fôlego aos temores de moratória que nos últimos dias derrubaram os títulos da dívida e as Bolsas dos dois países, colocaram o euro na berlinda e ecoaram negativamente nos mercados globais.
Os dois países, assim como a Espanha (leia texto nesta página), lidam com deficit públicos descontrolados: no caso grego, de quase 13% do PIB; no português, de 9,3%. O teto fixado pela União Europeia para a zona do euro é de 3%, nível para o qual os governos prometem trazer suas contas até 2013.
Em meio a promessas de reformas, os três premiês socialistas fazem coro ao atribuir a crise de credibilidade a um ataque de investidores dispostos a fragilizar o euro. Portugueses e espanhóis, por sua vez, insistem que seu caso não é grave como o da Grécia, cujo governo foi posto nesta semana sob monitoramento estreito da Comissão Europeia, que vigiará a execução do pacote fiscal.
O problema são as dissonâncias internas. A lei portuguesa que passou ontem amplia os repasses às ilhas de Madeira e Açores e foi aprovada a contragosto do governo minoritário do premiê José Sócrates (Partido Socialista), para o qual o Parlamento manda a "mensagem errada" aos mercados em um momento em que o que se espera é cortar o Orçamento.
Mas o presidente Aníbal Cavaco Silva (Partido Social Democrata) defendeu a medida, evidenciando o cabo de guerra no governo. O gasto extra, estimado em 50 milhões neste ano para chegar a mais de 80 milhões em 2013, torna virtualmente impossível reduzir o deficit para 3% do PIB.
Na Grécia, há temores de que o governo de George Papandreou não consiga cumprir o que prometeu nesta semana à Comissão Europeia: congelar salários, reduzir comissões do funcionalismo público, enxugar a Previdência e reformar o sistema tributário. Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda -os países que detonaram a atual crise de confiança- têm as piores arrecadações da UE.
Em resposta, a maior central sindical grega, GSEE, convocou uma greve geral para o próximo dia 24. Fiscais tributários pararam nos últimos dois dias.
Relatório do banco UBS põe em dúvida a capacidade e a vontade política do governo de Atenas de levar o plano adiante após um primeiro momento, reforçando a necessidade de escrutínio da Comissão Europeia. A Grécia tem tradição em protestos e pressão popular, e ontem os jornais locais, como o "Kathimerini", já taxavam de draconiano o pacote proposto.
Embora o banco suíço afirme ser virtualmente impossível um default no curto prazo, sob o argumento de que a UE socorreria o país para evitar um efeito dominó, os analistas não descartam uma moratória ou uma renegociação no médio prazo, em três ou cinco anos.
O caso grego é especialmente delicado em termos de confiança porque estourou na revisão das contas públicas em outubro último, quando os números mostraram um quadro bem pior do que o pintado. Só a dívida bruta do governo já equivale a 113,2% do PIB. A Comissão Europeia vai punir Atenas e exige "estatísticas confiáveis".
O UBS sugere a possibilidade de a Grécia recorrer ao FMI, recurso que encontra forte oposição na zona do euro, para evitar que os países se acomodem ao socorro da UE.


Texto Anterior: Desemprego nos EUA fica abaixo de 10% em janeiro
Próximo Texto: Acrônimo: Unidade do Barclays proíbe uso do termo Piigs
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.